Em todos os setores da sociedade é comum encontrar uma relação de causa e efeito para embasar conclusões, o que é correto, principalmente quando confrontada com a opção de responsabilizar o acaso. Ainda assim, parecem simplistas as conclusões que limitam os ocorridos a apenas uma causa e a um efeito.
Peguemos, por exemplo, o mercado de cervejas nos Estados Unidos, onde a Modelo Especial, cerveja mexicana pertencente à Constellation no país, desbancou a Bud Light da liderança de mercado.
Diante da novidade não demorou a aparecer os “especialistas” creditando o acontecimento ao impacto nas vendas sofrido pela líder Bud Light após a utilização de um influenciador transgênero em uma de suas ações de marketing. Tal conclusão acabou sendo disseminada pelo mais variados motivos, desde a preguiça de pesquisar até a seletividade daqueles que reverberam apenas o que é oportuno para suas convicções.
De fato, o ativismo de marca sem a prévia avaliação das possíveis consequências trouxe reflexos negativos nas vendas da Bud Light. Todavia, ignorar o trabalho que vem sendo feito pela cervejaria mexicana é prestar um desserviço ao marketing e à gestão de forma geral.
Faz tempo que as vendas da Modelo veem em ascensão. Desde 1982, a marca teve crescimento de dois dígitos percentuais em 37 dos 41 anos, ou seja, se trata de um movimento sustentável.
Apesar do excelente trabalho de marketing, no qual a análise dos dados tem papel fundamental, não há como deixar de mencionar que os produtos mexicanos têm despertado forte demanda nos EUA, além das cervejas, a tequila e a mezcal tiveram grande incremento de vendas no período entre 2003 e 2022 (273%, segundo dados da Distilled Spirits Council).
No caso das cervejas, além da Modelo, a Corona Extra e a Pacífico estão entre as 20 marcas mais consumidas, sendo os Estados Unidos o maior destino das exportações mexicanas dessa categoria de produto.
Claro que parte do sucesso da nova líder de mercado deve ser atribuída às ações de cunho demográfico, nas quais se valorizam os aspectos culturais focados na população hispânica, população essa que em 2000 representava 13% da população norte-americana e que em 2021 chegou a 19%.
Contudo, para não se tornar um produto de nicho, a Modelo identificou a necessidade de atrair também o público não-hispânico e para isso diversificou sua comunicação utilizando influenciadores e desenvolvendo campanhas impactantes.
A descrição do detalhado processo industrial com foco na qualidade do produto foi outro ponto de vital importância para que a marca se diferenciasse e se posicionasse como uma cerveja premium.
A atenção aos dados, conforme citado anteriormente, faz com que a empresa teste suas comunicações junto a todos os públicos, inclusive hispânicos e não hispânicos, de modo a não incorrer em equívocos como os da concorrente ao usar o influenciador transgênero.
Motes baseados no esporte e nos seus fãs, além de ações de patrocínio ao futebol fazem parte da estratégia de se estar próxima dos seus consumidores.
Aliás, todo enaltecimento feito ao marketing da marca pode ser corroborado através de uma situação bastante curiosa: na elaboração de um comercial cujo objetivo era mostrar que a marca tinha um processo industrial extremamente cuidadoso, a empresa se utilizou da imagem de uma matriarca hispânica fazendo tortilhas, a qual virava o produto como tradicionalmente é feito, ou seja, com os dedos. Em relação a isso, os advogados da empresa fizeram a recomendação para que a ação fosse feita com uma pinça, visto o risco de queimadura por parte daqueles que tentassem fazer a manobra com os dedos.
O marketing bateu o pé, argumentando que a autenticidade precisava ser retratada, aceitou apenas que fosse colocado um aviso de “não tente”.
Isso é marketing!
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