terça-feira, 24 de abril de 2018

Salário não é tudo


Na época em que alguns clubes de futebol estavam para trocar seus tradicionais fornecedores de material esportivo por empresas "aventureiras", escrevi um artigo sob o título “Dinheiro não é tudo”  - http://halfen-mktsport.blogspot.com.br/2015/12/dinheiro-nao-e-tudo.html - , nele mostrava a importância de se considerar inúmeros outros fatores em decisões que envolvem relações duradouras e não apenas o dinheiro. Pena que na época o texto não foi entendido pelos gestores desses clubes, que acabaram optando por terem como parceiro uma marca incapaz de arcar com os compromissos – inclusive pagamentos – contemplados em contrato. 
Derivando para uma situação de escolha do emprego, fato que reconheço ser mais raro em cenários de crise econômica, podemos afirmar que salário não é tudo. 
Não me refiro aqui apenas aos benefícios que se incorporam ao salário e podem ser mensurados quantitativamente. Tampouco faço alusão a outros fatores relacionados às perspectivas de carreira e à melhor qualidade de vida como a proximidade da residência e atividades que, em tese, não sejam ligadas ao exercício das funções.
Claro que tudo isso é importante na tomada de decisão, porém, há outra variável que também considero de extrema relevância: o líder, aquele a quem o colaborador se reportará. 
E quais seriam as principais características de um bom líder? Antecipo que não serão citados nessa resposta aspectos como caráter e honestidade, visto serem essas obrigações de qualquer ser humano, aliás, esses jamais deveriam ser vistos como pontos de diferenciação. 
Partindo da premissa da plena capacitação técnica do líder, a qual consiste no conhecimento da função e na visão do coletivo, a diferenciação, no meu modo de ver, se dá em duas grandes frentes: 
Capacidade de desenvolvimento, que consiste em extrair o melhor de cada colaborador, de modo que não se exija o que não se conseguirá obter, mas que se descubra e explore os respectivos potenciais, valendo ressaltar que muitas desses podem até então serem desconhecidos. 
Tratamento dispensado, onde a confiança irá reger o relacionamento, de forma que todo comandado perceba que o que é solicitado faz parte de um plano de ação e que a exigência será sempre proporcional à sua capacidade. Além disso, deverá acreditar que o líder o preservará e o orientará em casos de mau desempenho antes de qualquer atitude mais drástica, já os sucessos sempre lhe serão reconhecidos publicamente. Infelizmente, muitos líderes confundem cobrança com desrespeito, parecendo esquecer que o equilíbrio psicológico influencia sobremaneira o desempenho e, consequentemente a coesão da equipe. 
Para deixar ainda mais claro e objetivo o que foi escrito acima, vale citar um exemplo de liderança extraído do esporte: o técnico Bernardinho, detentor de inúmeros títulos e que recentemente levou sua equipe à final da Superliga de voleibol com uma equipe teoricamente inferior, mas que conseguiu se superar justamente em função do desenvolvimento e tratamento proporcionado.
Não custa lembrar que muitas das jogadoras e membros da comissão técnica abriram mão de remunerações superiores ofertadas por outras equipes para poderem ser lideradas pelo técnico, o que corrobora para confirmar o título do artigo.



terça-feira, 17 de abril de 2018

Marketing - da ideia ao produto



Do surgimento de uma ideia ao lançamento de um produto existe um árduo e complexo caminho a ser percorrido, desse percurso fazem parte: a conceituação, os estudos de viabilidade econômica, as análises de mercado e a verificação dos aspectos legais, isso sem falar nas particularidades relacionadas às áreas de produção, logística, financeira, comercialização e marketing. 
Para ilustrar o que se pretende abordar nesse artigo recorreremos ao case relativo ao lançamento dos uniformes elaborados pela Umbro para os times brasileiros por ela supridos. A citada coleção tem o nome de  “Projeto Nations” e utiliza como inspiração alguns dos países que participarão da Copa do Mundo de 2018.
Antes de prosseguirmos é preciso ressaltar que a escolha do tema que servirá como inspiração para os uniformes dos clubes não é uma tarefa simples quando feita de maneira criteriosa, isso porque ela costuma se basear em algum fato marcante da história dessas instituições, o que por si só já confere uma maior complexidade, tamanho o cardápio de opções. Além disso, há a preocupação em se diferenciar dos modelos mais recentes e de coincidências de gosto duvidoso.
Nesse ponto é preciso reconhecer que a iniciativa da Umbro se mostrou bastante criativa, ainda que no passado alguns clubes brasileiros já tenham “tentado” ter seu terceiro uniforme com motivos que remetessem à própria seleção brasileira. 
Outra estratégia que vem sendo adotada com boa frequência no mercado também se fez presente na campanha. Refiro-me aqui ao storytelling, narração de uma história para se fortalecer o conceito e o posicionamento dos produtos. Vide http://halfen-mktsport.blogspot.com.br/2015/10/o-storytelling-chegou-ao-esporte.html 
Por se tratar de uma questão de ordem subjetiva, não será feito aqui nenhum juízo de valor sobre os “elos” que serviram como enredos para a narrativa da associação entre os clubes e os respectivos países cujos símbolos e cores adornam os uniformes. 
Ainda como parte do processo de análise de viabilidade do projeto há uma questão que é de fundamental importância: as expectativas de vendas.
Nesse quesito torna-se importante considerar que em ano de Copa do Mundo a camisa da seleção brasileira passa a ser mais desejada, aliado a isso é preciso reconhecer que o nível de renda atual não permite uma grande elasticidade de demanda por parte expressiva da população. Dessa forma é possível supor que algum – ou alguns – dos três uniformes anuais rotineiramente lançados pelos clubes seja preterido em favor da camisa da seleção. Entre os fatores que deverão pesar nessa escolha estão: o momento do time, o período do lançamento e até mesmo o aspecto estético.
Por último, vale discutir um tópico que talvez seja o mais sensível nesse caso: o eventual entrevero judicial que pode surgir com as marcas de material esportivo que são as fornecedoras das seleções “homenageadas” na campanha da Umbro, afinal de contas, é bem plausível que as camisas oficiais desses países sejam de alguma forma impactadas com a coleção. Problema que pode inclusive respingar nos clubes, visto que esses auferirão royalties com as vendas desses produtos.
A conclusão principal que se deve tirar dessas reflexões é que no âmbito do marketing qualquer ideia inovadora precisa ser muito bem trabalhada até que se transforme em um case de sucesso.








terça-feira, 10 de abril de 2018

Pontos alternativos



O setor esportivo, com o intuito de estar presente para novos públicos e promover as modalidades, tem adotado como uma de suas iniciativas a realização de competições em locais que originalmente não são voltados para esses eventos.
Entre essas ações podemos elencar a instalação de uma piscina na praia de Copacabana, partidas de voleibol em estádios de futebol e partidas de hockey sobre o gelo em arenas a céu aberto nas quais costumam acontecer jogos de beisebol e futebol americano.
São ideias bastante originais, mas que devem ter causado dúvidas e rejeições quando sugeridas pela primeira vez.
Reações similares também ocorrem no mercado de bens de consumo, onde disponibilizar produtos para o maior número de pessoas é objetivo de todo gestor, evidentemente que de forma rentável, ou seja, dentro de condições em que os custos de marketing, logística e comercial sejam compensados pelo maior volume de vendas com margens de lucro satisfatórias.
Hoje é possível encontrar, por exemplo, refrigerantes sendo vendidos em bancas de jornal e farmácias, sandálias em padarias e até pães sendo feitos nas lojas de conveniência dos postos de gasolina. Situações que podem parecer normais nos dias atuais, mas que eram inconcebíveis num passado recente.
Nesse passado, os refrigerantes eram artigos exclusivos de bares e supermercados, as sandálias de sapatarias e os pães de padaria, relações que parecem óbvias, afinal de contas o cliente buscava esses estabelecimentos quando demandavam tais produtos.
Aliás, os próprios varejistas buscavam, ainda que empiricamente, se posicionar como especialistas naquilo que se propunham a comercializar e não admitiam usar suas áreas de vendas para produtos diferentes dos habituais. Certamente não pensavam no conceito de conveniência, tampouco nas compras por impulso.
Derrubar tal paradigma foi um enorme desafio para ambos os lados. 
Para a indústria, pois, por possuir uma estrutura totalmente direcionada ao convencional - onde se incluem embalagens de embarque, equipes de vendas, veículos de entrega, condições comerciais e merchandising, entre outros - precisou fazer investimentos para que os novos canais pudessem ser bem atendidos. Isso tudo sem a certeza da aceitação do consumidor e dos próprios varejistas desses novos canais. Devem ainda ser acrescentadas ao cenário: a provável desconfiança de parte do board e a pressão dos antigos clientes que passariam a ter novos concorrentes.
Pelo lado do “novo” varejo fez-se necessário: apostar na dedicação de um espaço para a inclusão de novos itens no mix - o que contempla layout de loja, planograma e área de estoque -, criar novos mecanismos de compras, vendas e controles, correr o risco de perder o posicionamento conquistado ao longo dos anos e passar a ter novos concorrentes, os quais, talvez, com melhores condições negociais em virtude de possuírem uma relação mais longa com a indústria .
O que podemos concluir com esse artigo é que ideias para aproximar ou oferecer produtos ao cliente devem sempre ser analisadas, ainda que aparentemente possam parecer descabidas e difíceis quando surgem. 
Sendo importante ter em mente que tais iniciativas têm a função primordial de complementar o sortimento de produtos e que eventuais substituições radicais no mix original podem incorrer em sérios riscos tanto para a operação quanto para a identidade e posicionamento das marcas envolvidas.




terça-feira, 3 de abril de 2018

Analisando o patrocínio

O atletismo nacional sofrerá um forte baque com o fim da equipe B3 -  ex-BM&F Bovespa -  por onde competiram grandes nomes da modalidade no Brasil. Esse patrocínio foi responsável por dar condições para vários atletas treinarem, competirem em altíssimo nível e até conquistarem medalhas olímpicas. A situação traz consequências ainda mais graves pelo fato de não existirem muitas equipes estruturadas nesse esporte.
Fazendo uma analogia com o futebol brasileiro, seria algo mais ou menos como a decretação do fim da quase totalidade dos times que jogam a Série A, diminuindo assim a oferta de vagas, sendo que nesse caso ainda haveria a possibilidade de alguns jogadores se transferirem para o exterior. Situação que seria mais difícil no atletismo tanto em função das características dos campeonatos – não costuma haver competições importantes entre clubes – quanto pelo nível técnico dos atletas dessa modalidade, afinal o Brasil não chega a ser uma potência nesse esporte.
A empresa B3 em sua nota oficial relatou que o fim se deveu a uma mudança na estratégia de investimentos, pois pretende dar um foco maior à educação. Nada a contestar, é um direito e uma razão bastante nobre.
Contudo, valem ser abordados alguns pontos que auxiliam a reflexão sobre o fato.
O primeiro diz respeito ao argumento “direcionar recursos para atividades vinculadas à educação”, o qual pode denotar que o esporte de alto rendimento não atende a essas expectativas. Pode até ser que realmente não atenda, mas seria importante entender quais foram as expectativas geradas e avaliar o que deveria ser feito para atendê-las, de preferência antes do fim da relação. 
Ainda concernente à consolidação do esporte como um agente de educação, vemos que as empresas ainda pouco exploram a possibilidade de o patrocínio servir como um meio de posicionamento da organização, de forma que ela possa ser  percebida como uma instituição atenta à promoção da sustentabilidade do planeta e à melhoria de vida dos mais pobres, condições essas inerentes ao esporte e que vão ao encontro dos conceitos do marketing 3.0 preconizado por Kotler e já abordado aqui.
Por fim, não podemos deixar de considerar as especulações a respeito de que a troca do presidente da B3 teve forte influência na decisão tomada, o que é bem factível, afinal de contas muitos dos patrocínios que existem ou existiram no Brasil aconteceram em função da predileção dos principais gestores pela atividade patrocinada, o que não significa que os aspectos relacionados ao marketing tenham sido desprezados.
Exemplifica bem esse tipo de relação os investimentos que a Brasil Telecom e o Pão de Açúcar fizeram no esporte, os quais foram facilitados pela visão e  proximidade de seus gestores com a atividade, valendo ressaltar que independentemente disso as iniciativas implementadas eram totalmente fundamentadas nos mais rígidos princípios de marketing.
Todavia, o grande problema desse tipo de “motivação” para investir é que o risco de rompimento aumenta com a troca de comando, pois por mais embasados que sejam os projetos de patrocínio, sempre haverá internamente contestações advindas de outras áreas, seja por uma questão de crença na maior efetividade de outros investimentos, seja por miopia.