terça-feira, 27 de abril de 2021

Super erro da Super League

Durou menos de 48 horas a existência da Super League. Na verdade, a competição que reuniria quinze clubes fundadores mais cinco convidados por critérios técnicos só chegou a ser “realidade” nos noticiários e nos devaneios de alguns dirigentes, pois a avalanche de opiniões contrárias e a desistência da maioria dos clubes deram o tom do que seria o desenlace.
A causa do “fracasso”, nesse caso, é fácil de apontar: a falta de visão estratégica e, consequentemente, de planejamento. 
Primeiramente deve ser registrado que é inconcebível que um produto seja lançado sem a realização de uma pesquisa bem elaborada e que contemple os principais públicos envolvidos. No caso da Super League seria fundamental entrevistar um número significativo de representantes dos seguintes segmentos: torcedores - tanto dos clubes participantes como dos “excluídos” -, patrocinadores das equipes e da modalidade, imprensa, órgãos federativos, clubes, meios de comunicação, governos, jogadores e comissões técnicas. Contudo, os responsáveis pelo “lançamento” preferiram confiar nos seus "achismos", inebriados pelos possíveis ganhos financeiros de curto prazo e pela soberba que caracteriza os pouco afeitos a estudos. 
Os que preconizam a agilidade operacional em detrimento da cadência estratégica minimizaram o ocorrido, alegando que o mesmo não trouxe grandes prejuízos, visto não ter havido investimentos substanciais e que a reversão foi rápida, o que não deixa de ser verdade. Só esqueceram, ou preferiram ignorar, os danos à imagem e a insegurança criada no meio. Isso mesmo: será que os patrocinadores irão querer investir em clubes que, independentemente de seus desempenhos técnicos, podem vir a ser alijados da competição mais importante em função de alguma decisão autoritária? E os patrocinadores da competição que será descontinuada, a Champions League, renovarão seus contratos?
O próprio critério de escolha dos participantes, sem querer entrar aqui em divagações filosóficas sobre a meritocracia e a essência do esporte, dá margem para críticas na medida em que correlacionam capacidade financeira com garantia de boa gestão e, por conseguinte, de melhores times.
Além disso, não enxergam que a audiência de um campeonato não está associada exclusivamente à participação dos melhores times, e que  fatores como presença de ídolos e número de fãs precisam ser ponderados para se estabelecer quem são efetivamente "os mais atrativos", condição, aliás, bastante dinâmica.
Na ansiedade dos ganhos rápidos, deixaram também de avaliar os riscos para a indústria, pois, na medida em que se cria uma competição tão mais importante do que as outras, essas últimas perdem a atratividade diante de patrocinadores, o que impacta na capacidade de investimento em contratação e formação de jogadores, levando ao “apequenamento” de algumas equipes. Tal cenário redunda em um menor interesse do público pela modalidade e consequentemente de menores receitas advindas com bilheteria e direitos de transmissão.
É importante deixar claro que as críticas contidas no artigo são voltadas exclusivamente à Super League, ou seja, o conceito de se criar ligas com as equipes mais representativas segundo alguns critérios não se trata de nenhum absurdo, vide, por exemplo, as ligas profissionais norte-americanas. Todavia, antes de se aventurar nesse tipo de criação, é preciso entender bem as características de cada modalidade, de cada país, da concorrência e, principalmente, da cadeia econômica envolvida, a qual comporta, entre outros, a formação e o aproveitamento dos atletas.


terça-feira, 20 de abril de 2021

Cabelos grisalhos

Como já escrevi em outros artigos, não acredito em “novo normal”, pois, além de semanticamente me parecer incorreto, as mudanças que ocorrem na sociedade fazem parte de um processo adaptativo e que tende a se tornar normal ao longo do tempo.
Esclarecida essa convicção, temos com a pandemia, de fato, uma mudança de hábitos e comportamentos, sendo que muitos deles podem vir a perdurar por algum tempo ou até mesmo a fazerem parte do cotidiano. 
Abaixo ilustramos o tema com um fato real: a maior incidência de mulheres com cabelos grisalhos nesse período.
O fechamento dos salões de cabeleireiro por algum tempo fez com que parte do público frequentador deste tipo de estabelecimento deixasse o cabelo na cor natural ou comprasse a tinta no varejo para executar o serviço por conta própria. 
Dados desta indústria corroboram com essa percepção, vide a queda expressiva das vendas dos “produtos profissionais” e o aumento dos que são comercializados no varejo.  Empresas como a L’Óreal, além de voltarem sua operação para esse tipo de consumo, também focaram no desenvolvimento de soluções para um público que cresceu:  pessoas grisalhas, cujos cabelos necessitam de cuidados especiais (?). 
Antes de passarmos ao ponto de reflexão, chamamos a atenção para a atuação da empresa no que tange aos conceitos de marketing: entendeu o mercado rapidamente, identificou – ou criou novas necessidades – e se antecipou no que tange ao atendimento dos canais. Na mão inversa, estamos vendo muitas empresas esperando a pandemia passar para, quem sabe, voltarem ao mesmo nível de resultados ou, de forma paliativa, seguirem o movimento das soluções digitais de comercialização e de entrega.
Voltando ao mote do artigo, provocamos o leitor a refletir através dos seguintes questionamentos: 
- a moda surge através de uma conjuntura a se prever ou de uma necessidade de momento?  Adaptando o questionamento ao caso ilustrado: seria possível prever que o isolamento teria algum tipo de influência na cor de cabelo das pessoas?
- é razoável correlacionar o fim da moda à satisfação da necessidade? No nosso exemplo, a pergunta seria melhor colocada da seguinte forma: quando a vida voltar ao que era, o tom grisalho permanecerá como “desejável”?
- os estabelecimentos que ficaram fechados conseguirão ter seus clientes de volta? Qual o percentual de pessoas que experimentaram pintar seus cabelos em casa voltará aos salões?
Quem tentar ser definitivo nas respostas destas perguntas estará incorrendo num erro tão grave quanto o de esperar para reagir.
Caberá aos gestores de marketing, além de rever as estratégias de precificação, distribuição e comunicação,  estimar qual será o comportamento da população após esse período traumático, encontrando ainda o melhor posicionamento para seus produtos e serviços - incluindo alguns provavelmente novos - diante desse público.
Tal desafio certamente fará com que os bons gestores de marketing venham a aumentar o contingente de “grisalhos”. Se vão deixar os cabelos nesta "nova" tonalidade, é outra questão a se estudar.







terça-feira, 13 de abril de 2021

A Nike está On?


Ou a On está Nike? 
Pouco importa a retórica, aqui iremos abordar alguns assuntos relacionados ao marketing, tomando como base a recente classificação do atleta britânico Chris Thompson para a maratona dos Jogos Olímpicos de Tokyo.
Embora seja um feito digno de registros elogiosos, principalmente por se tratar de um atleta prestes a completar 40 anos, o fato que mais chamou a atenção na conquista foi o tênis por ele utilizado na prova qualificatória: um calçado todo preto, onde não se permitia perceber a marca, ainda que Thompson seja patrocinado pela On. Para quem nunca ouviu falar, a On é uma marca de material esportivo criada em Zurique, Suíça, com foco no segmento running e que tem como proposta "revolucionar a sensação de correr".
Não demorou muito para que o mistério do “tênis preto” fosse revelado: o maratonista correu com um Nike Vaporfly NexT%, cuja tecnologia revolucionou o mundo das corridas. Isso mesmo, o atleta usou uma marca diferente da que o patrocina.
A situação foi contornada através de um comunicado da própria On, no qual explica que consentiu o uso do calçado concorrente devido ao atraso ocorrido no desenvolvimento do tênis que estão fabricando com tecnologia similar. Ao final da mensagem acrescentaram que um sonho olímpico nunca deve ser comprometido por qualquer motivo.
Uma mensagem objetiva, onde externou sua consciência acerca dos anseios e desafios dos atletas, independentemente de eventuais conflitos mercadológicos, e também admitiu falhas no seu processo de planejamento. No geral, diante de todos os problemas, podemos considerar o comunicado como satisfatório, pois manifestou sinceridade e compreensão, além de deixar a marca mais popular.
Sobre a citada nova geração de tênis para corridas, notamos um movimento similar ao que aconteceu com os trajes de natação, porém, nesse caso, não há perspectivas de uma reviravolta que venha a proibir sua utilização.
Dessa forma, podemos até considerar esses calçados como uma nova categoria de produto, que as marcas entendem ser vantajosa até para o fortalecimento das respectivas imagens. Ilustra essa afirmação o caso da Nike vs. On, narrado acima, e a entrada das demais marcas concorrentes, o que demandará um esforço maior de marketing por parte delas, visto não poderem agregar o atributo "pioneirismo" ao posicionamento.
No caso da Adidas, o desafio é um pouco menos árduo graças ao seu time de bons corredores, o qual traz entre outros, o Kenenisa Bekele, detentor do 2o melhor tempo de maratona do mundo, fato que ajuda no processo de associação do produto à boa performance.
Outra perspectiva interessante é a da Asics, que por muitos anos foi referência em corrida, mas que vem naturalmente perdendo espaço em função dos novos entrantes e do maior investimento das grandes marcas no mercado. Nessa “nova categoria”,  a marca japonesa buscou um posicionamento que a diferenciasse das demais, o que acarretou no desenvolvimento de dois tipos de tênis com essa mesma tecnologia: um voltado para corredores de passadas mais largas (strides) e outro para os de passadas menores (cadência), proporcionando assim uma segmentação interessante e que, conceitualmente, trabalha o marketing de forma inteligente e correta.
A competição está só começando, muitas passadas ainda serão dadas nesta “corrida”, inclusive no que diz respeito a custos e precificação. Vale acompanhar!











terça-feira, 6 de abril de 2021

Engajamento paga a conta?

Estar presente nas redes sociais conseguindo um alto de índice de engajamento é de fundamental importância para as empresas, porém, tais condições não são suficientes para o sucesso das marcas. Sendo bem pragmático: de nada adiantará um crescente número de engajamentos e seguidores se estes não vierem a consumir ou influenciar substancialmente a compra de produtos e/ou serviços das empresas.
A argumentação de que a marca pode vir  se valorizar com as iniciativas nas redes sociais é verdadeira e não pode jamais ser desprezada, contudo, deve ser ressaltado que tal valorização não é garantia de liquidez, tampouco serve para arcar com os custos da empresa no curto prazo.
O fato é que incomoda ver a utilização das métricas ligadas às mídias digitais servirem como uma espécie de “salvaguarda” ou maquiagem para os demais resultados da organização.
Esse enaltecimento exacerbado às redes sociais acaba mascarando muitas vezes os problemas das empresas, além de definir como principal objetivo do marketing o mero “bom desempenho nas redes sociais”, relegando a planos inferiores a importância da distribuição, da precificação, da qualidade dos produtos e do posicionamento, entre outros.
Mesmo na parte relacionada à divulgação, não é correto desprezar a utilização de outras mídias, pois sem elas torna-se mais difícil promover uma comunicação integrada e estratégica.
Outro ponto que carece de atenção é a má utilização das métricas, vide, por exemplo, a quantidade de “rankings” que são criados em termos de número de seguidores. Guardadas as devidas proporções, seria como medir o desempenho de um time pelo tamanho de sua torcida ou de um site de comércio eletrônico pelo número de acessos, mesmo que não convertidos em compras.
Claro que as condições enumeradas acima denotam um ótimo potencial de resultados, mas simplesmente se deitar nos louros desses grandes números e não procurar entender e explorá-los se constitui num preocupante desperdício de oportunidades, principalmente em um mercado que evolui em velocidade supersônica.
Ainda que o "modismo" possa ser apontado como uma das causas desse fenômeno, é preciso contemplar também que a sociedade passa por um processo de miopia, no qual se valoriza mais o chamado marketing digital ao invés de o marketing como um todo. 
Mesmo que não pareça razoável supor que a "parte" possa ser mais importante do que a "totalidade", tem sido bastante comum esse tipo de segmentação, a qual faz com que as ações digitais, e aqui não me refiro apenas à comunicação, ocorram independentes dos objetivos macros das organizações. Aliás, há um quadro ainda mais grave: aquele em que as empresas deixam de se utilizar de conceitos consagrados no “mundo físico” para desenvolverem versões “inovadoras” de operação, quando, na verdade, bastaria adaptar o que já existe às novas possibilidades e características.
Questão de ajustes, conhecimento e humildade, os quais certamente virão.