terça-feira, 29 de setembro de 2015

Maratona de Berlim, uma vitória de Pirro?


No último domingo ocorreu a 42ª edição da Maratona de Berlim, considerada a mais rápida do planeta, tanto que por sete vezes a melhor marca do mundo foi obtida naquele percurso, sendo que em 1998 o protagonista do feito foi o brasileiro Ronaldo da Costa.
O vencedor no masculino esse ano foi o queniano Eliud Kipchoge, que tinha tudo para superar a melhor marca, mas um problema com a palmilha de seu tênis pode lhe ter custado preciosos 63 segundos.
Isso porque, já no início da prova as palmilhas do calçado se soltaram e parte delas ficou para fora, prejudicando a performance não só pela menor tração que provocou, como também pelo incômodo de ter a parte posterior da perna sendo tocada intermitentemente durante a corrida.

A possibilidade de arrancá-las e acabar com o tormento foi descartada pelo atleta, sob a alegação de que a performance seria prejudicada caso o maior impacto da passada não tivesse o efeito do amortecimento das palmilhas. 
Pode ser, mas creio que o maior prejuízo seria com a quebra de ritmo que se daria com a execução da manobra.

Deixo para os profissionais da área avaliarem as consequências técnico/esportivas do fato, e direciono minha análise para os aspectos mercadológicos que o envolvem.

Trata-se de uma maratona cujo patrocinador técnico é a Adidas e que desde a edição de 2004 tem como vencedor um atleta patrocinado por essa marca alemã, ou seja, há 11 anos o lugar mais alto do pódio masculino é ocupado por um corredor que veste a marca das três tiras.
Em 2015, enfim, a Nike conseguiu quebrar essa hegemonia com Kipchoge, porém, o problema ocorrido em seu calçado fez com que a vitória não pudesse ser capitalizada em sua plenitude.
Apesar do problema, a marca americana não deve ter a qualidade de seus produtos questionada pelo incidente, até porque outros atletas usaram o mesmo calçado, além de, provavelmente, o próprio vencedor tê-lo feito em outras competições.
Entretanto, é inevitável que a imagem sofra algum abalo - o qual precisa ser mensurado - , já que os que praticam atividades ligadas ao running e acompanham essas competições, poderão ficar receosos de se decidirem pelos calçados da marca quando forem comprar novos tênis.
Imagino que nesse momento já devam ter ocorrido dezenas de reuniões na Nike, não só com os responsáveis pela parte de design, fabricação e distribuição do produto, mas também com o pessoal de marketing, comunicação e até finanças, pois a possibilidade de um recall não deve ser descartada, assim como o de um comunicado de grande abrangência.
Tais reuniões certamente estão sendo embasadas por pesquisas e monitoramento das redes sociais, pois muitas vezes o “estrago” tem leituras diferentes, ou seja, pode ser que o público-alvo e os formadores de opinião não tenham sido impactados tão negativamente quanto poderia se supor num primeiro instante, ou talvez, tenham sido até mais.
Outro ponto a se considerar é a duração da repercussão, pois não é impossível que em dois dias o assunto seja esquecido e num momento de compra, o cliente nem se lembre mais da marca do "tênis da palmilha solta".
Enfim, decidir sem conhecimento e com alto grau de ansiedade é a química perfeita para uma solução ruim, e mesmo diante da óbvia pressão por parte de alguns executivos, é mandatório analisar detalhadamente o impacto do “acidente” para depois se definir o que será feito.
Nesse caso, o próprio Eliud Kipchoge pode servir como exemplo, pois mesmo correndo e pressionado pelos adversários, soube sentir a prova, analisar suas condições e buscar o triunfo, ainda que sacrificando o “recorde mundial”.




terça-feira, 22 de setembro de 2015

A movimentação das marcas esportivas

A Jambo Sport Business, consultoria especializada em gestão esportiva publicou recentemente um novo estudo sobre a presença das marcas esportivas nos clubes de futebol. http://pt.slideshare.net/jambosb/marcas-esportivas-na-20-ligas-mais-valiosas-do-mundo-20152016.
O trabalho utilizou como amostra os 370 clubes que disputam os 20 principais campeonatos nacionais de 1ª divisão na temporada 2015/2016, e comparou o desempenho das marcas em relação às temporadas 2013-14 e 2014-15.

Ao todo foram encontrados 60 fornecedores e mais uma vez a liderança pertenceu à Nike com 85 times (22,97%), seguida pela Adidas com 79 equipes (21,35%). Vale destacar que a diferença entre as duas gigantes caiu em relação ao período anterior que apontava 24,04% para a marca americana contra 20,22% da empresa alemã.

A Puma segue em 3º com 22 (6,22%), porém dessa vez com a espanhola Joma quase empatada (21 – 5,95%). Em 5º aparece a Umbro e a Kappa (18 times cada – 4,86%), seguidas por Lotto com 11 (2,97%) e Macron com 10 (2,70%). 

Pela 1ª vez que a New Balance aparece no estudo, porém a empresa já atuava nesse mercado através da Warrior, que por decisão estratégica do grupo controlador saiu do futebol e deu lugar à marca mãe.


Apesar de ser a marca mais presente nos clubes da amostra, a Nike parece apresentar problemas em países de suma importância sob o prisma de geração de receitas.
Na Inglaterra, após ter perdido o gigante Manchester United para a Adidas, ficou apenas com o Manchester City, muito pouco em comparação ao portfólio dos dois principais rivais. A situação só não é mais grave, pelo fato de a marca vestir a seleção inglesa.
Já na Alemanha, a marca americana não está presente nem na seleção nem nos principais clubes.
Outra grande perda sofrida pela Nike ocorreu na Itália, onde a Juventus a trocou pela Adidas.
A gigante alemã, por sua vez, além de se aproximar da Nike em termos quantitativos, passou a focar mais fortemente clubes com maiores apelos de popularidade e de desempenho esportivo.
Isso fica mais claro ao se observar o quadro que contém os fornecedores dos 30 clubes de maior faturamento, onde o placar fica 13 a 7 para a marca das três listras.

O estudo reforça também que o aspecto quantitativo, ou seja, o número de clubes que veste dada marca, não é o único parâmetro que deve ser utilizado para avaliação de desempenho mercadológico, visto que o fato de vestir a seleção daquele país – o que está contemplado no trabalho –, assim como os clubes de maior tradição e popularidade são também aspectos de elevado interesse para as marcas esportivas. Além disso, a globalização e a internet propiciam que os clubes passem a ter torcedores e simpatizantes em localidades que transcendem as fronteiras de suas cidades e países.



terça-feira, 15 de setembro de 2015

Hora de parar?


"Eu não quero ser lembrado como um campeão que foi batido".


Essa frase dita pelo pugilista Rocky Marciano - campeão mundial de boxe na categoria peso pesado - , ao se aposentar da modalidade invicto em 1956, esteve bastante em voga nesse último final de semana, isso porque dois esportistas, ainda no auge, anunciaram suas despedidas do esporte.
A tenista italiana Flavia Pennetta fez a declaração após conquistar o US Open, enquanto Floyd Mayweather, a fez após conquistar sua 49ª vitória, igualando o recorde de Rocky Marciano.
Como em quase todos as decisões, há os que concordaram, reforçando que a retirada deve acontecer quando se está no auge e os que acharam cedo demais, afinal ainda estão vencendo.
A discussão em relação à manutenção da performance, apesar de interessante, está mais voltada aos aspectos de fisiologia e motivação do atleta, razão pela qual vou me abster de comentar.
Entretanto, vale trazer à reflexão para o prisma do marketing e aqui aplicarmos o conceito de ciclo de vida de um produto, guardadas as devidas peculiaridades. Sob essa ótica, teremos que tanto Mayweather quanto Pennetta foram “descontinuados” no período de maturidade, quando ainda possuem boa participação de mercado e, em tese, propiciam boa margem.

Imaginem, por exemplo, que a Alpargatas decida descontinuar as sandálias Havaianas ou que a Unilever faça o mesmo com o sabão Omo, produtos líderes de mercado com ótimas margens. Essas empresas, até encontrarem produtos substitutos “sofrerão” para recompor seus resultados. Assim como deverá ser impactado o boxe mundial e o tênis feminino italiano.

Mas por que o termo “em tese” foi utilizado quando fiz referência à margem que o atleta aufere? Afinal de contas, as bolsas, prêmios, patrocínios e demais benefícios estão bem maiores do que eram no início de suas carreiras, além do que, os custos de preparação não subiram na mesma proporção das receitas.
O “em tese” foi usado pelo fato de o atleta chegar num estágio da vida em que conviver com dores diárias, com pressão, com cobranças e abdicando do convívio de lazer com amigos e famílias, passa a ter um custo muito alto e pareça não compensar. Como tal custo é impossível de ser quantificado monetariamente, a decisão é tomada muitas vezes de forma instintiva, e com grande risco de vir a ser revogada algum tempo depois do anúncio.
Não obstante à incerteza quanto à data correta para se retirar, há uma condição que deve ser sempre perseguida: que é a de se ter o controle da situação, ou seja, a decisão deve caber ao atleta e não deixar que os outros a tomem em seu lugar. "Sair de cena", sem que seja uma decisão própria, pode ser equivalente à figura do “campeão batido” citada pelo Rocky Marciano.
Para isso, é importante que, mesmo diante da incerteza quanto ao futuro, exista um planejamento de carreira, no qual o fator “necessidade” não tenha um peso preponderante na decisão.

O mesmo raciocínio pode ser estendido à vida corporativa, na qual o executivo – ainda que com uma vida útil maior do que a do atleta – deve planejar sua carreira, de modo que haja relativa flexibilidade para eventuais mudanças geográficas, de cargos e empresas.
Por fim, temos que lembrar que na cadeia produtiva que envolve as atividades tanto esportivas quanto corporativas, há espaço para profissionais com as mais variadas características, isto é, ser o melhor é um aspecto bastante subjetivo.


terça-feira, 8 de setembro de 2015

Os simpatizantes



Apesar de o esporte envolver uma forte componente de paixão, não podemos esperar que esse tipo de sentimento seja requisito para criação do mercado de consumidores.
Caso um clube dependa apenas de seus fanáticos torcedores para consumo de ingressos, produtos licenciados ou mesmo para assistir as partidas pela televisão, estará desperdiçando uma gama considerável de potenciais clientes.
Raciocínio similar deve ser aplicado às modalidades esportivas que, se dependerem apenas dos que a praticam ou que a acompanham assiduamente, ficarão com um universo de espectadores aquém do que poderia ser explorado.
Obviamente, não se deve esperar que um torcedor do Fluminense venha a comprar camisas de seu rival, nem vice-versa - apesar da beleza da camisa tricolor - mas seria algo perfeitamente normal se torcedores de times de outros países e até cidades o fizessem.
Na verdade, isso já acontece através da figura do “simpatizante”, principalmente no exterior.
Somando-se às receitas diretas, um maior número de simpatizantes tem o poder de popularizar o “simpatizado”, que passa a ser mais e melhor falado, além de conquistar mais “defensores”, ativos valiosíssimos para qualquer organização.
Para melhor entendimento do conceito, podemos definir simpatia como “a atração por uma coisa ou ideia”.
Dentro dessa perspectiva, vejo os clubes e as confederações brasileiras explorando muito timidamente esse nicho.

Para aproveitar um fato recente que serve para exemplificar o poder da simpatia, reportamos a ajuda do Bayern Munchen aos refugiados da Síria, doando 1 milhão de euros e disponibilizando um de seus CT’s para abrigo.
Alguém tem alguma dúvida de  que com essa iniciativa o clube arregimentou um expressivo número de simpatizantes?
Muitos desses devem ter se tornado seguidores da fanpage do clube, ou, quem sabe, até ter passado a ser um potencial comprador de suas camisas, além, é claro, de ter um time pelo qual estará mais inclinado a torcer na Alemanha.
Evidentemente, que não são apenas as ações humanitárias que têm tal poder, essas, aliás, devem ser feitas sem se pensar nesse tipo de retorno. 
Entre algumas iniciativas a serem executadas com o intuito de atrair simpatizantes estão visitas a outros países, contratação de ídolos internacionais, sites em vários idiomas, etc.
Adaptá-las ao universo nacional também não é tarefa das mais difíceis.
No caso das modalidades esportivas, é fato que não existe uma fidelidade canina por parte dos fãs, porém é fundamental que mais pessoas passem a acompanhar outros esportes.
Isso se consegue tanto com a presença de ídolos e atletas que possam representar bem o país, como também pelo “aculturamento” da população acerca da modalidade - fazer com que o, até então, leigo, passe a conhecer suas regras e particularidades interessantes.
Esse raciocínio pode até ser estendido a cidades, e para se manter no âmbito do esporte, usar como ferramenta de “atração de simpatia” o recebimento de competições importantes. Isso faz com que o local fique conhecido sob um prisma ligado aos valores intrínsecos do esporte, e dessa forma consegue despertar em potenciais turistas o desejo de visitar a cidade.
Vale observar que aqui também há a necessidade do aculturamento, porém na esfera de mostrar à população que eventuais transtornos na cidade fazem parte da cota de sacrifício do cidadão e que, em tese, trarão como retorno divisas para o município.
Se tais divisas serão investidas de forma inteligente e honesta é outra conversa, sobre a qual prefiro não me pronunciar nesse foro para deixar que a reflexão se concentre no potencial a ser explorado através dos "simpatizantes".








terça-feira, 1 de setembro de 2015

O ingresso está caro? E o valor?

O que me levou a escrever esse artigo foi a matéria publicada pelo jornalista Rodrigo Capelo  uma das raríssimas exceções positivas na imprensa que escreve sobre gestão esportiva – em sua seção Época Esporte Clube http://epoca.globo.com/vida/esporte/noticia/2015/08/elitizacao-do-futebol-ingresso-brasileiro-e-o-mais-inacessivel-do-mundo.html sobre a elitização do futebol brasileiro.
Seu texto, baseado no estudo de Oliver Seitz acerca da relação preço do ingresso vs. salário mínimo, discorre sobre a quantidade de horas de trabalho necessárias para se comprar um ingresso nos principais campeonatos nacionais do mundo.
Ponderações bem-feitas, levantamentos idem, porém creio que haja espaço para duas colocações que implicitamente estão lá, mas que valem ser realçadas.
Na primeira, volto mais uma vez ao termo Belíndia, cunhado pelo Professor Edmar Bacha, ao fazer referência a um país fictício, que resulta na conjunção de uma nação rica com leis e impostos de primeiro mundo, tal como a Bélgica, com outro de realidade social pobre como a Índia.
Esse termo, apesar de ter se popularizado há cerca de 40 anos, continua bem atual, inclusive no futebol.
Na verdade, é muito difícil fechar a conta da precificação do ingresso num ambiente em que jogadores recebem um salário similar aos de primeiro mundo, enquanto que o poder aquisitivo dos torcedores fica muito abaixo. O estudo mostrado ficaria ainda mais completo se o autor fizesse um levantamento da média salarial dos jogadores dos clubes que disputam os campeonatos nacionais de primeira divisão em relação ao salário mínimo nos países pesquisados.
Mas, independentemente dos resultados apurados, as contas dos clubes precisam ser pagas, aliás, grande parte destas é constituída de juros e execuções sobre não pagamentos das obrigações anteriores. Acrescente-se a isso, o fato de os torcedores exigirem equipes competitivas, o que implica, muitas das vezes, em folhas salariais maiores.
A hipótese de se colocar um teto salarial, proposta por muitos, não faz sentido num mundo globalizado, pois o mercado externo absorveria mais ferozmente nossos jogadores.
Dentro dessas condições, fica complicado encontrar o preço ótimo do ingresso tomando como parâmetro o salário mínimo do brasileiro ou mesmo os custos do clube.
Até porque, aí entro no segundo ponto que gostaria de realçar, acho que a discussão talvez passe mais pelo valor do que propriamente pelo preço do ingresso.
Explico, preço é a expressão quantitativa de um bem ou serviço, enquanto que o valor é quanto aquele bem ou serviço trará de benefício e/ou satisfação ao consumidor.
Assim, para uma precificação mais perto do “ponto ótimo” haveria a necessidade de estudos e pesquisas mercadológicas, nas quais se avaliassem as percepções, anseios e a composição da cesta de consumo dos torcedores, além das atividades de lazer que concorrem com o futebol.
A análise da cesta de consumo, então, é um fator fundamental, pois se os gastos com lazer correspondem a um percentual irrisório, de pouco adiantará um preço mais baixo, visto que as despesas com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene e transporte já comprometem toda a renda do cidadão.
Evidentemente, o próprio preço do ingresso, se alto, pode fazer com que os gastos com lazer sejam baixos na "cesta", já que nessa situação o consumidor pode preferir direcionar tal quantia para as demais necessidades ou mesmo para outra atividade de lazer mais em conta.
Enfim, existe uma série de variáveis que deve ser considerada no processo de precificação, muitas delas difíceis de serem apuradas, outras de complexa análise e grande parte sem a possibilidade de interferência direta dos responsáveis pela definição do preço.
De qualquer forma, a preocupação sobre o tema é bem-vinda e as discussões a respeito só têm a somar para o desenvolvimento do assunto.