terça-feira, 30 de agosto de 2022

Patrocinador pode tudo?

Se fôssemos tentar fazer um exercício de quantificar as propostas de patrocínio que são elaboradas, enviadas, recebidas, analisadas e implementadas diariamente, desistiríamos no primeiro momento tamanha a fartura.
Por outro lado, se tal exercício incluir aspectos qualitativos, ou seja, se forem considerados pontos relativos à viabilidade, compatibilidade e retorno verdadeiro, a quantidade diminui de forma exponencial.
Nesse argumento, incluímos os responsáveis pela ativação do patrocínio que, muitas das vezes, pensam apenas na melhor forma de a marca se destacar sem se importarem com eventuais impedimentos legais, cujas desobediências podem trazer prejuízos pecuniários e de imagem superiores aos investimentos na iniciativa.
Recentemente foi divulgado que a World Surf League entrou com ações legais contra o Café Santa Monica por esse se intitular como um dos patrocinadores da QS (Qualifying Series) da etapa de Ubatuba do Circuito Banco do Brasil de Surf, quando, na verdade, era apenas o apoiador de um dos stands presentes no evento.
Não cabe fazer juízo de valor sobre as causas que levaram ao equívoco, no entanto, vale listar algumas implicações sobre o ocorrido: (i) os reais patrocinadores foram nivelados em algum momento à marca que não comprou os direitos; (ii) os varejistas podem ter comprado o citado café na expectativa de uma demanda impulsionada pelo patrocínio; (iii) é factível considerar que esses mesmos varejistas deixaram de comprar alguma marca de café da concorrência para dar espaço ao Santa Mônica, prejudicando assim a marca preterida e o giro objetivado na categoria.
Tal tipo de “confusão”, que se registre, não é exclusividade do citado café. Várias marcas, por patrocinarem atletas ou confederações que estão ou estarão nos Jogos Olímpicos, se acham detentores dos direitos de usar os símbolos olímpicos.
Há também marcas que se apoderam da imagem de atletas sem o devido direito. Nos Jogos de Atenas, uma grande marca de bebidas patrocinou a seleção olímpica de ginástica do Brasil, porém, interpretou que essa propriedade se estendia à utilização das atletas individualmente. Baseada nessa crença, desenvolveu uma série de ações, desde peças publicitárias até promoções, nas quais tampinhas que contivessem a imagem de uma das atletas daria direito a prêmios. O problema se agravou quando a marca – uma empresa do setor de telecomunicações - detentora dos direitos individuais de algumas atletas exigiu que o contrato fosse respeitado, o que redundou num enorme prejuízo para a marca de bebidas.
Generalizar o julgamento sobre a motivação para os equívocos redundaria em outro. Há, de fato, os que agem por má fé, o que não é exclusividade do marketing, e sim da sociedade de forma geral. Contudo, existem casos em que os responsáveis pela área de marketing não têm a devida capacitação para avaliar as implicações que as ativações podem originar e vão em frente no ímpeto de extrair o máximo de retorno sobre o investimento.
A solução para acabar com esse tipo de problema não é complexa. Ela passa mandatoriamente pela qualificação dos profissionais envolvidos, os quais, antes de qualquer decisão, ainda que eventualmente prejudique a velocidade, buscará pareceres jurídicos para ao menos ter noção das possíveis implicações.









terça-feira, 23 de agosto de 2022

Modismo como argumento

Estar na moda significa seguir um comportamento adotado pela maioria das pessoas, definição que é corroborada através da estatística, onde o termo “moda” faz referência ao valor mais frequente de uma dada amostra. 
Quando se trata de escolher uma forma de vestir é até mais seguro seguir a maioria, pois, mesmo que as peças utilizadas tenham uma estética discutível, elas fazem parte de um contexto onde o certo e o errado não passam de julgamentos subjetivos, muitos dos quais sem explicações lógicas.
Contudo, a opção de “seguir a maioria” nem sempre é a melhor opção quando se trata de investimentos. 
Quem não se lembra da febre das iogurterias quando se encontravam uma dessas lojas em cada esquina. Por mais que fosse um produto atrativo, acabou saturado pela enorme oferta. Muito provavelmente aqueles que investiram na iniciativa, fizeram acreditando se tratar de algo promissor, afinal muita gente estava aderindo.
No meio corporativo, a situação chega às raias do hilário quando se vê organogramas abrigando posições, em tese, da moda, mas cujas funções não guardam a menor relação com o significado da disciplina. 
Poucas empresas nos dias de hoje abdicam da posição de marketing em sua estrutura, contudo, da grande maioria que ostenta a “caixa de marketing”, poucas a utilizam na essência de sua definição. A propósito, vale citar o aparecimento de outra função, a de “growth”, ainda pouco incorporada, mas que em breve virará moda nos organogramas e, assim como o marketing, não será explorada na sua magnitude.
Exemplos que ilustram as consequências dos “modimos” não faltam, mas para não nos estendermos em outras vertentes, vamos falar agora de futebol, mais precisamente do movimento que os clubes brasileiros fizeram na busca por um técnico estrangeiro.
Sim, os resultados obtidos por um treinador português quando dirigia o atual vice-campeão carioca levou à conclusão de que os profissionais brasileiros se encontravam num patamar inferior, desencadeando assim uma busca desenfreada por técnicos estrangeiros. 
O processo seletivo, se é assim que podemos nos referir às contratações, passou a adotar como requisito a nacionalidade do profissional.
Claro que a experiência em mercados mais “maduros” no tocante a planejamento e estrutura se constitui num diferencial, porém resumir as escolhas simplesmente a isso é errado, pois negligencia as demais características tanto do treinador como das instituições e do próprio campeonato.
Como as expectativas ficaram distantes da realidade, a certeza absoluta do sucesso em função da nacionalidade vem se acabando, o que era de se esperar, todavia, há o risco de se incorporar uma nova certeza: a de que técnicos brasileiros é que resolvem. Outro erro, desculpem. 
Enquanto os clubes ficarem procurando “fórmulas mágicas e infalíveis” ao invés de desenvolverem um processo bem elaborado para análise de recursos humanos, o modismo acabará prevalecendo até como forma de “terceirização de erros”, visto bastar usar o exemplo de outro clube para justificar a contratação que não deu certo.
Em tempo, é preciso dizer que critérios de escolhas perfeitos não existem, mas quanto mais científicos, menor a chance de se cometer equívocos.





terça-feira, 16 de agosto de 2022

A importância da pontualidade

Faltando pouco mais de 100 dias para o início da Copa do Mundo no Qatar, a data da abertura foi antecipada em um dia.
Para alguns, tal alteração não tem muita importância, dentre esses estão aqueles que acham que 5 minutos de atraso não pode ser considerado atraso e que a cobrança pela pontualidade nada mais é do que um capricho dos que preconizam o respeito ao combinado.
Para ilustrar as consequências do "não cumprimento" do que se é combinado, analisaremos a seguir as implicações do citado adiantamento da abertura da Copa.
No que tange à comunicação, as campanhas referentes à contagem regressiva foram impactadas tanto no âmbito da produção dos materiais publicitários, pois poderia haver o risco de as peças não estarem prontas a tempo, como também no espaço onde elas seriam divulgadas - em outras palavras, o processo de compra de mídia foi fortemente impactado. 
Exemplificando, as veiculações alusivas aos 100 dias que faltavam para o início do evento precisaram estar nas grades dos meios de comunicação no dia X-100, não havendo a menor possibilidade de ser X-101, todavia, pelo pouco tempo para se adequar à alteração, é bem provável que não houvesse espaço disponível.
Esse problema não se restringe às ações do comitê organizador, atingindo também aos patrocinadores que, ao decidirem pelo investimento, idealizam um cronograma de ações, muitas das quais atreladas às estratégias comerciais as quais, por sua vez, envolvem negociações com fornecedores e revendedores.
Além das implicações referentes a ativações e publicidade, não podemos esquecer-nos dos problemas relacionados às reservas de hotéis, até porque a oferta de quartos tem sido motivo de preocupação no Qatar. 
Será que haverá disponibilidade de acomodações para quem quiser/precisar antecipar suas hospedagens? Essa dúvida pode ser derivada para os voos.  Não menos importante é a agenda dos que compraram os ingressos, pois pode ser que não consigam alterá-la.
São pontos que causam transtornos e que poderiam ser evitados, visto que a motivação da mudança não se deveu a problemas estruturais, tampouco de fenômenos naturais. A antecipação se deveu à decisão de preservar a tradição de ter a equipe do país-sede jogando a primeira partida da competição, ou seja, houve tempo de sobra para que o fato fosse considerado no planejamento.
Fazendo um paralelo com as pessoas que insistentemente não cumprem os prazos combinados, o processo costuma ser o mesmo. Não planejam seus afazeres e caminhos, desprezam a possibilidade de adicionar um intervalo para eventuais imprevistos e estendem-se em tarefas desnecessárias e/ou adiáveis.
Pior que isso, ignoram as demais partes do acordo, esquecendo que as mesmas abdicaram de algo para que o prometido fosse cumprido. Tais quais o comitê organizador, parecem pensar: “os outros que se virem”.
Para esses nunca é demais repetir um provérbio inglês que diz: "a pontualidade é a cortesia dos Reis e a obrigação dos educados." 








terça-feira, 9 de agosto de 2022

Omo, Hellmann's...

Se propusermos um exercício ao leitor acerca das semelhanças que as marcas citadas no título guardam entre si, certamente não haverá muitas surpresas. São marcas facilmente encontradas no setor varejista, produzem itens de reconhecida qualidade e pertencem à Unilever. 
O que talvez possa passar despercebido é que ambas fizeram movimentos que incorporam serviços a elas, até então reconhecidas como estritamente de produtos.
A Omo, marca voltada à higiene e limpeza, tem investido em modelos de lavanderias através da compra de redes, da franquia de unidades e da instalação de máquinas de lavar em condomínios, seguindo, nesse caso, o conceito do compartilhamento cada vez mais presente nos dias atuais. 
Nesse processo de acompanhar tendências, a marca também oferece sistemas de assinaturas para incrementar as receitas recorrentes e utiliza equipamentos que privilegiam a sustentabilidade em termos de dispêndio de água e energia.
Com essas iniciativas a Omo fortalece a associação de seu produto à limpeza, aumenta a exposição da marca e ganha participação de mercado. Esse último ponto é, no meu modo de ver, o mais genial, pois, ao incentivar a lavagem de roupas fora de casa em suas "lojas", tira do cliente a opção de comprar produtos da concorrência, ou seja, a ação se dá mandatoriamente com os produtos Omo.
Já a Hellmann’s, marca mais conhecida em função de suas maioneses, lançou recentemente uma hamburgueria em versão digital, na qual incorpora ao cardápio idealizado por renomados chefs sua gama de molhos. Dessa forma, associa seus produtos às melhores receitas e constrói relacionamentos com clientes que, muitas das vezes, não frequentam os pontos de vendas onde os produtos Hellmann’s estão disponíveis. Acrescente-se a isso, o fato de poder ofertar todo seu portfólio -  o que muitas vezes não é possível no varejo em função da concorrência que briga por espaço e verba de compras -, e cria mais um ponto de contato que permite obter de forma rápida feedbacks sobre seus produtos.
Há espaço aqui para argumentar que, ao contrário da Omo, onde o cliente que usa a lavanderia estará obrigatoriamente consumindo o sabão em pó e o amaciante da marca, no caso do hambúrguer, por ser consumido em um ambiente não controlado pela Hellmann’s, existe a possibilidade de se agregar molhos de outras marcas, fato que, mesmo sendo factível, em nada atrapalha os objetivos definidos para a iniciativa.
Sem acesso aos valores de investimentos, custos e receitas com vendas, não temos como avaliar os retornos das operações citadas, mesmo porque, há aspectos a serem considerados que não constam nos demonstrativos de resultados como os relativos ao fortalecimento das marcas e interação com os clientes, entre outros, porém, não restam dúvidas que ambas as iniciativas se apresentam bem coerentes e com foco no mercado.
Para dar respaldo a essa opinião, vale mencionar que algumas marcas de luxo como Gucci e Louis Vitton também partiram para a linha de serviços abrindo restaurantes em localidades como Saint-Tropez e Beverly Hills.










terça-feira, 2 de agosto de 2022

Isso não tem nada de mais?

Isso não tem nada de mais! Mas qual o problema? Fulano é correto! Não há nenhuma má intenção.
As frases proferidas acima costumam ser utilizadas como justificativas para atos que, mesmo não estando de acordo com os padrões éticos estabelecidos, recebem cargas de benevolência, cujas causas podem estar relacionadas à simpatia pelo autor do ato ou pelo histórico/frequência com que ocorre.
Para ilustrar tais situações, usaremos dois casos do esporte. O primeiro envolve o jogador do Barcelona, Gerard Piqué, sócio também de uma agência de marketing esportivo, a Kosmos, que intermediou o contrato relativo ao novo formato da Supercopa da Espanha, negociando os valores que cada clube receberia, assim como sua comissão pela operação. 
Diante dos salários auferidos ao longo da carreira e do histórico, até então livre de acusações quanto à correção, é bem provável que o zagueiro catalão não necessitasse de estar envolvido nessa operação.
Ainda que seja óbvio o conflito de interesses, a imprensa de Barcelona defendeu seu craque, enquanto a de Madrid teceu críticas.
Aqui fica evidente a influência da paixão na avaliação sobre os atos.
O segundo incidente diz respeito à denuncia de que o Boca Juniors presenteou previamente os árbitros de sua partida contra o clube boliviano Always Ready na fase de grupos da Libertadores 2022, sendo que a mesma foi decidida por um pênalti duvidoso a favor do clube argentino.
Segundo se comenta nos bastidores do futebol, tal prática é usual, vários clubes a fazem. Não se discute a intenção, até porque, em muitos das vezes, os próprios árbitros solicitam camisas dos times como lembranças.
Evidentemente que, mesmo que não haja nenhum tipo de influência na condução da competição, a prática depõe contra os padrões éticos que deveriam nortear as relações de conduta.
Assim chegamos a um termo bastante em voga nas grandes organizações: o compliance, que significa “obedecer” uma regra.
E se não existe regra definida? Boa pergunta! Na verdade, o termo engloba também os padrões éticos.
Talvez aqui resida o ponto nevrálgico da discussão: as possíveis interpretações para o termo “ética”, visto que, por conveniência e/ou ignorância a avaliação nem sempre é a correta.
Como já foi escrito acima, muitos julgamentos acerca do que é certo ou errado sofrem a influência da afinidade com os envolvidos, da vida pregressa do mesmo ou do quão normal o ato se tornou em função da frequência com que ocorre.
Diante desse quadro, é de fundamental importância que leis, normas, regulamentos e afins sejam escritos, divulgados e incorporados ao meio que se referem.
Por mais que pareça desnecessário estabelecer normas de condutas em nome de um suposto bom senso individual, esse não é padrão. Quem já presenciou alguém admitir que tenha mau senso? ´
Isso fica bem evidente no ambiente corporativo, onde muitas empresas aplicam quiz aos seus colaboradores como forma de aculturá-los com os conceitos de compliance. Os resultados, mesmo numa plataforma sem pressão e demais interesses envolvidos, assustam, tamanho a quantidade de respostas em não conformidade com o que é preconizado.
Além disso tudo, a triste realidade é que existem pessoas que realmente acreditam que certos atos, claramente em desacordo com os princípios morais, não têm nada demais. Por mais que seja um problema de índole, tais pessoas certamente passarão esses conceitos para seus filhos que, provavelmente, repassarão aos descendentes e assim por diante.
Voltando ao início do tema, a expressão “isso não tem nada de mais” é um bom gancho para concluirmos que, na verdade, tem é de menos. Menos educação, menos códigos de conduta e menos cumprimento ao que se é estabelecido.