terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Identidade Corporativa

Para a grande maioria dos leitores do blog, principalmente os que não acompanham o futebol mundial, o nome Ralf Rangnick deve soar como desconhecido, porém, é bom que se saiba que ele é tido por muitos como um dos grandes mentores do futebol alemão devido a sua capacidade em estudar e inovar a modalidade em termos de tática.
Aos que gostam de ver o esporte sob essa ótica, vale buscar matérias sobre o citado treinador/gestor. Todavia, por termos este espaço voltado à gestão, utilizaremos uma de suas convicções sobre o futebol para desenvolver um tema que julgo de extrema relevância: a identidade corporativa.
 A analogia a esse tema foi feita por parte do próprio Rangnick, que preconiza que a primeira etapa do processo da formação de um time passa pela definição do estilo de jogo, aqui por ele comparado à identidade corporativa das empresas.
Pois bem, mas o que vem a ser “identidade corporativa”? De maneira bem simplória, podemos defini-la como a forma que uma empresa se diferencia da outra em função de sua essência e, assim, vem a ser percebida por clientes, colaboradores, fornecedores e mercado em geral.
Mas como isso acontece? Aqui é importante ter claro o processo de construção de uma marca, o qual é constituído por três pilares:
  • Definição do negócio – o que é efetivamente oferecido pela empresa;
  • Posicionamento – que lugar a marca ocupa na mente das pessoas e como ela é percebida, ou seja, como seus valores são passados e reconhecidos. Aqui geralmente um slogan serve para, de forma sucinta, traduzir o que ela pode entregar. Há pesquisas que apontam que mais de 60% dos consumidores elegem os valores da marca como o atributo principal de escolha.
  • Proposta de valor – qual benefício é entregue, isto é, como o bem ou serviço satisfaz a necessidade do cliente e, principalmente, quais os diferenciais e vantagens sobre o que o mercado oferece.
Faz-se importante reforçar que, apesar de os clientes externos terem grande importância nesse processo, os demais stakeholders, como colaboradores e acionistas, por exemplo, fazem parte do público que se visa para a criação de uma identidade.
Nesse contexto, Kotler, uma das maiores, se não a maior referência em marketing, elenca quatro situações no que tange à identidade corporativa:
- identidade subposicionada – os stakeholders não têm uma ideia clara acerca da marca;
- identidade superposicionada – quando a imagem é focada;
- identidade confusa – a imagem é ambígua e não há planejamento no sentido de se posicionar.
- identidade duvidosa – não passa a devida credibilidade.
Para não deixar o artigo muito teórico, convido os leitores para executarem um pequeno exercício sobre o tema, fazendo um simples questionamento: a empresa em que trabalham ou o time que torcem busca atrair, colaboradores/jogadores, torcedores/clientes de acordo com algum padrão de identidade definido?
Ainda que não tenha acesso às respostas, é possível arriscar que no caso de empresas exista uma quantidade pequena de respostas positivas, contudo, ainda melhor do que no caso de times de futebol, onde as pessoas escolhem por quem torcer influenciado por familiares, resultados e ídolos, sendo que os dois últimos são bastante instáveis.
Se entrarmos no mérito do padrão de jogadores de cada equipe, veremos um cenário mais sombrio, visto as contratações terem como norte as avaliações técnicas e a capacidade de investimento, pouco se importando se tais peças se encaixarão dentro de algum padrão definido, o qual, se houver, dificilmente será mantido por um prazo que permita considerá-lo como uma identidade.
Tal quadro ajuda a aumentar a diferença de resultados entre as organizações, sejam elas esportivas, corporativas, ou mesmo governamentais.



terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Na contramão do marketing

O conturbado momento pelo qual passa o mundo em função da pandemia, além de privar as pessoas das atividades que normalmente desempenhavam no passado, tem trazido reflexos para as áreas de marketing das empresa, principalmente no que tange à realização de eventos.
As restrições impostas pelas autoridades, aliadas às campanhas para se evitar as aglomerações, estão exigindo das marcas bastante criatividade para estarem presentes aos públicos que elegem como alvo.
Por mais que outras ações ajudem no fortalecimento institucional, tais como as doações voltadas ao combate da pandemia, há, sem dúvida, a necessidade de se estar perto dos olhos e mentes dos consumidores, inclusive como forma de integrar os esforços institucionais.
Assim como a população está ávida para poder voltar ao normal - o qual não é velho nem novo - as marcas também querem colocar em prática as iniciativas de marketing planejadas, visto estas fazerem parte de um plano de ação voltado ao atingimento das metas estabelecidas.
Temos visto muitas empresas acompanhando a situação da pandemia e, baseadas nela, realizando mais ações virtuais do que presenciais, equacionando assim suas necessidades de marketing com o respeito ao momento.
Outras, infelizmente, optaram por produzir eventos que, talvez, agradem aos que deles participem, mas que vão ao sentido contrário do bem da sociedade.
Exemplifica esse tipo de postura a ação que a Red Bull realizou sábado passado – 19/dez/20 – ao colocar estacionado um veículo com DJ e promotores distribuindo seus energéticos no Parque Nacional da Tijuca, local considerado como um verdadeiro paraíso para a prática de atividades físicas.
O ponto escolhido para a ação não poderia ser melhor, pois fica exatamente ao final dos trechos mais difíceis, onde geralmente os corredores e ciclistas param para esperar os colegas de treino e/ou contemplar a vista. Que vista! Assim, nada mais agradável do que receber gratuitamente uma bebida gelada ao som de música ao final de um desafio, lembrando que durante o percurso a opção de se comprar alguma bebida é quase nula.
Sem entrar novamente no mérito do incentivo à aglomeração, deve ser acrescentado à narrativa que o acesso ao local está proibido para veículos motorizados. Dessa forma, a menos que o citado veículo tenha sido abastecido com o energético que, segundo a publicidade da marca, dá asas para quem bebe, ficamos diante de uma situação em que o motorista se aproveitou do horário sem vigilantes para entrar no parque.
É difícil acreditar que uma empresa tão bem reconhecida no que tange ao marketing e que conseguiu transformar sua marca em um estilo de vida, tenha sido capaz de cometer tais desrespeitos. A hipótese de ser uma atitude negacionista dos gestores não me parece razoável, sendo mais aceitável supor que tenha sido uma ação isolada e sem a anuência dos responsáveis pelo gerenciamento estratégico da marca, o que minimiza o problema quanto à avaliação da excelência da área de branding, mas deixa evidente que os processos de delegação e/ou contratação precisam ser aprimorados.
Com os votos antecipados de um Feliz Natal, desejo a todos muita paz e respeito à vida.








terça-feira, 15 de dezembro de 2020

As cores da quadra

A mais recente ampliação do contrato entre a Confederação Brasileira de Voleibol e o Banco do Brasil contemplou o direito à nominação (title sponsor) da Superliga, principal competição da modalidade no país.
Vinte e quatro novos pisos foram comprados, todos nas cores da marca – amarelo e azul – fato que deixará todas as competições nacionais de voleibol com esse “cenário”.
Já na estreia do novo piso, as opiniões nas redes sociais ficaram divididas. Alguns elogiaram a mudança, enquanto outros a criticaram alegando que a visibilidade ficou prejudicada. Há ainda os atletas que se queixaram do material do piso, tanto pela maior "aspereza" como pelo fato de não propiciar uma boa visibilidade dos trechos que estejam molhados, o que aumenta o risco de escorregões e quedas.
Creio que tenham ocorrido testes acerca desses fatores, de forma que as eventuais críticas sejam fruto do impacto inicial da mudança, ou melhor, da falta de costume. Trazendo para o ambiente de varejo, é muito comum se dizer que faltam produtos em um supermercado que está sendo visitado pela primeira vez, visto o desconhecimento daquele layout.
No que tange ao marketing, as discussões também aconteceram, tendo aqui como tema a preocupação com o aumento da associação da marca à modalidade, que tem o banco como patrocinador desde 1991.
Vale citar que o Banco do Brasil tem sido um ótimo exemplo de como utilizar o esporte como ferramenta de marketing, visto trabalhar não apenas a exposição, mas também a ativação e a associação da marca.
Voltando à preocupação emanada pelos que criticaram a ação, concordo que, conceitualmente, a associação deixa a confederação fragilizada para a busca de novos patrocinadores, pois, esses ao conviverem no mesmo espaço que o banco não serão tão percebidos. No caso de uma eventual rescisão na relação com o Banco do Brasil, haverá certamente uma demora maior para que um novo patrocinador venha a conquistar um recall expressivo.
No passado, receosos dessa “dependência”, houve até uma tentativa de se mudar as cores dos uniformes da seleção. O do masculino seria preto e o do feminino teria o rosa como cor principal, proposta que não foi adiante.
Todavia, no caso do piso, achei a iniciativa excelente, pois, se criou uma nova propriedade de alto impacto visual, que pode ser alterada para outras cores, cores até de outro patrocinador.
Se foi um movimento estratégico ou fruto de uma mera negociação comercial e suas contrapartidas é difícil precisar, mas há que se reconhecer que ambas as partes ganharão com a iniciativa. O patrocinador conseguirá fixar ainda mais a sua marca de forma elegante, sem poluição, ao passo que o patrocinado ganhará uma nova propriedade para seu portfólio, a qual tende a ser valorizada, tamanha sua visibilidade, além dos comentários que estão sendo gerados.



terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Marcas esportivas no futebol 2020-2021


O mais recente estudo realizado pela Jambo Sport Business acerca das marcas que vestem os clubes da 1ª divisão dos 20 principais países acaba de ser publicado, podendo ser acessado através do link https://pt2.slideshare.net/jambosb/marcas-esportivas-nas-20-principais-ligas-20202021
Devido à robustez do trabalho, usaremos esse espaço para citar apenas alguns dos inúmeros pontos que constam no material. 
O somatório das três principais marcas globais - Nike, Adidas e Puma - ficou com uma participação maior do que no ano anterior 47,5% vs. 45,8%. Esse crescimento não significa que o movimento anteriormente percebido de “investimentos mais criteriosos” por parte destas marcas, onde o retorno comercial passou a ter um peso mais importante do que a mera exposição da marca, tenha sido revisto. Na verdade, as causas da situação atual parecem estar relacionadas a uma maior conscientização dos clubes quanto à mudança do mercado, o que fez com que passassem a aceitar formatos de negociação rejeitados em um primeiro momento. Além disso, os eventuais problemas e frustrações com fornecedores de menor porte também têm sua parcela influência nesse quadro. 
Vale notar que a participação dessas marcas globais na Europa atingiram 46,4%, enquanto que na América do Sul somaram 21,9%. A propósito, excetuando 2014/15 – certamente influenciado pela Copa do Mundo realizada no Brasil – o percentual delas nesta região nunca ultrapassou os 30%. 
No que diz respeito à performance das marcas individualmente, a Nike se manteve na liderança, seguida pela Adidas, Puma, Macron e Kappa, conforme pode ser visto no quadro ao lado. 
Apesar de a “Marca Própria” constar na relação, não a consideramos para efeito de rankeamento, pois, o número ali apurado representa o somatório de várias marcas próprias. A consolidação tem como único intuito mostrar a variação desta modalidade de fornecimento. 
No campeonato brasileiro o número de fornecedores diminuiu de dez para sete, valendo salientar que, para efeito da análise, agrupamos todas as marcas próprias como uma única, caso as desmembrássemos o número de marcas na competição subiria para doze. 
Quando focamos as 30 equipes de maior faturamento de acordo com o relatório mais recente da Deloitte, relativo ao ano de 2018-19, fica bastante evidente a política adotada pelas três grandes marcas: em 2016-17 tinham a participação de 70%, passando para 80% em 2017-18 e 83,7% em 2018-19, salientando que na amostra total elas não chegam a 50% desde 2015-16. 
Entre as cinco ligas mais valiosas, a liderança passou da Nike para a Adidas, o que não acontecia desde 2016-17. 
Outra abordagem interessante da análise aponta para a queda da participação das marcas brasileiras, o que se explica pelo crescimento das marcas próprias no país. Ainda sobre essa modalidade de fornecimento, o estudo esboça um comparativo do mercado brasileiro e o europeu que, apesar de ter uma operação com essa característica, não deve aderir ao modelo de forma significativa. 
Diante da elevada quantidade de informações, inclusive market share por país, é certo que tenham ficado de fora desse artigo algumas de relevado interesse, o que faz com que a leitura do estudo completo torne-se extremamente importante para se entender e refletir sobre o mercado de marcas esportivas, no caso, uniformes, no futebol mundial.




terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Genuinamente Maradona

A vida e a morte de Diego Maradona nos colocam diante de uma situação bastante interessante pelo prisma de marketing e do próprio esporte.
Como um sujeito com a vida recheada de polêmicas envolvendo drogas, confusões e jogadas ilegais, entre outras, pode ser tão idolatrado?
Se formos analisar suas atitudes, chegaremos à conclusão que o craque argentino esteve longe daqueles personagens que recheiam filmes açucarados, contos de princesa ou mesmo de um modelo para os pais mostrarem aos filhos, ainda que sua humildade e valorização à amizade sejam dignos de registro.
Maradona nunca quis ser um personagem, embora tenha sido, as características que o compuseram foram sua irreverência, autenticidade e intensidade, as quais deixavam transparentes seus defeitos e falhas.
Chegamos assim numa discussão interessante para os que trabalham ou gostem de marketing.
Vemos por um lado várias marcas adotando o que chamamos no meio de storytelling, que vem a ser a narrativa de uma história, muitas vezes fantasiosas, sobre um produto ou serviço, de forma a atrair e reter a atenção do mercado, além de fortalecer o conceito e o posicionamento da marca.
Como exemplo, pegaremos a água mineral Fiji Water, vendida nos EUA, que é extraída de uma cratera vulcânica em Fiji, o que a posiciona como detentora de propriedades únicas que fazem bem à saúde. Seu preço equivale ao dobro do praticado pela concorrência, valor que é justificado pelos investimentos em melhorias na infraestrutura para a população do local. Em resumo, criaram um posicionamento de qualidade para a água – em tese, uma commodity – e dão ao consumidor outra boa razão para comprá-la: a ajuda humanitária.
No outro lado, temos as marcas que optam por explorar a realidade dos fatos e, dessa forma, ter uma relação mais direta e objetiva com seu público.
Ilustra bem essa forma de condução a marca Dove, cuja campanha “Real Beleza de Dove”, como o próprio nome já diz, enaltece o conceito de valorização da realidade, utilizando como modelos mulheres que fogem dos padrões habituais de beleza tão frequentes nos comerciais de cosméticos. Pesquisas da marca apontaram que 71% das mulheres e 67% das meninas gostariam que a mídia retratasse mulheres de aparência física diversa em termos de raça, idade, forma e tamanho.
E nesse ponto podemos fazer um paralelo com o jogador argentino, pois, provavelmente sua espontaneidade remeta todos nós a um processo de lembrança e aceitação sobre o quão imperfeitos somos, porém, por questões que não cabem ao marketing explicar, procuramos esconder e/ou disfarçar.
A discussão sobre qual dos conceitos é o melhor, equipara-se à que certamente inunda as redes sociais a respeito de quem é/foi melhor jogador.
Não há uma resposta conclusiva, visto depender de uma infinidade de variáveis e, ainda que todas pudessem ser contempladas, haveria o fator “opinativo”, na maioria das vezes tendencioso.