terça-feira, 25 de outubro de 2022

iPhone com ou sem?

 
A proibição da venda do aparelho celular iPhone 12 sem o carregador de bateria, independentemente dos aspectos jurídicos alegados pelo Ministério da Justiça, nos fornece uma ótima oportunidade para se refletir sobre o marketing no mundo dos produtos.
Inicialmente vale analisar a relação do carregador com o aparelho. Trata-se de um acessório ou parte do produto? O conceito de “acessório” está associado a algo não essencial. Como o telefone precisa de carga para funcionar, podemos tender a achar que o carregador é vital e como tal deve vir junto com o aparelho. Todavia, há que se considerar que a carga não precisa ser obtida necessariamente através de um equipamento próprio, ainda que dessa forma seja mais conveniente. Lembremos, a título de provocação, que os veículos automotivos não vêm com “enchedor” de pneus próprio.
A Apple, como forma de justificar a não inclusão do carregador, evoca que esse traz componentes nocivos ao meio ambiente, sendo mais apropriado diminuir sua circulação, até porque os proprietários podem se utilizar dos carregadores antigos. A explicação, embora guarde algum grau de legitimidade, é frágil na medida em que existe a possibilidade de o “cliente” estar comprando seu primeiro iPhone ou mesmo ter os antigos avariados. 
Passemos então ao marketing, ressaltando que é preciso considerar a hipótese de que a questão do custo do carregador tenha pesado na decisão, ou seja, se esse fosse incluído o preço do aparelho ficaria ainda mais caro. Por mais que possa passar despercebido, é preciso ter em mente que as partes incorporadas ao bem principal têm custos e como tal precisam ser cobradas dentro de uma margem que permita a continuidade da operação como um todo.
Daí, uma possível solução para o imbróglio seria a de proporcionar dois tipos de oferta: “aparelho + carregador” e “aparelho”.
Esgotada a análise sobre o “carregador”, passemos para os aspectos relacionados ao planejamento de produtos e respectivos lançamentos.
Antes é preciso chamar a atenção para o fato de que qualquer empresa para se manter saudável no mercado precisa reter os atuais clientes e conquistar novos, os quais chegam pelo rejuvenescimento da base da categoria ou advindos da concorrência.
Esses processos exigem que o produto ofertado seja percebido como mais atrativo do que o oferecido pela concorrência, porém, visando a contínua compra dos novos modelos, há que se ter um plano relacionado ao desenvolvimento e lançamento, daí a importância de se construir uma imagem associada à inovação.
Em outras palavras, a percepção do consumidor acerca dos benefícios tangíveis do produto deve ser capaz de provocar o desejo de comprá-lo, o qual é transformado em demanda efetiva na medida em que é suportado pelos benefícios intangíveis que agregam a percepção de “valor”.
Ao olharmos a evolução de preço dos iPhones, se nota um aumento cuja causa está intimamente ligada à evolução tecnológica, no entanto, qual será a elasticidade ao preço? Será que as vendas dos novos modelos estão similares ao início da operação da Apple como fabricante de smartphones?
Embora haja certamente um processo de fidelização, isto é, grande parte daqueles que usam iPhone se acostumaram e gostariam de permanecer utilizando, há também os aspectos financeiros que podem levar esses “fiéis” não só à diminuição na frequência de compras dos novos lançamentos como também à compra de versões menos atuais ou, mais grave, à mudança de marca.
Encontrar o ponto ótimo dessa equação é, sem dúvida, complexo, pois, além da necessidade de se desenvolver produtos mais atrativos dos que os da concorrência e dos que os lançados anteriormente, é preciso estudar os aspectos macro e microeconômicos em escala global para se praticar uma precificação que proporcione demanda e margem suficiente.
Esse breve exercício de análise sobre lançamentos de produtos, reforça um ponto já exposto em outros artigos: a importância fundamental de se conhecer economia para fazer uma boa gestão de marketing.





terça-feira, 18 de outubro de 2022

Onde colocar os produtos?

O expressivo aumento no preço dos alimentos tem levado as indústrias a desenvolverem produtos que impactem menos o bolso do consumidor. Tais alternativas vão desde a redução das embalagens até a formulações onde se misturam insumos alternativos. Aqui servem como exemplo a manteiga à base de margarina, o leite com soro de leite e a mozzarella processada com amido, entre outros.
Pelo fato de algumas das embalagens desses novos produtos serem similares às dos originais, os órgãos de defesa do consumidor têm se manifestado tanto junto à indústria como ao varejo.
Em relação às indústrias, seria realmente importante haver diferenciações mais expressivas, de forma que o consumidor não se confundisse na hora da compra. Todavia, há que se entender que o design das embalagens deve guardar uma relação que propicie sinergia entre os produtos da empresa, de forma a auferir ganhos no fortalecimento da marca, ou seja, as mudanças não podem vir a descaracterizar a linha mestra que concede unidade a todos os produtos da marca.
Já no caso do varejo, a intervenção dos órgãos não parece muito coerente, pois o lay-out dos supermercados é elaborado pensando justamente no benefício do consumidor. A busca por colocar produtos correlatos próximos uns dos outros é um enorme desafio em um ambiente onde o espaço é finito, novos produtos são lançados a todo o momento e as categorias se confundem.
Para ilustrar essa “confusão” entre categorias, convidamos o leitor a responder algumas questões: um leite à base de castanhas deve estar no mesmo espaço de laticínios ou no de produtos veganos?  As torradas devem ficar no setor de panificação ou no de biscoitos, quem sabe no de snacks? Não há certo ou errado, dependerá de testes, da área disponível ou da simples vontade dos responsáveis pela decisão.
Esse tipo de decisão, por mais que possa parecer sem importância aos olhos de quem não atua nos segmentos de varejo e de bens de consumo, e é de fundamental valia para a operação.
No lado do varejo, a lucratividade por metro quadrado é um excelente balizador do espaço a ser dedicado às categorias, além do que, ter produtos complementares próximos – tipo molho de tomate e massa – impulsiona sobremaneira as vendas.
Pelo lado da indústria, a localização dos produtos não é menos importante, o que faz com que se pague pelos espaços mais atrativos nas gôndolas ou mesmo por áreas nobres e atrativas do estabelecimento varejista.
A busca por culpados no caso desses novos produtos mais em conta não é saudável e só serve para se jogar uma cortina de fumaça na origem dos problemas: o reflexo de um mundo em guerra que,  após um período de pandemia, faz com que a demanda por commodities aumente substancialmente em termos globais. Nesse cenário, os produtores brasileiros acabam aumentando seus preços internos para terem os mesmos resultados que teriam exportando, culminando em maiores custos para a indústria.
A solução encontrada nada mais é do que uma tentativa de suprir a população sem impactar ainda mais suas finanças.











terça-feira, 11 de outubro de 2022

Marcas esportivas no futebol - 2022-2023

A edição 2022/23 do estudo sobre as marcas esportivas que vestem os principais clubes de futebol  acaba de ser publicado pela Jambo Sport Business, consultoria voltada à gestão esportiva. A análise em questão ocorre desde 2014 e considera os times da 1ª divisão das 20 principais ligas, totalizando 283 equipes e pode ser acessada através do link https://www.linkedin.com/posts/halfen_marcas-esportivas-nas-20-ligas-mais-valiosas-activity-6984064701512986624-AHhH?utm_source=share&utm_medium=member_desktop
A grande novidade na versão atual se deu na liderança, onde a Adidas tomou a posição que a Nike ocupava desde que o estudo é realizado. A marca alemã ao incorporar mais sete times em relação à temporada passada chegou a 71 equipes, ao passo que a marca norte-americana ficou com menos três times, totalizando 70. 
Na 3ª posição aparece a Puma, seguida por Macron e Kappa, conforme pode ser visto no gráfico ao lado.
Quando fazemos o mesmo exercício tomando como base os 30 clubes que mais faturam segundo o relatório Football Money League da Deloitte, a Nike volta a liderar e a Adidas passa a ser a 2ª marca, vindo empatadas na 3ª posição a Puma e a inglesa Castore.
Sobre a Castore, podemos citar que foi a marca que mais “tomou” grandes clubes da concorrência: Sevilla que vestia Nike, Aston Villa que era suprido pela Kappa e Bayer Leverkusen que usava Jako. Outra troca digna de destaque aconteceu na Lazio que deixou a Macron pela Mizuno. No total foram 45 trocas de fornecedores, uma a menos do que na temporada anterior.
Dois fatos devem ser destacados: 
(i) a quantidade de marcas regionais passou de 26 para 27. Consideramos como critério para essa classificação, as marcas que têm operação basicamente no país em que sua matriz está localizada, ou seja, estar vestindo apenas clubes daquele país em nossa amostra. A Colômbia com nove e a Argentina com sete são os países com maior incidência de clubes com esse tipo de fornecimento;
(ii) o número de marcas próprias também cresceu em relação à ultima temporada. Em número de times passou de seis para nove e de países de dois para quatro (Argentina, Brasil, Bélgica e Itália). Se agruparmos todas as marcas próprias como uma, essa seria a 8ª colocada empatada com a New Balance.
Compilando esses dois fatos temos que 59,3% das marcas regionais se encontram na América do Sul, assim como 77,8% das próprias, o que nos leva a concluir que o continente, apesar da sua relevância em termos de tradição futebolística, é um mercado marginal em termos comerciais.
Corrobora para essa conclusão a análise em que o estudo faz em relação ao somatório das três marcas globais – Adidas, Nike e Puma –, o qual totaliza  44,2% na Europa e apenas 20,6% na América do Sul, a propósito a participação nesse continente só ultrapassou os 30% na temporada 2014-15, certamente influenciada pela Copa ter sido realizada no Brasil.
Essas e outras informações estão disponibilizadas no estudo, inclusive individualizadas por país.








terça-feira, 4 de outubro de 2022

Vale tudo pelo conteúdo?

 
A busca por fazer das competições esportivas um gerador de conteúdo tem levado a alguns exageros definitivamente inaceitáveis.
Como forma de justificativa para atos que descaracterizam o esporte, abusam do termo “sports entertainment” – entretenimento esportivo -, sem nem procurarem entender o que isso efetivamente significa.
Para melhor explicar, vamos à origem do termo, que foi cunhado na década de 1980 pelo presidente da WWF (World Wrestling Federation) - agora WWE - com o intuito de descrever a modalidade sob o prisma de marketing e assim aumentar a atratividade junto aos potenciais patrocinadores.  
Podemos ainda enquadrar nessa categoria os Harlem Globetrotters que, de forma divertida, demonstra a habilidade dos jogadores de basquetebol em um ambiente de descontração.
No próprio ambiente mais competitivo, vemos algumas modalidades mudando regras para deixar as disputas mais atrativas. Isso sem falar nas inúmeras ações destinadas à melhoria da experiência de assistir os eventos nas arenas.
Tudo isso é válido, pois, através da busca por mais fãs, se consegue maiores receitas.
Reparem, no entanto, que nenhuma das ações voltadas a deixar a competição com mais cara de entretenimento, abdica da parte mais importante do evento: o esporte.
Esse movimento do "esporte-entretenimento” lembra um pouco, guardadas as devidas proporções, a popularização da expressão marketing esportivo, na qual pessoas que gostam e vivem no esporte, acrescentam o termo marketing, pouco entendendo o que ele significa.
Assim como o esporte é a parte fundamental do sports entertainment, o marketing o é no marketing esportivo.
Não deve haver espaço em hipótese alguma para que competições esportivas sejam vilipendiadas em nome da criação de conteúdo.
O esporte é o negócio fim da atividade, fazê-lo se tornar um entretenimento é o diferencial. Analogamente, podemos citar os supermercados que, com o intuito de ficarem mais atrativos, colocam restaurantes em suas áreas de vendas, porém, o negócio fim continua sendo a comercialização dos itens e não os pratos oferecidos.
Para a defesa do esporte, as federações, confederações e ligas têm papel fundamental. Aqui abrimos um parêntesis para elogiar a Conmebol que, em um jogo da Libertadores, notificou o Facebook por ter colocado “influenciadores digitais” no gramado, sendo que um deles acabou comemorando um gol junto aos jogadores.
Imaginem se os repórteres de campo, em busca de um conteúdo melhor para seus veículos, comecem a ter uma interatividade maior durante o jogo?
A linha que separa a atratividade da seriedade das competições, de fato, é tênue, por isso, antes de se adotar medidas para a busca de conteúdo, é necessário avaliar de forma criteriosa as possíveis consequências tendo sempre em mente que tal busca, jamais, pode chegar às raias de distorcer o esporte.