terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Marcas expostas

Como acontece todo ano, o Super Bowl, evento que define o campeão da temporada de futebol americano, ganha a atenção da imprensa, fãs de esporte e até de pessoas pouco familiarizadas à modalidade, mas que se impressionam com os números envolvidos.
Para os “amantes” do marketing, os comerciais veiculados nos intervalos se constituem numa atração até maior do que o evento propriamente dito, tanto pela qualidade das produções como pelas cifras envolvidas nas compras de mídia.
Até aí nenhuma novidade, porém, desde o ano passado outro tema passou a suscitar o interesse dos profissionais de marketing: a exposição das marcas e respectivas valorações.
Na verdade, trata-se de um assunto que sempre despertou o interesse daqueles que consideram a “mídia espontânea” um balizador do retorno dos investimentos em marketing, todavia, até o ano passado não existia uma metodologia que conseguisse captar com extrema fidedignidade a exposição em seus detalhes, o que foi resolvido com o software desenvolvido pela empresa Hive, que apura as exposições visuais e verbais ao longo do evento em peças como camisetas, toalhas, fones de ouvido e garrafas, entre outros.
Segundo o estudo elaborado pela Elevate Sports Venture, a exposição no Super Bowl LVI representou um ganho de US$ 170 milhões para as marcas, o que equivale a 75 minutos de exposição.
A Nike foi a marca mais exposta - 46 minutos e trinta e sete segundos - , graças aos uniformes dos jogadores. A seguir vieram a Gatorade e a Bose com oito e cinco minutos respectivamente.
Em termos de menções verbais, a liderança ficou com a Pepsi - 11 minutos.
Não resta dúvida que tal métrica ajudará os profissionais de marketing a tomar e justificar decisões acerca dos seus investimentos, contudo, nunca é demais ressaltar que a avaliação sobre a efetividade da exposição não pode ficar restrita ao número de aparições.
É importante investigar se tais aparições são percebidas e de que forma.
Há reflexos nas vendas ou na demanda dos produtos?
No recall, isto é, a marca passou a ser mais lembrada?
No fortalecimento dos atributos que se objetiva, ou seja, como a marca está sendo percebida após o evento?
Desprezar tais questionamentos se constitui num enorme equívoco, o qual, aliás, costuma ser bastante cometido por profissionais que, embora trabalhem com marketing, não sabem com exatidão o que isso significa em sua essência.
Acham, ou melhor, têm a certeza que basta a marca aparecer para o investimento se pagar, independentemente das respostas aos questionamentos sugeridos acima.
Pegar resultados fornecidos por institutos de pesquisas e/ou consultorias sem analisá-los e cruzá-los com outras variáveis serve simplesmente para rechear apresentações e criar pautas jornalísticas.
Sem medo de estar cometendo injustiça, é possível afirmar que trabalhar com marketing desprovido de capacidade analítica e habilidade numérica é como disputar o Super Bowl sem estratégia.





terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Gestão negacionista

Embora a palavra “negacionista” tenha ficado associada ao governo brasileiro e seus ferrenhos defensores, ela, na verdade, sempre esteve presente em vários setores da sociedade, inclusive no universo corporativo.
Talvez no passado ela fosse substituída por “teimosia”, mas pouca coisa mudou, a não ser o crescimento das redes sociais, capazes de permitir que as pessoas se “informem” e se “aculturem” pinçando artigos, muitos deles fora do contexto, ou de posts recebidos.
Antes de prosseguirmos, é importante deixar registrado que o direito à liberdade de pensamento deve ser sempre preservado, porém, sem que a honestidade seja relegada em prol de “se ter razão”.
Difícil precisar a origem dessa busca incessante em se ter sempre razão, aliás, nada contra esse objetivo, mas sim com os meios para atingi-lo. 
Teorias da conspiração, que por serem conspiratórias não podem ser provadas, proliferam no universo dos que fanaticamente querem impor suas convicções. O mais grave é que acreditam.
Generalizações também fazem parte do repertório, ao julgarem todas as pessoas de certo espectro como iguais em pensamentos e atitudes. Nesse caso esquecem que, agindo dessa forma, dão margem a serem também generalizados pelas outras partes.
Para finalizar a relação de artifícios para teses negacionistas, ou de busca pela razão, como queiram, precisamos citar a “interpretação conveniente”, que nada mais é do que “enxergar” de forma adequadamente distorcida alguma situação.
Transpondo para o universo corporativo, convido a refletirem sobre o número de vezes que nos deparamos com projetos ou ideias que são previamente rechaçados através da frase: “já tentamos isso antes” ou “aqui é diferente”.
O fato de se ter tentado antes não significa que a tentativa foi bem executada, tampouco que o momento era adequado. Além do que, muitas vezes uma visão "nova" é capaz de enxergar caminhos que as atribuições do dia a dia e as “verdades consolidadas” não permitem.
Já o argumento “ser diferente” é ainda mais risível, afinal, raríssimas coisas na vida são exatamente iguais. Nenhum ramo de atividade é igual a outro, nenhuma empresa, ainda que seja do mesmo segmento é igual a outra, e assim por diante. Aliás, a busca pela diferenciação é a base dos posicionamentos mercadológicos.
Apesar da fragilidade já demonstrada das citadas “táticas” para se ter razão, seria leviano afirmar que todas as conclusões que partem dessas práticas estão sempre erradas. Contudo, é fácil afirmar que na maioria das vezes está, o que se deve a uma única razão: a falta de embasamento, pois se assim houvesse, daria espaço ao contraditório, o qual é fundamental para se formar ideias.





terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Decathlon nos EUA

A Decathlon, varejista francês especializado em material esportivo, após quase três anos no país, fechará em março suas duas últimas lojas nos EUA. Cumpre observar que essa foi a 2ª tentativa da marca em território norte-americano, visto ter entrado no país em 1999, através da aquisição da MVP Sports Stores, tendo encerrado as atividades em 2006.
A marca justifica a decisão como parte da mudança do seu modelo de negócio, no qual disponibilizará seus produtos através do comércio eletrônico e em parceiros como Walmart e Target. Estratégia semelhante é adotada no México e na Suíça.
No que tange à distribuição dos produtos através de outras redes de varejo, podemos inferir que esta operação se refira às marcas próprias desenvolvidas pela Decathlon, visto não fazer sentido que um Walmart, por exemplo, adquira produtos da Nike e Adidas através de algum intermediário.
Reforça esse entendimento, o fato do crescente número de lançamentos – são mais de 80 marcas próprias – e as ações que estão sendo adotadas para fortalecimento delas. Recentemente, o tenista francês Gael Monfils encerrou um contrato de dez anos que tinha com a Asics e de nove anos com a Wilson para celebrar outro com a Artengo, marca própria da Decathlon. Até no futebol, modalidade madura em termos de patrocínio esportivo, encontramos um time da primeira divisão belga, o KV Oostende, que é vestido pela Kipsta, marca própria da varejista francês. 
Já em relação ao e-commerce, entendemos que pode ser sim uma boa fonte de receitas, porém, ao fechar lojas físicas, ignora o conceito de omnichannel de integração entre os canais, e perde vantagens competitivas em termos de logística, pois descarta, entre outras, a possibilidade de o cliente comprar online e retirar na loja física, perdendo assim agilidade e aumentando os custos com frete.
No Reino Unido, além de aumentar o número de lojas, a rede francesa viu diminuir as entregas domiciliares em 10% no período de 2019 para 2021, ao passo que houve um aumento significativo nos serviços de “clique e retire”.
Fica notório que a adoção do e-commerce sem a companhia de lojas físicas coloca em risco o sucesso de qualquer varejista, sendo importante acrescentar que este mercado nos EUA é altamente competitivo, não perdoando erros. Vale ressaltar que muitas redes consagradas globalmente, como é o caso do Carrefour, não obtiveram os resultados esperados e encerraram suas atividades no país.
Se é isso que vai acontecer com a Decathlon, só o tempo dirá, mas, talvez, o ponto de maior relevância no artigo seja nos fazer refletir que a receita de sucesso em um país não garante necessariamente bons resultados em outros. 







terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

Mente sã, corpo são

Em um intervalo curto de tempo, pelo menos três atletas de destaque internacional – a tenista Naomi Osaka, a ginasta Simone Biles e o surfista Gabriel Medina -, todos participantes de esportes essencialmente individuais, tomaram a decisão de “dar um tempo” das competições para
  tratarem da saúde mental.
Responsabilizar os tempos modernos pela aparente maior incidência de tais fatos pode ser simplório demais, ainda que as redes sociais deixem as pessoas mais vulneráveis a críticas e ataques públicos. 
Diante da complexidade do diagnóstico e da ignorância confessa do autor acerca do assunto, não iremos por esse caminho, tampouco julgaremos quem quer que seja pelos atos pautados nas aflições psicológicas.
Contudo, acreditamos que haja espaço para discutir as consequências desses atos no ambiente esportivo e até de traçar parâmetros com o mercado corporativo.
Em qualquer carreira, as responsabilidades vão sendo incorporadas às rotinas dos executivos na medida em que eles galguem posições, lembrando que tais desenvolvimentos costumam ser função dos bons desempenhos ao longo do tempo. Maiores responsabilidades se traduzem em promoções e melhores remunerações, mas também em cobranças e necessidade de mais dedicação, o que deixa os momentos de lazer com amigos e família mais raros. A opção de recusar os benefícios advindos do sucesso geralmente fica descartada ou ocultada pelas perspectivas de crescimento.
Achar que o sucesso compreende apenas benesses se constitui num enorme equívoco, sendo natural que as pressões sejam cada vez mais fortes, aliás, uma das razões para se destacar positivamente em qualquer profissão é justamente lidar bem com as pressões. Nessa hora muitos não aguentam, levando-os à queda de produção e/ou à procura de um “porto seguro”, que pode ser o próprio afastamento da profissão.
E como ficam os patrocinadores dos atletas que sofrem com a saúde mental? Por mais que a performance seja, na maioria das vezes, o objetivo do investimento, não é interessante ter algum de seus atletas fora do cenário competitivo. Obviamente, cabe a todos, inclusive aos patrocinadores, entender e apoiar, afinal, trata-se de um problema que, se não remediado, pode levar a consequências seríssimas.
Todavia, assim como acontece nos processos para recrutamento e promoção de executivos, seria interessante analisar os aspectos emocionais dos potenciais patrocinados e, dessa forma, se antecipar aos eventuais problemas, ou mesmo, ponderar quais as características requisitadas e toleráveis para aqueles que representarão suas marcas.
Evidentemente que não é algo de fácil predição, mas diante da incidência de casos, principalmente entre os grandes ídolos do esporte, faz-se necessário dar mais atenção a todos os aspectos que compreendem o perfil psicológico dos atletas e elaborar acordos que contemplem planos contingenciais para eventuais problemas.