terça-feira, 27 de dezembro de 2022

Copiar e colar

Ao fim de toda Copa do Mundo costumam surgir as teses que determinam as razões das conquistas e dos fracassos. Após o título da Alemanha em 2014, o modelo de futebol no país campeão foi exaltado como a fórmula ideal para o sucesso, curiosamente, nas temporadas seguintes, a seleção alemã nem conseguiu passar da primeira fase. Na Copa de 2018, o modelo francês era o exemplo a ser seguido, mas ainda que tenha chegado à final em 2022, seu time foi derrotado pela Argentina que, por enquanto, vem sendo enaltecida por seus jogadores, todavia, não faltaram elogios ao modelo adotado por Marrocos.
Interessante pensar que um eventual resultado diferente, o que era bastante factível em algumas partidas que foram decididas por detalhes, os discursos dos defensores de alguns modelos estruturados mudariam o foco a favor dos vencedores, mesmo sem uma detalhada análise sobre eles.
Mas estariam errados os que defendem a elaboração e implantação de modelos estruturados no esporte? Óbvio que não! O erro consiste em considerar apenas uma razão tanto para o sucesso quanto para o insucesso, até porque não basta apenas ter um bom desempenho, é preciso superar os adversários, os quais não são impedidos de adotarem os mesmos modelos.
Algo similar acontece no ambiente corporativo, onde surgem frequentemente técnicas “revolucionárias” de gestão, as quais trazem no embalo consultores para auxiliarem a adoção,  além, é claro, de cursos, palestras e  livros a respeito.
Assim como citado no parágrafo referente ao futebol, não se discute aqui a importância de processos estruturados para se atingir objetivos, a tônica da reflexão tem a ver com as conclusões definitivas acerca do que é o mais certo. Nessa busca, desprezam que tão importante quanto os processos são as pessoas, ou seja, se não houver recursos humanos talentosos, os processos não atingem todo seu potencial, sendo a recíproca verdadeira.
Também não se coloca em questão a evolução do esporte e do mercado corporativo de forma geral, o que demanda constante atualização dos processos e requer tempo para se chegar a bons formatos.
Reparem que não fizemos referência ao “melhor formato”, por entendermos que a customização diante dos recursos disponíveis é necessária e, como cada equipe tem características e potenciais diferentes, o melhor para um não significa que seja o melhor para todos.
Diante do exposto, cabem às organizações usarem os cases de sucesso como benchmark, adaptando-os, porém, às próprias características. Constitui-se um enorme erro simplesmente copiar algo que aparentemente dê resultados sem considerar a conjuntura em que se está inserido, seja interna ou externamente.
Não há como negar que é muito mais fácil copiar algo pronto e responsabilizar o acaso, o árbitro, a economia, no caso de empresas, ou qualquer terceiro pelo insucesso, afinal adotaram, em tese, um modelo comprovadamente de sucesso. O problema é que tais modelos não existem, eles são, na melhor das hipóteses, roteiros que auxiliam na reflexão sobre os pontos a serem focados para, a partir daí, avaliar se fazem sentido diante dos recursos disponíveis e cenários.






terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Nossas ofensas

Ainda que não sejam atos que ocorram apenas na Copa do Mundo, algumas manifestações de protesto agressivas ganharam mais evidência função da popularidade do evento.
Refiro-me especificamente às ofensas virtuais que o jogador Neymar recebeu por seu posicionamento político nas últimas eleições e ao ataque verbal sofrido pelo cantor Gilberto Gil que teve como motivação a mesma causa. Vale lembrar que cada um dos citados apoiou um candidato diferente, o que tira de discussão qualquer possibilidade de haver um lado definitivamente certo, caracterizando assim os atos como uma mera manifestação de contrariedade em função de pensamentos divergentes.
Gostar ou não de alguém é direito de todos, ficar chateado por não haver unanimidade e/ou fazer parte da maioria, idem, porém, ofender os que pensam de forma diferente ultrapassa os limites do razoável, além de abrir precedentes que podem chegar a situações incontroláveis.
Por mais que possamos ter convicção que alguém esteja errado, isso para se tornar uma certeza precisaria de trâmites que propiciassem investigações e indagações para se entender as circunstancias, soma-se a isso o fato de não termos a devida capacitação para julgar, tampouco imputar penalidade a quem quer que seja.
Como justificativa para atos dessa espécie, muitos evocam o direito à liberdade de expressão, sonegando que tal liberdade não concede salvo conduto para agressões e demais manifestações de ódio, além do que, esse tipo argumentação só é usado para defender aqueles que agridem seus desafetos, visto que na situação inversa os autores passam a ser taxados como vândalos.
É preciso pontuar que essa tão cantada em verso e prosa “liberdade de expressão” envolve não apenas o direito de se expressar, mas também o dever de respeitar, o que engloba forma, local e hora.
Já imaginaram no ambiente profissional um colaborador mandando outro calar a boca ao invés de pedir a palavra numa reunião, ou xingando, ou postando em redes sociais que deseja o mal de outro porque discorda da opinião desse.
No caso da Copa do Mundo, a situação ganha ainda mais gravidade por ocorrer em um ambiente esportivo, onde, em tese, princípios e valores nobres constituem a essência da atividade.
Por mais que se tenha restrições e diferenças em relação a alguém não se pode fazer justiça pelas próprias mãos. Tal condição se faz verdadeira tanto no âmbito do direito como também a título de autoproteção, afinal, não existe unanimidade na sociedade, ou seja, discordâncias sempre existirão e se forem banalizadas as agressões, a vítima pode ser qualquer um de nós, dependendo apenas do grau de covardia das pessoas.
Todavia, ainda que sejam ações preocupantes, há um lado bom nessa situação, que é a possibilidade de conhecer melhor pessoas cujas afinidades em outros temas nos deixam míopes à percepção de suas índoles.









terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Certeza ou convicção

Pela 5ª vez o sonho do hexa não se concretizou e, assim como ocorreu nas vezes anteriores, a caça aos culpados tornou-se a atividade mais popular por parte dos torcedores e da imprensa esportiva.
“O técnico errou ao estabelecer a ordem dos batedores dos pênaltis, jamais o melhor na função, supostamente o Neymar, deveria ser o último a cobrar”.
“O técnico errou ao não recuar o time para garantir o resultado após ter feito 1 x 0”.
“O técnico errou ao escalar um time todo reserva no jogo contra Camarões, pois o resultado ruim transmitiu confiança aos adversários”.
Mas o que falariam se o Brasil tivesse vencido a partida?
Não podemos ignorar que se o Neymar batesse o primeiro pênalti e errasse, seria bem provável que a confiança dos demais ficaria abalada.
Não podemos ignorar que, ao se jogar recuado, o adversário passa a ser mais ofensivo, o que pode incorrer no vazamento da defesa, ainda que essa esteja mais protegida.
Não podemos ignorar que o ato de poupar jogadores minimiza o risco de contusões e punições disciplinares.
Mas ignoramos isso tudo em nome da caça aos culpados, ou responsáveis, como queiram.
E aqui reside o ponto que pretendo abordar: a prepotência das pessoas em se acharem capacitados em assuntos que necessitam de um conhecimento muito maior do que o que efetivamente possuem, sendo que, mesmo que detivessem todo esse conhecimento, a certeza prévia é impossível por se tratar de uma atividade na qual o imponderável é bastante presente.
O tão criticado técnico, seja ele quem for, acompanha treinos, tem uma equipe que o municia sobre o estado fisiológico e psicológico de cada jogador e consegue ser bem remunerado exercendo tal atividade. Será que nós - sim eu me incluo entre os críticos - sem acompanharmos os treinos, sem informações e sem sermos bem ou nada remunerados em função do futebol, temos como atacar de forma peremptória as decisões do treinador?
A resposta parece fácil: evidente que não, ainda que tenhamos o direito a opinar.
O futebol, no caso, serve apenas como um exemplo para nos fazer refletir o quanto pecamos em outras áreas ao nos apegarmos à busca por se ter razão a qualquer custo, negligenciando que esse tipo de atitude traz consigo um risco enorme à própria credibilidade.
Na vida corporativa, por incrível que possa parecer, é comum ver profissionais criticando decisões em assuntos que julgam conhecer, mas cuja capacitação não passa de mera retórica.
Aliás, até na vida pessoal essa postura se manifesta usualmente. A preferência por ter razão, além de não deixar a pessoa evoluir, já que fica arraigada à sua convicção, ainda faz com que fique evidente sua limitação, insegurança e o pior, que sejam “evitadas” em diálogos, conversas e demais situações de interação, afinal, estarão sempre “certas” ou “sertas”.
Evidentemente que o assunto poderia ser explorado com muito mais exemplos até mesmo em relação à Copa do Mundo, porém, creio que continuaríamos sem poder precisar o que levam as pessoas a transformarem suas convicções em certezas absolutas.












terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Ensaio sobre a isenção

Ainda que as eleições tenham terminado, há muito ainda para se extrair delas no que tange ao entendimento do comportamento das pessoas, tarefa que é fundamental para qualquer boa gestão de marketing.
Nesse artigo falaremos dos chamados “isentões”, eleitores que optaram por votar em branco ou anularam e, diante dessa posição, receberam críticas dos dois lados.
Trazendo para o universo de bens de consumo, imaginem o cliente que chega no supermercado e não encontra a categoria de produto que ele pretende comprar. Exemplificaremos aqui com a carne de frango. O que ele deve fazer? Comprar carne bovina, mesmo sem gostar, comprar camarão, mesmo sendo alérgico, comprar peixe, mesmo sendo mais caro ou comprar carne suína, mesmo não podendo comê-la por causa da religião? Evidentemente que a situação é hipotética e exagerada, mas ilustra eventuais anseios não correspondidos.
Podemos realizar o mesmo exercício com marcas. Nesse cenário o consumidor vai ao estabelecimento varejista para, por exemplo, comprar Coca-Cola Zero em lata. Chegando lá só encontra a versão normal e a Pepsi Zero na embalagem pretendida ou até o próprio produto desejado, porém em embalagem de 2 litros.
E então? Qual a solução? Substituir o produto desejado ou deixar de comprar?
Há a hipótese de mudar de supermercado, é claro!
Evidentemente não há resposta correta! 
O mesmo ocorre nas eleições, se as opções disponíveis vão contra os princípios do eleitor, cabe a ele duas opções: decidir pelo que considera o menos pior ou por nenhuma das opções.
A forma pejorativa com que foi derivada a palavra “isento”, fez com que essa se tornasse uma espécie de “xingamento” utilizado pelos fanáticos que ficaram contrariados por não terem logrado êxito em suas tentativas de convencimento.
Aliás, curiosamente, os chamados “isentões” foram os que menos criticaram os votos alheios, fato proporcionado, provavelmente, pelos valores de respeito ao contraditório, independentemente de qual seja e/ou de quem a profere.
Achar que o consumidor se contenta com qualquer produto - ou qualquer candidato - é um erro crasso, pois, aumenta o risco de proporcionar espaço para que os concorrentes, mais atentos às necessidades dos potenciais clientes, desenvolvam soluções e as deixem disponíveis no mercado.
A verdade é que o marketing mudou.
Na fase que Kotler chamou de Marketing 1.0, as empresas focavam apenas a produção e seus respectivos portfólios. A concorrência era baixa, bastava comunicar e distribuir para vender. 
Depois veio a fase do Marketing 2.0, onde as empresas passaram a se preocupar em identificar as necessidades do consumidor. Todavia, ainda que já estejamos no estágio 5.0, muitas marcas e políticos ainda não se tocaram da evolução mais elementar - do 1.0 para o 2.0 -, e continuam achando que basta comunicar para merecerem a confiança dos consumidores/eleitores. 
Isso talvez explique o sucesso das marcas que acreditam no marketing...e também do número de pessoas que votam no menos pior ou em nenhum deles.