terça-feira, 29 de novembro de 2022

A Copa da intolerância


O processo de escolha das sedes para a Copa do Mundo costuma levar em consideração uma infinidade de variáveis, de forma que sejam equacionados os aspectos financeiros e esportivos, todos dentro de um contexto que contribua para o desenvolvimento mundial. Essa é a tese.
Desbravar novos países, ainda que estejam fora do círculo tradicional, ajuda, entre outras coisas, a popularizar o esporte na região, além de mostrá-la ao mundo. Evidentemente, é fundamental que tal decisão não interfira de forma contundente nas demais estruturas que circundem a economia, o esporte e os direitos humanos.
E no Qatar?
Não há como negar a pujança financeira do país, ainda que exista forte desigualdade social. Também não podemos desprezar que, mesmo sem ser uma potência esportiva no futebol, o país realizou grandes investimentos com o intuito de melhorar.
No que tange às condições climáticas, outro grande desafio, optou-se por marcar o evento para um período diferente do usual nesse tipo de competição, objetivando proporcionar temperaturas menos hostis e assim preservar o nível técnico e a saúde dos jogadores. 
Trata-se de uma concessão aparentemente salutar quando se foca o espetáculo, mas que também traz reflexos na economia de forma geral, visto que o evento passa a competir com a Black Friday e com o Natal, datas onde as marcas que já concorrem entre si tanto pelo consumo como pela atenção.
A alegação de que o evento ajuda nas vendas faz algum sentido em relação a alguns produtos, embora o consumo destes provavelmente viesse a ocorrer independentemente da Copa.
Outra situação de concessão por parte da organização aconteceu em relação a Budweiser que, mesmo sendo patrocinadora da FIFA,  não pode comercializar sua cerveja com álcool por restrições do país. 
Claro que um patrocínio dessa magnitude proporciona muitos outros benefícios à marca. A associação ao esporte, a exposição e as ativações são mais do que suficientes para trazer retorno ao investimento, na verdade, a comercialização é o que menos importa nesse caso, porém, sua proibição pode denotar que a FIFA não dá o devido valor aos patrocinadores.
Mas será que em nome da soberania da nação e diante de tanta intolerância, os direitos dos cidadãos devem ser ignorados? Será que deveria ter tal evento no Qatar?
Perguntas difíceis e que  sem acesso às negociações ocorridas deixa qualquer resposta com forte grau de "achismo".
Entretanto, por mais que seja indiscutível o direito de as nações sediarem eventos, há também que se considerar que sendo um evento global, a busca pelo equilíbrio entre as concessões deve reger as negociações, o que não parece ter havido.
A propósito, os próprios critérios de escolha foram bem nebulosos.






terça-feira, 22 de novembro de 2022

Onde trabalhar?

A compra do Twitter por parte do empresário Elon Musk, fundador da Tesla e da Space X, não para de repercutir. A última polêmica surgiu após o novo dono estabelecer que todos os colaboradores devem trabalhar de forma presencial, fato que já ocasionou cerca de 1500 pedidos de demissão.
Lembremos que antes da pandemia, a possibilidade fazer home office -  trabalhar de casa - mal existia. Poucas empresas concediam tal liberalidade, a qual era interpretada como uma forma de propiciar qualidade de vida aos funcionários.
Veio a pandemia e o home office virou regra de uma forma abrupta, isto é, sem tempo para adaptação às plataformas, ao ambiente doméstico e, sobretudo, à rotina. Logo no início, as pessoas marcavam reuniões a todo o momento como se quisessem ter testemunhas de que não estavam “dormindo” ou exercendo outras atividades durante o expediente.
Com o passar do tempo, as rotinas foram se adequando e um maior equilíbrio se instaurou. Estar em casa não significava mais ter que ficar 12 horas diante do computador participando de reuniões virtuais que traziam menos benefício à empresa do que outras tarefas que acabavam sendo preteridas em função do pouco tempo que sobrava. Dedicar algum período do expediente para pagar contas, entrar num site de notícias ou mesmo acessar o celular deixou de “ser um pecado”, aliás, da mesma forma que também não era no trabalho presencial.
Como parte da análise dessa discussão, jogamos luzes para um erro já enraizado no ambiente corporativo e com poucas perspectivas de mudança: a confusão entre carga de trabalho e carga de escritório, visto que o fato de estar no escritório não significa que se esteja produzindo. Quem nunca se deparou com colegas que evitam sair mais cedo do que os demais, gerando assim uma espiral de pessoas presente até altas horas da noite, porém com um índice de produção marginal? É fato que ficam bem vistos, afinal são tidos como profissionais que trabalham muito, pena que a interpretação do que seja “muito” dê margem à possibilidade da quantidade ser mais valorizada do que a qualidade.
A verdade é que as pessoas e as empresas acabaram se acostumando ao home office e incluindo ele a sua rotina – quantos espaços alugados foram devolvidos aos proprietários. Curioso notar que os mais velhos, por terem passado mais tempo de sua vida profissional trabalhando presencialmente, têm se mostrado menos resistentes à volta aos escritórios, sendo o raciocínio inverso aplicável aos mais jovens.
Nesse contexto, a possibilidade do trabalho híbrido – parte presencial, parte virtual - surgiu como um paliativo, mas que sem uma definição clara sobre escalas e responsabilidades acaba não aproveitando todo o potencial da iniciativa. 
Sim, é possível obter produtividade sem precisar estar presente todos os dias, por outro lado, a interação entre as áreas é fundamental. Ver pessoalmente, falar sobre assuntos diversos e o convívio ajudam demais na resolução de problemas, seja na agilidade como na qualidade, afinal a convivência contribui para que as pessoas passem a se entenderem através de olhares, entonação e até em termos de linguagem.
Voltando à determinação do Musk, não se pode negar que, como dono, ele tem total direito de estabelecer as políticas corporativas de sua empresa, desde que respeitando às leis trabalhistas. Todavia, seria mais prudente entender o ambiente organizacional para daí definir os modelos a serem adotados. Simplesmente determinar, apesar da prerrogativa, implica no risco de não reter, tampouco atrair profissionais tamanha a importância que o local de trabalho adquiriu na escala de valores.





terça-feira, 15 de novembro de 2022

As marcas esportivas na Copa 2022

Mais uma Copa do Mundo se inicia e mais uma vez aproveitamos o evento para analisar os movimentos das marcas esportivas no que tange ao suprimento das seleções.
Em 2022, a Nike voltou a ser a marca mais presente, fato que só tinha ocorrido em 2014. São treze seleções – três a mais do que em 2018 – que vestem seus uniformes. Dentre essas estão o Brasil, a França e a Inglaterra (equipes que somam oito conquistas do citado campeonato).
Em segundo lugar aparece a Adidas com sete times, cinco a menos do que na Copa passada. Desde 1974, a marca alemã já foi a mais presente em onze edições. Na atual, suas principais equipes são Alemanha, Argentina e Espanha, que juntas somam sete conquistas de Copa do Mundo.
Na terceira posição, colada à Adidas, vem a Puma com seis seleções. Cumpre relatar que na Copa de 2006, graças à sua forte presença no continente africano, a marca foi a líder em número de equipes. Na atual edição, a única de suas seleções que já conquistou o campeonato foi a do  Uruguai.
Quando descemos à análise para níveis continentais, encontramos a Nike ausente apenas na África, porém sendo a mais presente nos demais. A líder no continente africano é a Puma.
As demais marcas que completam a relação das que vestem seleções na Copa do Qatar são: Hummel, Kappa, Majid, Marathon,  New Balance e One All Sportscom uma equipe cada.
As mudanças no “ranking” das marcas ocorrem geralmente em função da classificação dos países, ou seja, são poucos os casos em que há troca de fornecedores. Das trinta e duas seleções que disputam a Copa de 2022, vinte e quatro também jogaram a de 2018 e dessas, apenas três (12,5%) mudaram de fornecedor: Iran, que deixou a Adidas pela iraniana Majid, Marrocos, que trocou a Adidas pela Puma e Tunísia que teve a Uhlsport substituída pela Kappa.
Como podemos constatar, as trocas aconteceram em seleções sem muita tradição no futebol. Na verdade, as mudanças costumam ocorrer com pouca frequência nos times considerados favoritos. A Alemanha, por exemplo, veste Adidas desde a Copa de 1982, a Argentina desde 1990 e a Espanha desde 1994. No caso das equipes supridas pela Nike, temos o Brasil que está com ela desde 1998.
Dos oito países que já conquistaram alguma edição da Copa do Mundo três mudaram de fornecedor no século atual: o Uruguai, que jogou com L Sporto em 2002 e em 2010 trajava Puma (2006 não se classificou), a Inglaterra, que em 2014 trocou a Umbro pela Nike, e a Itália, que jogou com Kappa em 2002 e com Puma nas posteriores que participou. A propósito, a partir de 2023, a Azurra será suprida pela Adidas. 
Ainda que a presença no maior número de equipes seja importante para as marcas, tanto no que diz respeito à exposição como às vendas, a possibilidade de se chegar à final e conquistar a Copa conferem vantagens ainda maiores às marcas. Sob esse prisma, a disputa se mostra bastante  acirrada, pois, considerando as cinco últimas Copas, temos a Adidas com quatro seleções campeãs e uma vice, a Nike com uma campeã e três vices, enquanto a Puma conta com um vice-campeonato.







terça-feira, 8 de novembro de 2022

Os "gurus" da internet

Alguns já devem ter ouvido a frase “todo dia sai de casa um bobo”, a qual costuma ser utilizada para explicar condutas desonestas que, sem a utilização de armas ou qualquer outra forma de coação, levam os incautos a sofrerem alguma espécie de prejuízo. 
Com o advento da internet, esses “golpes” se sofisticaram e até aumentaram, a ponto de podermos adaptar a frase do parágrafo anterior para algo do tipo “o bobo não precisa mais sair de casa”, tamanha a quantidade de fórmulas mágicas que são oferecidas para “melhorar” a vida das pessoas.
Ganhe dinheiro sem sair de casa! Emagreça X quilos em apenas um mês! Aprenda inglês em Y semanas!
Quem nunca se deparou com alguma publicidade com os dizeres similares aos narrados acima?
Se não bastassem tais ofertas, ainda há os gurus que, em nome de uma suposta sapiência exclusiva, atraem seguidores e fãs inebriados por palavras e casos espetaculares. 
A argumentação de que muitos desses não cobram nada para repassarem seus ensinamentos e são confiáveis, não se sustenta, pois há monetização em função da audiência, de patrocínios, de palestras e consultorias que certamente farão.
E por favor, não venham com a explicação que tais “gurus” são bons de marketing, pois definitivamente não são. Quem mente e engana não faz marketing, comete golpes, o que é completamente diferente, ainda que possam se aproveitar de alguns conceitos práticos da área.
Aliás, vale observar que as grandes referências em marketing pouco utilizam a auto-divulgação para mostrarem seus conhecimentos e obras, sendo a recíproca verdadeira.
Obviamente que não é correto, nem justo, generalizar e colocar todos os que se utilizam dos canais para proferir “ensinamentos” no mesmo rol de “gurus”. Na verdade, é bem provável que haja muito conteúdo bom. O difícil é separar o joio do trigo, até porque a miopia característica dos fanáticos não permite enxergar algumas questões básicas que permitiriam discernir a respeito.
A título de tentar fazer tal distinção, vale atentar para dois pontos:
- quem realmente conhece sobre algum tema geralmente não é taxativo, nem tenta oferecer receitas de sucessos infalíveis, preferindo colocar hipóteses, provocar reflexões e dar opiniões, ao invés de estabelecer verdades absolutas.
- procurar obter com profissionais realmente conceituados nas respectivas áreas, referências sobre o “guru”, isto é, investigar sobre como ele é reconhecido no meio.
Não há como negar que os canais que surgem no YouTube são ferramentas fantásticas, na medida em que concedem a oportunidade de se conhecer em qualquer lugar e momento sobre algum tema de forma gratuita em grande parte das vezes, mas, por outro lado, permite que pessoas com pouco conteúdo se apoderem de uma autoridade que não possuem para falar um monte de besteiras e desvirtuar de forma massiva alguns assuntos.





terça-feira, 1 de novembro de 2022

Novos tempos para o marketing

Enfim as eleições terminaram, entre vencidos e vencedores fica a certeza de que não faltaram perdedores.
Perderam a vergonha em defender seus candidatos de forma fanática, ficando cegos às falhas de preparo e conduta dos seus “escolhidos”.
Perderam amigos ao mostrarem que os princípios outrora mostrados não existiam ou foram extraviados para sabe-se lá onde.
Perderam a noção ao transformarem a essência dos grupos de redes sociais, criados outrora para abordar outros temas, em plataformas de suas convicções políticas.
Perderam a oportunidade de aprender com o contraditório para dali diminuírem a insegurança que os fazem se achar donos da verdade e infalíveis.
Mas e o marketing, onde fica nisso? Afinal a proposta do blog é discutir marketing e gestão.
A resposta é simples: diante desse contexto de “perdas”, aumenta cada vez mais a responsabilidade dos executivos de marketing no que tange à identificação detalhada do público-alvo, assim como em relação a se conscientizarem de que os atributos ligados à racionalidade podem não ser suficientes para a obtenção de bons resultados, mesmo porque a tentativa de encontrar coerência em fanáticos é uma enorme incoerência.
As eleições mostraram, entre outras coisas, que a necessidade de “pertencer”, isto é, fazer parte de algum grupo, seita, comunidade, seja lá como queiram chamar, é um desejo muitas vezes não revelado, mas que é latente no ser humano.
Deixaram claro também que tão ou mais importante do que a qualidade de algo ou alguém, é a quantidade de argumentos que propiciem justificativas internas e externas que embasem sua escolha. 
Todavia, talvez o principal desafio para o marketing seja aprender como sobressair no mercado sem a utilização de mentiras, mesmo sabendo que muitos concorrentes o farão cada vez mais. Afinal, numa completa inversão de valores, passou-se a aceitar a mentira como forma de liberdade de expressão com alegações de que o “mentiroso” está sujeito a arcar com as consequências do que falou, negligenciando a lentidão da justiça e que os estragos que as inverdades podem causar provavelmente não serão compensados pelas sanções judiciais. Algo mais ou menos na linha de permitir que se mate alguém baseado na possibilidade de o assassino vir a ser preso, ignorando que a vida perdida não volta.
Isso não significa dizer que a disputa contra os que se utilizam da ilegalidade é uma novidade. Claro que não é! Praticar preços competitivos concorrendo com quem sonega não é nada fácil, tal como não é disputar competições contra adversários que se dopam. A novidade dessa vez fica por conta do maior descaso com a prevenção baseado numa suposta punição futura, a qual, insisto, pode não ser suficiente para reparar os danos.
Vejamos como o marketing irá se adequar sem apelar para práticas que venham a distorcer sua essência, a qual já foi bastante abalada pelos chamados “marqueteiros” políticos.
Torçamos para que, pelo menos no mercado, a verdade não seja um mero vocábulo.