terça-feira, 3 de outubro de 2023

Profusão de X

Atrasado, reconheço, falarei sobre a mudança da marca Twitter para X, prometo não me estender na avaliação a respeito, pois, muito já foi discutido.
Acho bastante salutar os devidos processo de branding ou rebranding, razão pela qual deveria estar defendendo a ação implementada, no entanto, tal processo exige o cumprimento de etapas que abrangem o desenvolvimento do produto/serviço/organização, definição de identidade e de posicionamento. Todas elas requerem estudos minuciosos e tempo, o que não aconteceu no caso do Twitter, ou X.
A argumentação de que a alteração se trata de um passo inicial para o movimento de se transformar em um novo aplicativo, ainda que guarde alguma coerência, não se sustenta pelo prisma de marketing.
Na verdade, parece haver uma certa obsessão pelo X por parte do novo proprietário do Twitter, aliás, não só por parte dele.
Inúmeras empresas, pelas mais diversas razões estão optando por acrescentar o X ao nome original ou criando nomes que contenham a consoante.
Quem não se lembra das empresas do Eike Batista, EBX, OGX etc.? A justificativa era de que o X remetia à multiplicação.
Na verdade, há uma infinidade de significados e interpretações para a letra.
Uns interpretam como algo misterioso ou desconhecido, tanto que em álgebra a letra costuma identificar a variável a ser descoberta. Por outro lado, há também os que associam a algo conhecido. Quem nunca viu um mapa com um X marcado para a definição de um local?
Não nos esqueçamos do X como assinatura de analfabetos, como forma de apontar que uma questão está errada, como substituição da palavra Cristo (Xmas no Natal) e até para simbolizar beijo em e-mails.
Há certamente inúmeros outros significados que, dependendo da criatividade do “desenvolvedor” de alguma marca assim como da vontade do responsável pela aprovação, passam a ter uma história a ser contada.
Esse cenário, sem unanimidade, parece indicar que o processo criativo passa principalmente pela questão de convicção do profissional de criação ou, quem sabe, de algum não profissional que se considere criativo.
Importante também mencionar as soluções de grafismo que embasam algumas' construções de marca, vide a FedEx, cuja junção do E com o X remete ao formato de uma seta, simbolizando rapidez.
Embora estejamos focando a letra X, é importante ressaltar que várias marcas consolidadas e famosas só costumam ser entendidas após a devida explicação.
Vocês sabiam que a forma da marca de computador VAIO tem como intenção transmitir na primeira sílaba, através do símbolo ~ a vertente analógica e na segundo com I O, a referência digital (binário 1 e 0)?
E que as antigas testeiras das lojas de conveniência am pm tentavam remeter às diversas fases do dia do amanhecer à noite?
A seta que une as letras A e Z na logo da Amazon não tem como intuito mostrar uma carinha feliz ao contrário do que muitos imaginam, mas sim, demonstrar que o sortimento de produtos comercializados é abundante, tem de A a Z.
Dito isso, nada contra usar simbolismos entendidos por poucos, uma marca, no meu modo de ver, não precisa ter o entendimento geral, no entanto, essa febre de X em função de modismo parece beirar o eXagero.






terça-feira, 26 de setembro de 2023

Investidores e investidas

Podemos estabelecer que o ciclo de qualquer novo empreendimento passa basicamente por três fases:
1 - Ter a ideia, a qual, ressalte-se, não está condicionada exclusivamente a algo totalmente inovador ou disruptivo. Evoco aqui os 4 Ps de marketing, pois a formatação da ideia, sua precificação, sua distribuição, como será a divulgação e consequente posicionamento é que nortearão toda a conceituação.
2 - Colocar a ideia em prática, ação que requer resiliência, pois, certamente, a quantidade de negativas que se recebe nas diversas etapas até a efetiva operação é um fator com alto potencial de desencorajamento. Além da resistência, é importante que o entusiasmo e o entorpecimento pela possibilidade de se tornar fundador de um “unicórnio”, não leve o empreendedor a negligenciar fatores críticos como os regulatórios, tributários e, sobretudo, achar que a solução oferecida é mais importante do que o problema. 
3- Por fim, a própria operação do empreendimento, visto requerer skills diferentes dos requisitados nas etapas anteriores, inclusive no que tange ao planejamento do crescimento.
Tentar dar algum tipo de hierarquia em termos de dificuldade e importância às três fases citadas seria improdutivo e certamente redundaria em erro, afinal o grau de complexidade de alguma tarefa está correlacionado à característica do executor.
Para alguns ter ideia é relativamente fácil, mas fazer um projeto acerca dela contemplando todos os requisitos gerenciais ou mesmo buscar recursos para tal é de uma dificuldade atroz. Para outros, iniciar a gestão é até relativamente tranquilo, porém, por diversas razões, administrar o negócio se torna um problema.
A situação adquire um grau ainda maior de complexidade em função de o empreendedor achar que, pelo fato de ter erguido a operação é também a pessoa mais indicada para a gerir, o que talvez contribua para a sua conclusão de que a contratação de um CEO é desnecessária.
Diante desse quadro, os fundos de private equity quando aportam recursos nesses investimentos precisam estar atentos a tais particularidades visando mitigar problemas e corrigir eventuais desvios de rotas.
Alguns fundos, atentos a esse cenário, incluem em suas estruturas organizacionais a área de execution - value creation, que tem como uma de suas atribuições acompanhar os resultados das empresas investidas e, de alguma forma, contribuir para as melhorias.
Ainda que o foco principal da área de execution remeta aos aspectos econômico-financeiros, o conhecimento dos executivos dessa área devem abranger também marketing, comercial, recursos humanos e operação, entre outros, até porque seria inviável pensar em resultados satisfatórios sem que os diversos departamentos de gestão estejam integrados.
Justamente por ser uma função com características extensivas, há entre seus desafios, o equilíbrio de sua “participação” na operação da investida, de forma que consiga acompanhá-la de perto e sugerir iniciativas sem que isso seja visto pelos gestores como uma interferência excessiva, o que fatalmente criaria problemas de relacionamento.
Por outro lado, cabe ao empreendedor entender que o fundo não é apenas um mero “agente financeiro” e que uma participação mais ativa dele tem muito a agregar para o sucesso do negócio.
Curiosamente, nos empreendimentos em que o CEO é um profissional oriundo do mercado, essa percepção quanto à contribuição à gestão por parte do fundo costuma ser mais clara, o que não deixa de ser estranho, pois, seria de se esperar que o empreendedor carecesse mais de auxílio.
A causa da situação narrada pode estar relacionada ao fato de se tratar de uma modalidade de investimento ainda em fase de maturação, o que faz com que os fundos, por serem responsáveis pelos aportes financeiros, fiquem erroneamente associados a “financiadores”.









terça-feira, 19 de setembro de 2023

Lições de chocolate

 
A anunciada aquisição do Grupo CRM, do qual fazem parte a Kopenhagen, Cacau Brasil e Kop Koffe, pela Nestlé, além do alto valor envolvido – cerca de 4 bilhões de reais -, nos coloca diante de um interessante exercício de análise de marketing, principalmente no que tange aos canais de distribuição.
Os mais de mil pontos de vendas incorporados fazem com que a Nestlé passe a ter uma relação direta com o consumidor, fato que, provavelmente, é bem avaliado pela empresa, por já terem, guardadas as devidas proporções, operação similar através das lojas Nespresso. Nesse contexto, vale citar também a aquisição da rede de cafeterias Blue Bottle em 2017 nos EUA.
Aqui mesmo no blog já tínhamos escrito sobre o movimento da marca OMO em operar lavanderias com seu nome e usando, evidentemente, os produtos da linha de higiene e limpeza da Unilever, onde a empresa, além de associar a marca mais fortemente ao atributo limpeza, aufere maior exposição e vendas, visto que o cliente que deixar de lavar roupas em casa para fazê-lo nessa lavanderia certamente não usará produtos da concorrência o que, consequentemente, aumenta a participação de mercado do Omo.
Voltando ao caso da Nestlé, evidentemente é cedo para se fazer previsões acerca das possíveis derivações após a aquisição. Serão disponibilizados produtos da Kopenhagen e da Cacau Brasil no varejo? Pouco provável! E os da Nestlé estarão disponíveis nas lojas do grupo? Quem sabe! É certo, no entanto, que havendo sinergia entre as operações, alguns custos serão racionalizados, o que permitirá margens melhores. Ainda que as marcas não se misturem nos pontos de vendas habituais, a possibilidade de ter um contato mais direto com o consumidor final permite diversas interações, as quais vão desde avaliações de comportamento até ações de trade marketing mais agressivas, afinal se tem o controle total do ponto. Isso sem falar na possibilidade de incorporar outras categorias de produtos da Nestlé como café e sorvete, por exemplo, nas lojas.
Outro questionamento pertinente é sobre o papel do varejo diante desse movimento das marcas em direção a uma maior independência no relacionamento com o consumidor. É fato que a existência de mais pontos de vendas que comercializem produtos e categorias similares aos que ofertam pode de alguma forma trazer reflexos nas suas vendas, porém, por outro lado, os reforços de imagem que esses produtos passam a ter ajudam no consumo dentro do próprio estabelecimento varejista.
Aqui podemos ilustrar com o caso da Swift do grupo JBS, que, além de possuir lojas próprias, usa as áreas dos varejistas como uma espécie de store in store, ocupando um espaço com conservadoras que trazem sua identidade visual, as quais, obviamente, abrigam suas linhas de produtos.
Diante dos exemplos narrados, muitos podem concluir que esse movimento se trata de uma tendência, o que considero prematuro afirmar, afinal a quantidade de iniciativas é ainda pequena no âmbito geral. Além do que, há a necessidade de investimentos tanto para a aquisição de empresas com expertise na operação ou para começar do zero, o que requer recursos para a aquisição de pontos, estruturar operação, expansão, contratação, treinamento, marketing etc.
Sumarizando: o movimento de manter contato mais direto com o consumidor final é bastante interessante e traz inúmeras vantagens, vide a maior atenção ao e-commerce por parte das marcas, porém, quando se trata de lojas físicas não se aplica para todos.





terça-feira, 12 de setembro de 2023

Marcas esportivas no futebol - 2023-2024

Está no ar a edição referente à temporada 2023/24 do estudo realizado pela Jambo Sport Business, acerca das marcas esportivas que vestem os principais clubes de futebol do mundo. Vale lembrar que desde 2014 o material vem sendo publicado.
No estudo podemos constatar que a Adidas com 72 times se mantém na liderança que conquistou na temporada passada. Sua principal conquista foi a Roma que, até então, vestia New Balance.
A Nike com 62 clubes permanece na 2ª colocação, mesmo tendo ficado com oito equipes a menos do que em 2022-23.
No 3º lugar, a Puma se consolida na posição que ocupa desde 2017-18.
Já a italiana Macron, ao perder oito equipes, passa dividir a 4ª posição com a Umbro. Posteriormente aparecem: Kappa, Joma, Castore, New Balance e Hummel.
Quando focamos as 30 equipes que mais faturaram, segundo o mais recente relatório Football Money League produzido pela Deloitte, vemos Adidas e Nike empatarem na liderança e a Castore assumir de forma isolada a 3ª posição.
Cumpre registrar que, desde que o trabalho é realizado, essa foi a vez que mais encontramos times sem fornecedor. São sete, cinco só na Rússia. Tal fato pode ser explicado pela decisão de algumas marcas como, Adidas, Nike e Puma cessarem as operações no país em função da guerra, o que levou muitos clubes a terem que buscar produção independente. Ressaltamos ainda que algumas das equipes no citado país ainda ostentam uniformes da Adidas e da Puma, por entenderem que o contrato está em vigor. A propósito, a seleção do país substituiu a marca alemã das três tiras por uma regional chamada Jögel.
Na parte relativa ao Brasil, o estudo mostra que Adidas e Umbro são as marcas mais presentes com cinco times cada. Observa-se que quinze equipes têm marcas internacionais como fornecedor, quatro são supridas por marcas próprias e uma, o América MG, por um fornecedor nacional, a Volt.
Outro fato interessante de relatar diz respeito à liderança da Umbro pela primeira vez na Premier League.
Lembramos que, para podermos propiciar um foco comparativo ao trabalho, a amostra foi formada pelas 20 ligas que em 2014 tinham os elencos com maior valor de mercado, ou seja, é provável que algumas das ligas presentes no estudo não estejam mais entre as TOP 20, vide o fortalecimento da liga árabe, por exemplo, mas ainda assim foram mantidas da mesma maneira que ocorreu nas versões passadas.
Todavia, ainda que não esteja totalizada entre as 20, na edição desse ano incluímos a Arábia Saudita, a qual tem duas marcas regionais – Offside e Skillano – como as mais presentes.
Resistindo à tentação de falar mais a respeito do estudo, encerramos por aqui, deixando o link que permite acesso ao material completo: https://www.linkedin.com/posts/halfen_marcas-esportivas-no-futebol-2023-2024-activity-7107367086833700864-5lO_?utm_source=share&utm_medium=member_desktop






terça-feira, 5 de setembro de 2023

Discutindo o assédio

A solenidade de comemoração da Copa do Mundo de futebol feminino nos colocou diante de uma situação de assédio, a qual precisa ser discutida seriamente. 
Para os que não acompanharam o caso, refiro-me ao beijo na boca que o presidente da Federação Espanhola de Futebol deu na jogadora Jenni Hermoso no momento em que entregava a premiação.
Mas o que tem de mais um selinho como forma de demonstrar alguma satisfação? Aos que se apoderam desse argumento e tentam justificar a covardia minimizando o poder efetivo do ato, evoco que, independentemente das consequências físicas, afinal um beijo não machuca nem tira pedaço, qualquer toque exige consentimento das partes envolvidas.  E, por mais que houvesse vontade da jogadora, o que não parece ser verdade, o momento e o local são totalmente inadequados.
"Ah, o mundo está muito chato", minimizarão outros. Ainda que a sociedade esteja passando de forma radical de um extremo onde tudo podia para outro que nada pode, é inaceitável que se coloquem atitudes condenáveis sob o manto dos "mimimis" e chatices.
Assédios precisam ser coibidos e punidos, creio que não haja nenhuma dúvida quanto a isso. A discussão que se permite gira em torno do que deve ser considerado assédio, além da penalização a ser imputada aos assediadores.
Todavia, enveredar por uma visão jurídica do que vem a ser assédio requereria saberes sobre leis e fugiria da proposta do blog, assim, para simplificar, sugiro partirmos da premissa de que qualquer ação, cuja reação seja inibida pela maior força de quem provocou, caracteriza-se como uma covardia e, como tal, pode ser enquadrada como assédio.
Imaginem as consequências que a jogadora espanhola sofreria se empurrasse ou afastasse de forma veemente o agressor. Sim, beijo sem consentimento é agressão. 
Trazendo para o ambiente corporativo, além de casos em que superiores hierárquicos tentam de alguma forma seduzir colaboradoras baseados nos cargos que ocupam, há também os que tentam levantar a voz e dar gritinhos como forma de impor suas convicções salvaguardadas pelo receio dos interlocutores em colocar seus empregos em risco.
Aliás, será que os assediadores teriam a mesma postura se as posições fossem invertidas? Será que um chefe que grita com algum colaborador grita também com seu superior? 
Evidente que não!
Está mais do que na hora de discutir seriamente o assédio e criar a consciência de que beijos forçados são atitudes de idiotas, assim como gritos são demonstrações de incompetência, isso sem falar no risco de reações, digamos, pouco afáveis, não é mesmo?





terça-feira, 29 de agosto de 2023

O private equity precisa de marketing

O Private Equity, apesar de ser ainda pouco popular em relação a outras modalidades de investimento, se apresenta como uma forma de vital importância para o crescimento da economia e fortalecimento do conceito de ESG (environment, social e governance) no universo empresarial, visto ser esse também um fator para a criação de valor por proporcionar benefícios como as reduções dos passivos trabalhistas e ambientais, entre outros.
Grosso modo falando, os fundos de Private Equity investem diretamente em empresas que não possuem capital aberto - divergindo aqui do mercado de ações - e recebem participação no capital social das investidas.
O retorno do investimento se dá através da valorização das empresas, as quais, além de aporte financeiro, requerem dos fundos algum tipo de apoio na gestão estratégica.
Se no passado esse suporte se dava basicamente através da participação em conselhos e da escolha de executivos para funções mais voltadas às áreas financeiras visando a racionalização dos custos e controle orçamentário, atualmente, percebe-se que para a criação de valor é essencial focar no crescimento, o que requer atenção redobrada às estratégias de negócio e, sobretudo, ao marketing, pois, muitas vezes o mercado impõe a necessidade de se reposicionar, o que pode, eventualmente, alterar as ideias e os conceitos originalmente desenvolvidos pelos fundadores.
Dispor de profissionais com experiência de mercado tem se mostrado no processo de diferenciação entre os fundos um fator tão importante quanto as teses de investimento encampadas. A atuação dos fundos como meros consultores e sem a devida profundidade em assuntos diversos à área financeira, ainda que consiga propiciar resultados e retornos satisfatórios, começa a ser colocada em xeque quando se percebe que a maior participação do fundo na operação propicia inúmeros benefícios, os quais vão desde a maior oxigenação de ideias à adoção de práticas, até então inéditas naquele negócio.
Diante deste contexto, reforçamos que o marketing tem papel extremamente importante tanto na contribuição para o aumento de vendas como também no trabalho de posicionamento e fortalecimento da marca, um ativo intangível com enorme potencial de valorização, mas que muitas vezes é negligenciado pela atenção exacerbada que costuma ser dedicada aos números relativos a receitas e EBTIDAs.
Vale lembrar que marcas fortes, produtos bem formatados, posicionamentos estrategicamente definidos, precificação correta, distribuição conveniente e comunicação eficaz são ingredientes indispensáveis para a obtenção de bons resultados.
Ainda sobre a importância do marketing, a citação dos aspectos relacionados à ESG como instrumento de criação de valor, pode ser corroborado através do conceito do marketing 3.0 de Kotler, que preconiza que as empresas precisam não apenas focar na necessidade do consumidor, mas entendê-lo como um ser humano com preocupações voltadas à sustentabilidade e que, como tal, priorizarão empresas atentas a esses valores.
A propósito, é importante ressaltar que assim como as empresas investidas, os próprios fundos precisam buscar posicionamentos que os façam se diferenciar e serem atrativos aos olhos dos investidores. 







terça-feira, 22 de agosto de 2023

Melhor com...

A campanha desenvolvida pela Pepsi com o nome “Better with Pepsi”, além de extremamente interessante pelo lado da comunicação, também nos supre com aspectos muitas vezes negligenciados pelo marketing.
Iniciada em 2021, a ação tinha como foco principal atacar sua principal rival, a Coca-Cola, ao afirmar, baseada num blind test – pesquisa na qual o entrevistado avalia o produto sem saber qual é – que seu refrigerante era o preferido por 60% da amostra como o que melhor acompanhava os sanduíches do McDonald’s, Burger King e Wendy’s -  todas as três com contratos de exclusividade com a Coca-Cola.
Embora o objetivo original pareça ter sido mais uma ação de guerrilha, podemos encará-la também como uma iniciativa voltada à complementaridade, tal qual ocorre nos processos de extensão de marca. Lembremos, por exemplo, da Gillette que agregou as categorias de espuma de barbear e loção às lâminas, complementando assim a jornada da ação de barbear.
Se voltarmos nossas análises acerca das “utilidades” dos produtos, podemos criar uma segmentação classificando-os em complementares, únicos e os que se aplicam às duas definições – provavelmente o sonho de todos os gestores de produtos. 
Para ilustrar o que pretendemos mostrar, elencaremos alguns produtos segundo a segmentação proposta.
(i) Complementar: molho de tomate - usualmente consumido como complemento para uma série de alimentos, mas nunca usado sozinho.
(ii) Único: chocolate - costuma ser degustado na maioria das vezes sem nenhum tipo de acompanhamento.
(iii) Complementar + único: café - pode ser misturado a outras bebidas, ser bebido puro ou ainda acompanhar o café da manhã.
Evidentemente, quanto maior a possibilidade de consumo, maiores as chances de aquisição. Diante dessa realidade, é provável que a Pepsi tenha atentado para essa condição e investido na oportunidade. Corrobora para essa suposição, o fato de a empresa ter incorporado à campanha do "Better with Pepsi" a menção à sua utilização no drinque Cuba Libre, ou seja, como complemento ao rum. 
No meu modo de ver, tal iniciativa apresenta enorme potencial de sucesso, até porque há espaço para inúmeras composições, podendo derivar, inclusive, para ações de co-branding.
Entretanto, vale alertar que, mesmo promissora, a estratégia requer atenção para evitar que as múltiplas utilizações não venham a fazer com que o produto perca sua identidade como categoria. Claro que no caso da Pepsi, as chances de isso acontecer são ínfimas, isso para não dizer inexistentes. O alerta, na verdade, é meramente conceitual, visto que pode efetivamente ocorrer com outros produtos com marcas menos consolidadas.
Vem à mente, como forma de explicitar o alerta acima, o Leite de Rosas, produto que teve seu auge no passado, mas que, diante de tantas utilizações - perfume, demaquilante, desodorante etc. – perdeu sua identidade, o que redunda na própria indefinição do varejo quanto à sua localização na área de vendas, acarretando situações nocivas para o produto, as quais vão desde a convivência com marcas mais poderosas em alguma categoria (oceano vermelho) até a dificuldade de ser encontrado pelo cliente no ponto de venda.
Para concluir, não podemos esquecer-nos de mencionar que na década de 90, o publicitário Washington Olivetto desenvolveu uma campanha para o Guaraná Antarctica, na qual já explorava a complementariedade do refrigerante com pizza e pipoca.





terça-feira, 15 de agosto de 2023

Os conflitos de Diniz

A escolha de Fernando Diniz, técnico do Fluminense, para ser o treinador da seleção brasileira de futebol tem provocado bastantes discussões, as quais giram não só sobre a capacidade do bicampeão carioca, como também de um possível conflito de interesses.
Particularmente, acho o profissional muito bom e cada dia mais preparado para o cargo, porém, como a proposta do blog é provocar o debate sobre marketing e gestão, vamos explorar o citado conflito.
Alguns alegam que o técnico tricolor pode vir a convocar um jogador do time adversário com o intuito de desfalcá-lo e assim favorecer o seu clube em alguma rodada do campeonato. Óbvio que a situação é factível, porém, tendo a acreditar que muito improvável no caso do Fernando Diniz, visto já ter demonstrado inúmeras vezes uma conduta exemplar em termos de honestidade.
Vale lembrar que no voleibol, o técnico Zé Roberto dirigiu tanto a seleção como clube e nenhum tipo de suspeição foi levantada.
Claro que nem todos os técnicos são iguais em termos de caráter e, no caso de um treinador sem tanto apego aos princípios, a situação narrada, pode, de fato, implicar em problemas.
Ainda que a escolha de profissionais deva contemplar a avaliação dos soft skills (habilidades psicossociais de um indivíduo), é costumeiro, principalmente no futebol, focar apenas nos hard skills (habilidades profissionais mais tangíveis), o que dá margem para a contratação de pessoas que possam tirar proveito das situações conflituosas.
Na verdade, as possibilidades de conflitos no caso de técnicos de seleção são ainda maiores. É viável, por exemplo, um treinador convocar jogadores com o objetivo de valorizá-los e ser remunerado por isso.
Saindo do esporte, o que pensar de um médico que é remunerado pela indústria farmacêutica? Será que esse fato influenciará na prescrição dos medicamentos? E os juízes que são convidados como palestrantes em congressos financiados por empresas? Podemos incluir aqui os profissionais que, ao serem contratados através do auxílio de Head Hunters, mantém esses prestadores de serviços depois de contratado.
Então quer dizer que o médico não pode receitar os mencionados medicamentos em função de sua relação com a indústria? O juiz não pode disseminar seu saber e sua experiência? O Head Hunter deve ser trocado após efetuar uma contratação? Evidente que não!
Todas as possibilidades descritas podem ocorrer, todavia, devem ser regidas por normas de governança e compliance, que deem tranquilidade ao contratante e ao contratado.
A preconizada atenção ao compliance se faz cada vez mais urgente nos dias atuais, quando interações e engajamentos são incentivados e vitais para o sucesso, o que implica no aumento das situações de conflito. 
Apostar numa reversão dessa situação parece utópico, principalmente em um cenário onde o número de pessoas que optam por obter vantagens abdicando-se dos princípios e valores também parece crescer, principalmente em algumas regiões.
Dessa forma, mais importante do que apontar conflitos e nada fazer, é prevê-los e minimizar os riscos.






terça-feira, 8 de agosto de 2023

Private equity no futebol

Sendo os fundos de private equity uma modalidade de investimento na qual os investidores adquirem participações em empresas que ainda não possuam o capital aberto, surge uma dúvida no que tange ao futebol: os clubes que se transformaram em sociedade anônima – SAF -, seriam uma boa opção de investimento para esses fundos?
Para responder a essa pergunta, é preciso lembrar que os investidores aportam o dinheiro com o intuito de que esse se valorize depois de algum tempo para depois revenderem suas respectivas participações.
Deriva daí outro questionamento: um clube de futebol deve dar lucro?
Não creio, até porque os resultados esportivos são fundamentais para a geração de receitas e consequente valorização do ativo. Portanto, nada mais óbvio do que utilizar os eventuais lucros para reforço do time, formação de jogadores e equacionamento de eventuais dívidas.
A possibilidade de investir no clube para sua valorização evidentemente existe, mas nesse caso é aconselhável não se criar grandes expectativas esportivas e combinar isso com os torcedores.
Além do que, ao contrário de uma empresa cujos resultados são mais fáceis de estimar, no futebol, ainda que haja alguma correlação com o investimento, há situações imponderáveis.
Quantas vezes vimos a Coca-Cola, por exemplo, ter uma participação de mercado menor do que alguma tubaína? Nunca vi!
Por outro lado, quantas vezes vimos um time de poucos recursos vencer um favorito? Poucas, mas acontece.
Pois é...
Outro ponto de atenção diz respeito ao resultado operacional dos clubes, cujos custos com a remuneração dos jogadores comprometem parte expressiva da receita, isso quando não ultrapassa. Exemplos não faltam, não é mesmo?
E as receitas com venda de jogadores? De fato são bem significativas em grande parte das vezes, porém não apresentam recorrência.
Será que um investidor ficará seduzido em aportar verba em um negócio cuja previsão de receitas é instável por natureza? Ao contrário de uma empresa cujos produtos dependem da demanda do mercado, os clubes dependem tanto da demanda quanto da atratividade do produto, no caso os jogadores a serem vendidos. Não esquecendo que a venda desses certamente impactará o desempenho esportivo.
Mas para o clube a entrada de um fundo seria bom! De fato, assim pensa a maioria dos torcedores, a esses cabe também uma pergunta: por que será bom?
Se for pelos recursos aportados, pode até ser, mas nunca esquecendo que os fundos têm como objetivo a valorização do ativo para poderem remunerar os investidores que ali aportaram. Ainda que vitórias ajudem para se alcançar o intento, essas não se constituem a prioridade dos fundos.
Se for pela provável melhor governança, vale lembrar que muitas empresas, se envolvem em escândalos, mesmo tendo supostamente rígidos processos internos.
Por fim, é importante esclarecer que, embora o artigo tenha jogado luzes nos desafios que existem para se gerir um clube como empresa, ele de forma alguma preconiza que as áreas de investimentos dos fundos devam concluir por um “no go” às propostas de aporte em clubes de futebol. 
Na verdade, esse tipo de operação pode vir a ser bem interessante, desde que as expectativas estejam ajustadas, principalmente por parte dos torcedores que pouco se importam com o lucro de quem investiu.
Diante desse contexto, os clubes com histórico vitorioso podem não ser o melhor alvo.





terça-feira, 1 de agosto de 2023

Lojas físicas, o retorno!

Com o surgimento do comércio eletrônico e o crescimento de grandes empresas do setor, muitas pessoas, inclusive supostos gurus em gestão, vaticinaram que as lojas físicas iriam acabar.
Na pandemia, então, a previsão se tonou uma verdade absoluta.
Gráficos e rankings comparativos com a evolução do número de lojas realmente mostravam queda  em alguns setores, porém, desprezavam as situações de fusões e aquisições que impactavam esses números.
As argumentações contrárias que evocavam a necessidade de integração entre canais (omnichannel) e a importância da loja física como fator de fundamental importância para a distribuição, exposição e experiência do cliente eram solenemente ignorados sabe-se lá por qual razão. Não cabe aqui especular.
Nada como o tempo!
Hoje, além do silêncio dos futurólogos, é possível notar um movimento das marcas pelo que chamam de share of life, que seria a participação de tempo que as pessoas dedicam a algo. 
Uma competição talvez até mais difícil do que a que se trava pelo mercado (share of market) e pelo orçamento (share of wallet), já que o tempo é inexorável, são sempre 24 horas por dia.
Daí a busca não apenas pela atenção, mas também por manter o cliente mais tempo nas lojas e shoppings, pois, dessa forma se aumenta a probabilidade dele consumir e gerar receita para os estabelecimentos. 
Antes de passarmos para alguns exemplos que comprovam essa tendência, vale destacar que a citada busca por manter o cliente no ponto físico precisa considerar aspectos ligados à lucratividade e à precificação. Essa observação se faz importante, pois há negócios como restaurantes fast food, por exemplo, onde o “giro” do consumidor é condição vital para os resultados operacionais.
Feita a observação, citaremos a seguir algumas marcas atentas à disputa pelo share of live
- A Lululemon, varejista de origem canadense de roupas esportivas, está disponibilizando aulas de yoga em algumas de suas lojas.
- No segmento de brinquedos, a Camp aproveita a área de suas lojas para festas de aniversário e cursos para crianças. Cerca de 40% de suas receitas já advém de serviços.
- No setor de beleza, a Ulta Beauty instalou salões de beleza nas lojas.
- A Starbucks Reserve do Empire State em Nova York oferece salas de reuniões que comportam até telas de projeções para os clientes.
São inúmeros os exemplos, poderíamos incluir entre eles os supermercados, livrarias e lojas de departamento, entre outros, que incorporaram restaurantes e cafeterias em seus espaços.
Ainda que a adesão a esse movimento esteja se dando mais fortemente nos dias atuais, devemos lembrar que no passado algo parecido ocorreu no setor de combustível, no qual os postos de gasolina se transformaram em postos de serviços com a incorporação de lojas de conveniência, negócios complementares e outras funcionalidades como troca de óleo.
Dito isso, alertamos para que os ávidos por “previsões” não venham a decretar o fim do e-commerce como plataforma de polêmica.




terça-feira, 25 de julho de 2023

Fake reviews

Com o advento da internet, o fator “recomendação” passou a ter uma importância muito grande no processo de escolha do que e de quem será comprado.
Essa afirmação pode ser corroborada através das áreas reservadas a reviews (opiniões sobre produtos, experiência na jornada de compras e vendedores) nos sites de comércio eletrônico.
Além dos testemunhais que servem para embasar os processos decisórios, a quantidade de reviews faz com que o site se posicione melhor nos processos orgânicos de buscas no Google e aumente o tempo de permanência nas páginas.
Pesquisa realizada pelo Instituto Reclame Aqui aponta que 90% dos clientes leem os reviews antes de se decidirem pela compra. Outro levantamento feito pela Ebit/Nielsen identificou que 92% dos consumidores confiam mais nos reviews do que nas propagandas das marcas. 
Devido a todas essas vantagens apontadas acima, muitas empresas passaram a incorporar reviews falsos com o intuito de aumentar os benefícios que apontamos e minimizar eventuais críticas que possam de alguma forma atrapalhar suas vendas, induzindo, assim, os consumidores ao engano.
Reitero que aqui faço referência às opiniões que tenham por trás as próprias empresas, isto é, os vendedores que, através de sua equipe ou de forma terceirizada, emitem elogios, contestam as críticas sem se identificarem e oferecem vantagens para que os críticos “retirem” os reviews negativos.
Se no curto prazo essa prática pode se reverter numa imagem positiva, no médio e longo as consequências chegam não apenas através de um provável maior número de trocas e devoluções, como também de uma enxurrada incontrolável de críticas.
A propósito, algumas pesquisas feitas com clientes do setor hoteleiro apontam que avaliações falsas diminuem a taxa de conversão. Nesses estudos, se infere como avaliação falsa a da empresa que obtém nota máxima e nenhuma crítica.
Creditar tal prática à banalização em relação às fake news que tomam conta do mundo atual, pode até ser ventilado, aliás, seria interessante ouvir a opinião dos que minimizam as mentiras, mas por outro lado, são enganados por reviews falsos.
Creio, no entanto, que a causa dos reviews mentirosos esteja mais associada ao desconhecimento acerca do que vem a ser marketing, muitas vezes confundido como uma arte de iludir. 
Coitados, mal sabem que o principal atributo de uma marca é sua credibilidade e que informações bem trabalhadas, inclusive críticas, são insumos importantes para a elaboração de plano de ações.





terça-feira, 18 de julho de 2023

NPS, uma métrica de satisfação

 
Criado em 2003 pela Bain & Company, NPS é a sigla de Net Promoter Score, um método que as empresas utilizam para mensurar a satisfação dos seus stakeholders, principalmente clientes e colaboradores, porém, não se restringindo a eles.
A metodologia, bastante simples e de fácil aplicação, se resume basicamente a uma pergunta: em uma escala de zero a dez o quanto você indicaria nossa empresa para alguém? 
As notas nove e dez classificam o respondente como um promotor do que está sendo avaliado.
Supostamente, estão satisfeitos, devem se manter fiéis e realmente devem recomendar a empresa.
Já os que avaliam com notas sete e oito são considerados neutros, ou seja, podem não recomendar, mas também não devem tecer opiniões que venham a prejudicar.
Todavia, aqueles que dão notas de zero a seis são denominados como detratores e apresentam alto potencial de risco para a marca.
O cálculo para se chegar ao NPS acontece fazendo a subtração da quantidade de promotores pela de detratores, dividindo o resultado pelo número dos que responderam e multiplicando esse valor por 100 para se chegar ao percentual, conforme fórmula abaixo.
Supondo, por exemplo, que num universo de 200 pessoas entrevistadas, 40 deram notas nove ou dez, ou seja, são promotores. Um contingente de 150 respondentes avaliou com notas sete ou oito, enquanto 10 concentraram suas avaliações entre notas zero a seis. Temos assim:

promotores - detratores=   40 – 10 = 30    
total de respostas = 200 
30/200 = 0,15 
0,15 x 100 = 15% 

Índices acima de 75% são considerados excelentes, os que ficam entre 50% e 74% como muito bons, os situados entre 0% e 49% entram na relação de razoáveis, enquanto os negativos são vistos como ruins.
Como acontece em pesquisas online, existe uma grande possibilidade de muitas pessoas não responderem ao questionário de NPS, nessa situação penso ser mais adequado não considerá-las no cálculo, embora algumas empresas, cuja base de respondentes seja pequena, tendam a incorporar os “não respondentes” aos neutros, talvez achando que a razão para se eximirem seja a neutralidade.
A demonstrada facilidade de aplicação do NPS faz com que muitas empresas utilizem o método, o qual acaba se tornando quase que uma unanimidade em termos de aceitação.
Além do NPS, outras metodologias de relativa simplicidade podem ser utilizadas para se apurar a satisfação, entre as quais estão:
CSAT - Customer Satisfaction Score, a qual não tem uma pergunta específica, cabendo ao responsável pela pesquisa optar pela que pareça mais adequada, algo do tipo: “como avalia os nosso atendimento”, “quão satisfeito ficou com o serviço prestado” etc. 
CES - Customer Effort Score, mais voltado à avaliação de quanto que o consumidor/cliente despende de esforço para interagir com a empresa, podendo ser aplicado a diversas fases da jornada de compras.
CEV - Customer Emotional Value, é um pouco mais complexo do que os demais, pois mede as emoções que a marca desperta no cliente confrontado pares de sentimento do tipo: triste e feliz.
Independentemente da metodologia escolhida – nenhuma é perfeita e todas são úteis, que se registre - o que importa realmente é a forma como os resultados serão tratados, como serão analisados e quais medidas serão adotadas.
O que quero dizer com isso é que pouco adianta ter um índice, seja ele qual for, se não forem investigadas suas causas e não se trabalhar para o aprimoramento.






terça-feira, 11 de julho de 2023

Minha dor é perceber

O filme produzido pela AlmapBBDO para a Volkswagen em razão da comemoração dos 70 anos da montadora no Brasil https://m.youtube.com/watch?v=aMl54-kqphE , ganhou uma proporção que, muito provavelmente, não estava nas expectativas da agência, tampouco da marca alemã. 
Na verdade, pelo inusitado dos recursos utilizados, era de se supor que surgiriam discussões sobre a Inteligência Artificial, as quais ganharam um bom espaço na mídia e rendem boas argumentações. 
Reproduzir a cantora Elis Regina dirigindo e cantando com sua filha, a também cantora Maria Rita, que mal a conheceu, mexe demais com a emoção, ainda mais com imagens que remetem ao passado através de carros. Confesso que, ao ver o filme, não resisti à tentação de, pelo menos em meus pensamentos, reproduzir a imagem do meu pai dirigindo ao meu lado. Saudades...
Pois bem, em vista desse sentimento, não tenho a devida isenção para avaliar a utilização desses recursos, mesmo ciente de que, assim como pode ser usado para coisas bem legais, o inverso também pode ocorrer, daí a necessidade de se impor alguns limites e regras. Não sei, pelo menos no momento, quais seriam eles, razão pela qual não vou me estender nessa análise.
Contudo, outro ponto suscitou discussões e críticas até mais pesadas: a utilização da cantora interpretando a música do cantor Belchior para publicidade de uma empresa que apoiou o regime militar e a ditadura, sendo que ambos os artistas eram contra tal regime.
Primeiramente, deve ficar claro que os gestores que lideravam a Volkswagen na época é que eram a favor do golpe militar, o que não significa dizer que até hoje exista tal apoio. 
Mas mesmo que haja ainda uma comprovada simpatia da marca alemã, digo, dos atuais gestores, pelo sistema totalitário, tudo é possível, cabe aos potencias consumidores simplesmente decidirem se querem adquirir ou não algum produto da empresa. Vale, no entanto, alertar que eventuais boicotes de consumo acabam se refletindo também em desligamentos de colaboradores, sendo que muitos destes mal sabem a diferença entre democracia e ditadura e dependem do emprego para sustentarem suas famílias.
Já no caso de não haver mais nenhum resquício de apoio ao golpe por parte da Volkswagen, a situação fica ainda mais grave, pois fica caracterizada a apologia de uma pena perpétua em função dos atos de dirigentes do passado. Seria mais ou menos como decretar a prisão de um bebê recém-nascido pelo fato de o avô ter sido um torturador.
Parafraseando a letra da música que serve como trilha do filme em discussão: "minha dor é perceber" que as pessoas estão abdicando do entendimento do conteúdo da peça publicitária para achar pontos passíveis de serem polemizados. 
Qualquer campanha de marketing tem como motivação a busca pela satisfação de algum objetivo mercadológico, os quais, simploriamente falando, podem se destinar à comunicação de um novo produto, a um incremento de vendas, ao fortalecimento de uma marca, ou até a comemoração de algo – 70 anos é um exemplo -, entre outros. Se os objetivos serão alcançados, muitos fatores precisam ser satisfeitos, dentre esses estão o conteúdo (mensagem) e a mídia (meio) com as mais diversas derivações. Aqui deveria acabar a discussão técnica sobre a campanha.
Até porque, se houver alguma peça que fira às leis e regulamentações, há órgãos como o CONAR (Conselho Nacional Auto Regulamentação Publicitária) para atuar, assim como diversas esferas jurídicas para se recorrer. 
Opinar se gostam ou não da campanha, é ótimo, pois a geração de bons debates é sempre salutar, dentro, é claro, de um padrão de respeito, o qual permite avaliar a devida credibilidade dos debatedores. 
O que não se pode aceitar é a transferência para o campo do marketing de discussões polarizadas, que nada agregam à questão. 






terça-feira, 4 de julho de 2023

Quanto custa um cliente?

Com o crescimento da comunicação digital, a qual diferente da offline permite um maior controle das ações, a busca por métricas que auxiliem na avaliação dos investimentos é um exercício constante.
Dentre essas, o CAC, sigla que significa Customer Acquisitions Cost ou Custo de Aquisição de Clientes, tem sido a mais utilizada, pois, além de coerente, tem um cálculo bastante simplificado.
A métrica busca estimar o investimento direto realizado para adquirir novos clientes, ou seja, quanto está sendo gasto com marketing e vendas, o que inclui salários com os colaboradores dessas áreas, bônus, comissões, ferramentas de CRM, campanhas, mídia, eventos, treinamentos e viagens, entre outros. O processo de aquisição contempla toda a jornada de compras, a qual vai desde a geração de leads até o efetivo fechamento da compra.
Entendido o conceito, chegamos a seguinte equação:
CAC = (investimento em Marketing + investimento em Vendas) / número de novos clientes.
É importante ressaltar que o CAC deve ser apurado para um período a ser determinado, contudo, o mais recomendável para efeito de controle e eventuais correções de percurso é a adoção de uma frequência mensal.
Não se pode ter a pretensão, no entanto, de concluir que tal métrica seja um termômetro perfeito da real situação da empresa, visto apresentar falhas, entre as quais citamos:
É sabido que um eventual aumento no quadro comercial não traz reflexo imediato no volume de vendas, ou seja, nessa situação os gastos devem subir em um primeiro momento numa proporção maior do que as vendas, o que não significa dizer que o investimento está sendo ruim;
Num cenário em que a concorrência esteja com ações mais agressivas – maiores investimentos naquele período – as vendas das demais empresas provavelmente não serão tão boas. Esse panorama nos permite concluir que não basta ter um aumento em termos absoluto nos investimentos, caso esse, no âmbito relativo seja inferior à media do que o mercado esteja praticando. 
Algumas campanhas, inclusive as de cunho institucional, deixam um residual cujos frutos não serão colhidos necessariamente no período de sua execução, o que faz com que o CAC seja alterado por investimentos “indiretos”, mas que não são fáceis de expurgar no cálculo.




terça-feira, 27 de junho de 2023

Hoka - uma estratégia de sucesso

Alguém já ouviu falar na marca de calçados esportivos Hoka? Provavelmente poucos, mas vale conhecer a respeito, principalmente em função da estratégia mercadológica utilizada, a qual reputo como excelente.
Criada em 2009 por Jean-Luc Diard e Nicolas Mermoud, a Hoka surgiu em função do entendimento de que os aspectos tecnológicos não eram explorados em sua plenitude pelas marcas de calçados esportivos. 
A partir dessa identificação de oportunidade, os dois fundadores buscaram desenvolver um produto investindo fortemente em inovação e abrindo mão até da estética. 
Embora a trajetória da marca traga inúmeros fatos interessantes, vamos pular para 2012, quando a Deckers comprou a Hoka.
Os valores envolvidos na aquisição não foram divulgados, mas sabe-se que a Hoka tinha na época um faturamento anual de US$ 3 milhões.
Ao contrário do que costuma acontecer nas operações de M&A (fusões e aquisições) que envolvem marcas com elevado potencial de crescimento, a Deckers conseguiu resistir à tentação de promover um processo de expansão veloz, optando por um desenvolvimento planejado. 
A possibilidade de uma distribuição mais agressiva foi descartada, o que deixou o produto, evidentemente, fora dos grandes varejistas. 
Ilustra essa condição, o fato de a empresa antes da pandemia ter recusado a oportunidade de estar nas lojas da Foot Locker, uma referência no setor. Situação similar aconteceu na Dick’s Sporting Goods, onde, a Hoka, antes de estar presente em 100% das lojas da rede, executa testes em poucas lojas para entender o comportamento da demanda e, dessa forma, não “queimar” a marca.
Ao invés de estar acessível a todos, a marca optou por estar nos locais voltados ao que entendia ser seu público-alvo, processo no qual as vendas diretas tiveram substancial importância.
Entre as razões que levaram a essa estratégia, destacamos:
  • criar a sensação de ser um produto para poucos. Para isso se utilizou do conceito que chamamos de marketing de escassez, no qual, no caso da Hoka, mais do que provocar o senso de urgência e incentivar a compra imediata, fez com que a marca ficasse associada a algo com o cunho de "exclusivo".
  • ter um melhor controle sobre os preços praticados, visto que a baixa disponibilidade/oferta propicia melhores condições para se estabelecer um posicionamento premium com reduzido risco de eventuais promoções por parte do varejo.
  • fortalecer a identidade da marca, proporcionando condições de se criar uma liderança de conceito na mente do seu público-alvo, liderança que, naturalmente, chegará a uma gama maior de pessoas, principalmente através do boca a boca. 
Evidentemente, como citamos no início, há uma preocupação grande com o desenvolvimento do produto e seus aspectos tecnológicos , afinal de contas, a busca por um crescimento sustentável carece de um bom marketing, o qual se beneficia quando lida com bons produtos/serviços. 
Desse modo, podemos concluir que a estratégia da Hoka nos fornece um excelente benchmark ao mostrar que a visão de longo prazo é fundamental para uma boa gestão.
Corrobora para essa conclusão a evolução das receitas da marca: em 2017, cinco anos após a aquisição pela Deckers o faturamento ultrapassou os US$ 100 milhões, já no último ano fiscal, finalizado em 31 de março de 2023, atingiu US$ 1,4 bilhão.

terça-feira, 20 de junho de 2023

Marketing em cartéis

Como acontece no mercado automotivo, os lançamentos de produtos esportivos costumam acontecer numa frequência que permita o consumo recorrente não apenas por uma questão de desgaste do produto anterior, mas também para manter o cliente "atual".
Importante frisar que essa atualização não diz respeito apenas à inovação técnica, visto que essa costuma ser menos perceptível para grande gama dos consumidores.
As camisas de clubes de futebol exemplificam bem esse processo de “atualização”, pois, mesmo respeitando as cores de cada equipe, novos modelos são lançados a cada temporada.
Contudo, se não bastasse esse incentivo relacionado à “atualização” como forma de geração de valores, as três grandes marcas: Adidas, Nike e Puma anunciaram aumentos nos preços das réplicas das camisas dos clubes europeus que vestem/patrocinam para a temporada 2023-24.
O aumento dos custos em função da guerra entre Rússia e Ucrânia embasam as justificativas dos aumentos, os quais apresentam percentuais diferentes entre as marcas, fatos que afastam qualquer suspeita de cartelização, todavia, vale aqui explorar o tema a título de provocar a reflexão sobre o assunto e suas implicações no mercado.
O que vem a ser um cartel? Sem descer às definições jurídicas da prática, podemos conceituar o cartel como um processo de cooperação entre empresas, de forma a facilitar o controle do mercado através da imposição de preços, o que, além de trazer impactos ao cliente, seja o varejista ou o consumidor, prejudica também a concorrência.
Embora a “combinação de preços” seja a faceta mais comum dos acordos de cartel, há também a divisão de clientes e mercados entre os participantes, algo na linha de estabelecimento de regiões e canais de atuação.
Para os gestores de marketing, a prática, quando se restringe apenas à “combinação” do preço não difere do cenário em que os preços são tabelados, o que faz com que sobrem apenas três dos quatro Ps para serem trabalhados - produto, ponto e promoção.
Essa situação nos remete ao mercado de distribuição de derivados de petróleo até os anos 90 no Brasil, quando os produtos eram os mesmos, o preço máximo tabelado e havia um fornecedor único (isso não mudou). Imaginem o quão desafiador era esse cenário para os gestores de marketing, que tinham que direcionar seus esforços na prospecção e retenção de bons pontos, na incorporação de serviços que deixassem menos desagradável o ato de abastecer, no posicionamento e na divulgação da marca.
Já quando há também o “acordo” em relação às áreas de atuação, gerando uma espécie de reserva de mercado, a gestão de marketing fica ainda mais difícil, pois remete o mercado a quase que uma situação de monopólio, todavia, ainda assim o marketing é de fundamental importância para combater os concorrentes indiretos.
Antes de finalizar o artigo, deve ficar bastante claro que há uma enorme diferença entre cartel e relacionamento entre concorrentes. Enquanto o primeiro é considerado crime contra a ordem econômica no Brasil, o segundo, caso tenha um cunho de trocar experiências sobre fornecedores e clientes, pode trazer benefícios e até combater eventuais “cartéis” que possam estar surgindo no outro lado mesa de negociação, o qual pode ser ocupado pela indústria ou pelo varejo.