terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Sua empresa é tech?

 
Já faz algum tempo que chamo a atenção para a utilização da palavra “marketing” com vistas dar um cunho de, digamos, refinamento, a algo em que o objeto não tem o menor vestígio de marketing.
Ilustram essa condição o marketing esportivo, no qual muitos dos frequentadores da área dominam e/ou gostam de esporte, mas nada conhecem efetivamente de marketing. Podemos incluir nessa relação o marketing político, o digital, o pessoal e por aí vai.
Em um movimento similar surgem as startups de segmentos, muitos dos quais tradicionais, que, visando passar a percepção de algo inovador/tecnológico, adicionam tech ao final do setor que atuam. Fintech, Foodtech, Editech, Healthtec, Legaltech...enfim, a  variedade é extensa e com viés de crescimento.
Entendo que a denominação de fato ajuda a “impressionar”, mas cabe também questionar se as empresas que não se classificam como uma tech, abdicam da tecnologia ou não valorizam a inovação.
Sendo um crítico ferrenho das generalizações, não vou cair na tentação de responder negativamente ao questionamento anterior, visto poder haver corporações que não se atentem para a tecnologia, porém, essas, se existirem, certamente são em número reduzido e/ou em vias de extinção.
Na verdade, qualquer empresa que esteja há bastante tempo no mercado se preocupa com a inovação, o que vai desde a atualização de conhecimentos acerca dos anseios do público-alvo até a redefinição desses, o que implica em desenvolvimento de produtos/serviços apropriados. Mecanismos de controles, softwares de gestão são também, entre outras iniciativas de atualização, demonstrações de inovação, mas que, sabe-se lá por qual razão, não recebem esse nome, tampouco fazem dessas corporações uma tech.
No setor financeiro, vemos os bancos digitais sendo considerados fintechs, enquanto os tradicionais, mesmo com soluções digitais avançadas, não desfrutam desse “sufixo”.
Será que as necessidades de integração entre agências físicas e virtuais não são tão complexas a ponto de serem consideradas techs? E a gestão de clientes e produtos não impõe pesados desafios tecnológicos e de inovação? Aliás, não descarto que estes sejam até maiores do que os das que se intitulam techs.
O que pode ser colocado em pauta é a proporcionalidade de investimentos em tecnologia das “techs” em relação às empresas maiores, as quais, talvez, tenham essa participação menor, já que precisam dedicar atenção a outros aspectos da gestão. Mesmo assim, penso que a busca por soluções que, aparentemente, não tenham relação com inovação, na verdade tenham forte influência desta. Aqui podemos exemplificar com as plataformas de recrutamento e seleção, softwares de CRM, entre outros.
Vejo assim que a apropriação dessa bandeira esteja muito mais relacionada a um trabalho de posicionamento, no qual as empresas para se diferenciarem adotam o tech e o foco na inovação como atributos de diferenciação. Iniciativa válida, contudo, deixam de considerar que se trata de algo facilmente copiável, ou seja, por mais que as soluções sejam efetivamente inovadoras, nada impede que a concorrência se apodere dessa percepção com investimentos até menores.
Claro que as empresas pioneiras conseguem “surfar bem” nesse mar, no entanto, as "seguidoras" podem estar seguindo um caminho que as levará para um oceano vermelho do qual se necessitirá de algo mais do que modismos para se safar.





terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

As receitas dos clubes - 2022-23

O artigo dessa semana analisa as receitas dos 30 clubes com maior faturamento na temporada 2022-23, segundo o relatório da Deloitte “Football Money League”, o qual, por sua vez, embasa o estudo da Jambo Sports Business, cujo link para acesso é https://www.linkedin.com/posts/halfen_os-clubes-de-futebol-que-mais-faturam-2006-activity-7165260580096786432-SmTo?utm_source=share&utm_medium=member_desktop
Entre os pontos que constam no estudo, mas que julgamos interessante destacar aqui estão:
  • O somatório das receitas dos 10 clubes com maiores faturamentos cresceu 14%, desses apenas um, o Liverpool, teve decréscimo no faturamento.

  • Vale atentar para o enorme crescimento da indústria “futebol”, pois, em 17 anos a receita total dos TOP 10 saiu de € 2.505,2 para € 7.185,4, um aumento de 187,2% no período, salientando que muito poucos negócios evoluíram tanto e de forma praticamente constante neste período. As alterações na relação dos TOP 10 se restringiram basicamente à classificação, já que os clubes foram os mesmos.
  • O total de receitas desses clubes com matchday cresceu 24,8%, o que pode ser creditado à demanda por atividades ao ar-livre pós-pandemia. Nove desses clubes aumentaram o faturamento nessa linha.
  • Embora as receitas com matchday tenham melhorado a participação em relação à temporada anterior (17,3% vs. 15,8%), ela ainda se encontra bem distante das demais. Situação que é lógica, visto haver limitação de assentos nos estádios, ou seja, só uma majoração de preços seria capaz de impactar, a qual pode não ser suficiente, visto a possibilidade de sofrer com a elasticidade do preço dos ingressos.
  • Já o faturamento com broadcasting foi o mais tímido, 6,8% e apenas quatro clubes entre os TOP 10 tiveram incremento, enquanto os ganhos com commercial aumentaram 16,3% e todos os 10 mais cresceram sob essa ótica.
  • A Premier League se mantém como a liga com mais clubes entre os TOP 30 (quatorze). Em segundo aparece a Serie A (Itália) com cinco, seguida por LaLiga (Espanha) com quatro equipes. Completam a relação com três times cada a Bundesliga (Alemanha) e a Ligue 1 (França). Por fim, temos Portugal presente com um clube.
  • Dos números apurados chama a atenção os expressivos aumentos de receitas de Milan (45,5%), Newcastle (35,6%) e Barcelona (25,4%) sobre a temporada passada. No caso do Milan, o incremento de 146,7% no faturamento com matchday foi o principal responsável pelos bons números gerais, embora todas as linhas tenham crescido. Vale notar que outros clubes italianos também aumentaram essas receitas – Inter (104,5%) e Juventus (78,1%). A propósito, o mesmo ocorreu com os times alemães – Borussia Dortmund (97,4%) e Bayer Munchen (77,9%).
  • O Real Madrid ficou pela 11ª vez como o clube que mais faturou. A diferença em relação ao vice-líder, o Manchester City, foi de € 5,5 milhões. Vale lembrar que na temporada anterior, essas posições estavam invertidas e o clube inglês teve € 17,2 milhões a mais de receitas.
  • Vale ainda prestar atenção ao processo de queda do Manchester United, que foi líder em 2015-16 e 2017-18 e que aparece em quinto na temporada atual, mesma posição de 2020-21 – a pior desde que a Jambo realiza o estudo.
Na apresentação, cujo link foi destacado no primeiro parágrafo, há inúmeras outras informações que ajudam a entender melhor as arrecadações dos clubes.




terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Quanto vale a marca do seu time?

Recentemente foi publicado um estudo acerca dos valores das marcas dos principais times brasileiros, o qual teve uma razoável repercussão nas redes sociais, onde o filtro quase inexiste, e na imprensa, onde deveria existir, mas...
Antes de passarmos ao conceito de valuation, é importante comentar que, por ser um mercado ainda pouco maduro, os eventuais resultados que podem se obter através das variadas metodologias servem como meros instrumentos ilustrativos, os quais, talvez, possam se incorporar ao rol de indicadores “legais” para discussão de torcedores, tais como tamanho de torcida e número de seguidores, entre outros, mas que não se convertem diretamente em conquistas esportivas, tampouco abordam corretamente o conceito de branding.
Afinal, a marca de um clube vai ser precificada, na verdade, em função de quanto os investidores estarão dispostos a pagar e o “vendedor” a receber.
Mas deixando esse pragmatismo de lado, é necessário mencionar que existem vários métodos para se chegar ao valor de uma empresa. Ok, podemos estender, guardadas as devidas ressalvas, para times, porém, sem a pretensão de se encontrar resultados idênticos com metodologias diferentes.
Aliás, diante dessa usual divergência de valores é que recomendamos a utilização de mais de uma metodologia, até porque, muitas das vezes, uma complementa a outra.
Advém daí a minha crítica à imprensa em divulgar os valores como uma verdade absoluta, sem sequer mencionar as eventuais incongruências que os estudos podem apresentar, afinal, se houvesse tanta assertividade assim, não haveria nenhuma discussão acerca dos valores nas operações de M&A, nem haveria tantos rankings diversos sobre valor de marcas.
A título meramente de ilustrar as devidas opções de modelagens, vamos listar a seguir alguns métodos, pedindo adiantadamente desculpas caso o artigo pareça enveredar para o lado do “economês”. Por outro lado, utilizamos das mesmas escusas por simplificar algo que requer bastante detalhamento.
- Múltiplo EBITDA - aqui se calcula o valor em relação ao Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização), visando encontrar um multiplicador aceitável para as partes. Como grande parte dos clubes, especialmente no Brasil, não têm esse índice positivo, o método também sofre restrições, de forma que muitas das vezes, inclusive no caso de empresas, passa-se a utilizar o múltiplo sobre as receitas.
- Múltiplos de mercado P/L – mantendo o conceito de múltiplos, nesse método o cálculo se dá ao dividir o preço da ação pelo lucro por ação nos últimos doze meses. 
- Fluxo de Caixa Descontado - nessa metodologia se traz a valor presente os fluxos de caixa futuros, descontando uma taxa que reflita as perspectivas de mercado. O desafio do método é ter que assumir taxas de crescimento e de desconto.
- Transação Comparável - através dessa análise, se realiza um comparativo com outras empresas/clubes que foram recentemente vendidos.
- Valor Patrimonial - que calcula o valor da empresa/clube tomando como base os ativos líquidos. Aqui a imprecisão ganha maior proporção no caso de corporações com consideráveis valores de ativos intangíveis. Lembrando que, contabilmente, o jogador é classificado dessa forma.
- Método de Valor Residual, geralmente se usa essa metodologia como complemento à do fluxo de caixa descontado e consiste em se estabelecer um período e um valor residual ao final desse.
Por limitação de espaço e para não fugir muito ao objetivo do blog, não nos deteremos nos demais métodos, dentre os quais, citamos o de Lucros Excedentes e o de Opções Reais. A ideia aqui é esclarecer que não há metodologias perfeitas, pois, dependerá da maturidade, da disponibilidade dos dados propiciados pela organização e pelo setor e, sobretudo, de quanto as partes estarão dispostas a pagar e receber.










terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Calma, bet!

A decisão da Supercopa do Brasil 2024, que colocou frente a frente Palmeiras e São Paulo, nos brinda com um interessante fato para ser analisado sob o prisma de marketing.
Mais precisamente, vamos falar do São Paulo, que ostentou na sua camisa as marcas de duas empresas do segmento de apostas: a antiga patrocinadora, a Sportsbet, que ficou exposta no espaço máster, enquanto a atual, a Superbet, apareceu através da logo nas mangas.
Por mais que tenha havido um acordo entre as empresas, fica claro que ambas focam basicamente seus investimentos de patrocínio na exposição da marca, desprezam as diversas possibilidades de associação aos valores do clube e se dão por satisfeitos caso haja um bom retorno de mídia espontânea.  
Vale aqui um questionamento: as empresas que encaram o esporte como um mero veículo de mídia já promoveram algum estudo comparativo sobre a eficácia dos diversos meios disponíveis para, daí, chegar a um bom equacionamento de alocação de verbas? Ou será que simplesmente seguem o que os concorrentes estão fazendo?
Voltando especificamente ao mercado de "apostas", convido todos a fazerem um singelo exercício acerca das estratégias de marketing das empresas desse setor.
Os nomes são similares, quase todos trazem a palavre "bet" na marca com o provável intuito de deixar claro o que fazem, esquecendo, no entanto, que há inúmeras formas de se escolher nomes, muitas das quais não têm como objetivo que a nomenclatura remeta ao negócio fim da empresa. O que o nome "adidas", por exemplo, tem a ver com material esportivo? E "Amazon" com comércio eletrônico?
Continuando o exercício proposto, vemos que os produtos ofertados têm pouca diferenciação, o preço (valor de aposta e prêmio), idem, além de serem acessíveis indistintamente, basta dispor de internet para se conectar às plataformas. Por mais que alguma dessas empresas consiga propiciar uma navegação mais intuitiva e rápida nos seus sites, ou que implemente alguma ação promocional arrebatadora  abdicando de parte da margem para atrair o consumidor, nada garante que isso será percebido e/ou será suficiente para fidelizar e reter o cliente. Ainda que exagerada, a comparação com commodities ajuda no acompanhamento da reflexão pretendida.
A própria estratégia de divulgação é bastante similar entre as marcas, e as tentativas de ativação não parecem ocorrer em qualidade, frequências e intensidades que permitam alcançar os objetivos. Aliás, não custa perguntar: quais são os objetivos?
Em que uma marca se diferencia em termos de atributos valorizados e perceptíveis de outra? 
Provavelmente um bom atendimento pode facilitar o trabalho de diferenciação, até porque esse talvez seja o único ponto de interação com humanos, mas é também um dos mais difíceis, visto exigir fortes investimentos em contratação, treinamento e supervisão.
Na prática, o que vemos é que por mais presentes que as "bets" se façam, poucas procuram se posicionar. As que tentam, apelam para condições aparentemente pouco impactantes ou que não se constituem em efetivas vantagens competitivas, muito menos dignas de alcançar uma liderança sólida e sustentável na mente dos consumidores.
A argumentação que a fase atual do mercado está voltada a uma espécie de seleção natural dos mais fortes é, sem dúvida, coerente. É absolutamente usual que vários players adentrem indistintamente mercados teoricamente promissores e que muitos deles não consigam sobreviver. É comum também que as marcas mais “ponderadas”, isto é, mais conscientes que estão numa maratona e não numa prova de 100 rasos, tenham mais chances de triunfar. Todavia, fica difícil adjetivar de consciente aqueles que, ao invés de buscar a diferenciação, investem na imitação.
Branding? O que é isso? Marketing? Ué, já faço propaganda!
Esse suposto diálogo dá bem a tônica do que acontece no mercado aqui em foco, mas justiça seja feita, não reside neste a exclusividade da pouca atenção ao marketing como ferramenta estratégica.