terça-feira, 9 de março de 2010

Pirataria


A pirataria de produtos licenciados tem sido uma queixa frequente de alguns gestores de clubes brasileiros, que alegam com razão, que a receita referente a essa linha fica sempre aquém do potencial estimado.
Não entrarei especificamente no tema “produtos licenciados”, deixando-o para uma próxima oportunidade, porém focarei o produto licenciado mais demandado, a camisa oficial dos times de futebol.
Também não serão abordadas discussões “filosóficas” sobre o caráter ilegal da pirataria, pois não creio que haja espaço para argumentações sobre uma prática que desrespeita os princípios de proteção à marca e viola as obrigações fiscais.
Feitos os devidos esclarecimentos, podemos passar para os aspectos mercadológicos que envolvem o assunto.

Preços

As camisas dos times europeus de 1ª linha custam em seus respectivos países algo na faixa de 55 a 60 libras, o equivalente a R$162 e R$177 (1 libra= R$ 2,95).
Nos EUA, a camisa do LA Galaxy é encontrada por US$ 109  ou R$ 206 enquanto a do Lakers, time de basquete chega a custar US$ 205 ou R$ 389(1 US$=R$ 1,89).
Na Argentina, as camisas dos principais times têm o preço variando entre 260 e 280 pesos ou R$ 135 e R$ 146 (1 peso argentino= R$0,52).
Já no Brasil, a camisa de um time tradicional como o Fluminense é vendida por valores compreendidos entre R$ 150 e R$ 175.
Preço similar ao praticado na Europa, superior ao da Argentina e inferior ao dos EUA.
Para efeito desse comparativo foram consideradas as camisas oficiais (mangas curtas) mais recentes, valendo informar que os preços desses produtos sofrem variações em função de modelo, ano e eventuais edições comemorativas.

Poder aquisitivo

O quadro abaixo permite comparar os valores de PIB e renda per capita dos países contemplados nesse estudo.


A comparação do Brasil com a Espanha é digna de destaque, pois essa última tem o PIB ligeiramente menor que o do Brasil (2,9%), entretanto a renda per capita é cerca de 350% maior.
O próximo quadro confronta o big mac index* com o preço de camisa de times de futebol em seus respectivos países.

* Índice criado pelo jornal The Economist para avaliar o poder de compra dos países, onde se compara o preço em dólar do Big Mac em 120 países.

Um Big Mac no Brasil é 22,8% mais barato que na Europa, enquanto que a camisa oficial de um time é apenas 1,1% mais barata.
Em relação à Argentina, o Big Mac brasileiro é 13,6% mais caro, já a camisa de oficial de um clube 19,8%.
Na comparação com os EUA, nosso sanduíche é 6,5% mais barato e a camisa 15,1 %.

Esses dados permitem concluir que há uma forte divergência entre o preço de uma camisa oficial de um time no Brasil e o poder aquisitivo da população

Soluções

Muitos defendem a ideia de que o próprio fabricante das camisas oficiais, assuma a produção e comercialização de camisas "similares às oficiais", porém praticando um preço próximo ao do produto pirata.
Outros temem que um produto popular "canibalize" o oficial.
Não creio que a canibalização seja o principal problema, até porque os profissionais com uma real visão de marketing são capacitados a promoverem as segmentações necessárias.
No entanto, tenho duas grandes preocupações a respeito dessa iniciativa.

(i) Estrutura de custos - pois não sei até que ponto seria economicamente viável para o fabricante produzir, comercializar e distribuir um produto com tais características “genéricas”.
(ii) Distribuição - por ser um produto novo, a estimativa de vendas adquire um grau de complexidade maior, o que traz reflexos na administração de compras e de estoques, além disso, a margem praticada provavelmente será mais baixa.
Tais condições, aliadas à inclusão de mais um produto do mesmo fornecedor à linha de mercadorias, certamente não agradarão e provocarão  a resistência dos principais varejistas, peças vitais para o giro do produto.
A alternativa de se utilizar atacadistas para distribuir o produto em lojas menores, também esbarrará na pressão exercida pelos grandes retalhistas.
Diante dos pontos levantados, não considero essa ideia interessante, acho que a solução mais viável deve passar prioritariamente por três ações básicas:
  • Negociação entre fabricantes, clubes e eventuais partes que tenham participação na operação, com o intuito de deixar o produto adequado à conjuntura econômica brasileira.
  • Repressão ao comércio de camisas piratas.
  • Adoção de iniciativas que propiciem vantagens aos clientes que compram produtos oficiais, sejam elas na forma de descontos em outros produtos, cortesias, sorteios e etc.
Com absoluta certeza, trata-se de uma tarefa extremamente difícil e que requer planejamento e dedicação, porém não se pode esquecer que pirataria é crime e não combatê-la é, na melhor das hipóteses, conivência dos gestores responsáveis.


Um comentário:

  1. Idel, perfeito seu comentário. Na verdade é a primeira vez que vejo esta abordagem Custo x Renda p/ Capita. Entretanto, no meu ponto de vista, por mais "galática" que seja a marca de um time, não consigo entender os preços praticados na aquisição das camisas oficiais. Vale ressaltar que o Brasil vem aumentando cada vez mais a Classe C, grande driver do consumo de bens e serviços. Portanto, para agregar esta massa de novos consumidores, que representam 50% da população brasileira, fabricantes e times não podem precificar seus bens para as classes A e B, que representam cerca de 205 da população. A saída ? Baixar os preços praticados. Afinal, futebol, basquete ou voley, são esportes populares.

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