terça-feira, 31 de maio de 2022

Abercrombie & Fitch & Marketing


Aproveitando o lançamento do documentário sobre a Abercrombie & Fitch, utilizaremos esse artigo para analisar a trajetória da marca sob o prisma de marketing.
Inicialmente vale mencionar que a citada marca já chegou a ser um varejista de material esportivo, fruto não apenas do crescimento desse ramo de atividade, como também da sua origem: equipamentos para caça, atividade que muitos consideram esporte, mas, que definitivamente não é, afinal esporte está ligado à vida.
Mas deixemos a história de lado e foquemos no período em que a empresa ficou mais evidente no mercado e proporcionou polêmicas sobre fatos inacreditáveis nos dias de hoje.
Para dar um cunho de marca de luxo, a A&F abolia qualquer tipo de promoção ou de liquidação em suas lojas, de forma que não ocorresse um processo de popularização. Como slogan adotou o “Casual Luxury”.
Ainda como parte do processo, considerado por alguns críticos como “política de exclusão”, a marca só comercializava, por exemplo, roupas femininas até certo tamanho – não havia XL, tampouco XXL.
Dependendo do prisma que se queira observar, a medida pode ser vista como discriminatória ou como parte de uma estratégia de segmentação de mercado, até porque, principalmente em moda, trabalhar com uma grade muito grande de sku’s, implica na necessidade de mais espaço, capital de giro e apurado índice de acerto na previsão de vendas para que não ocorram problemas de inventário, entre outros. Não custa lembrar que há lojas para pessoas com excesso de peso e nem por isso são criticadas, ao contrário, prestam serviços a um público que não encontra grande oferta de produtos. A lista de negócios voltados a “públicos específicos” não é pequena, engloba etnias, idade e até orientação sexual, entre outros. 
O problema no caso da A&F foram as declarações polêmicas do CEO Mike Jeffries, o qual fazia questão de afirmar, entre outras pérolas, que não queria ver mulheres “gordas” vestindo sua marca.
Como parte das medidas relacionadas à estética, a rede adotou uma cartilha relativa à aparência dos colaboradores. Vale lembrar que muitas corporações adotam também dress codes – códigos de vestimenta – que têm como intuito orientar e evitar abusos que possam criar algum tipo de constrangimento no ambiente de trabalho. Nem por isso tais empresas têm maiores problemas judiciais ou mesmo com a opinião pública. 
O erro da A&F nesse aspecto, foi ter discriminado pessoas em função de padrões étnicos e culturais para a formação do seu quadro de colaboradores, o que é inadmissível!
Na verdade, apesar de a marca ter adotado ações dentro de uma estratégia de marketing definida, faltou pensar no “todo”, isto é, como que o conjunto de ações poderia impactar a imagem da Abercombrie & Fitch.
Todas as ações aqui mencionadas, excetuando as contratações baseadas em padrões étnicos, são comuns e fazem sentido, porém, quando somadas  a campanhas publicitárias com dicas sobre sexo nos dormitórios das universidades, ou mesmo receitas para se preparar drinques alcoólicos, a marca estica demais a corda e aumenta o risco de transformar atitudes “discutíveis” em inaceitáveis.
Por falta de espaço, não abordaremos como foi o processo de recuperação, que também foi bastante interessante, mas a reflexão sobre as falhas já nos concedem um bom material para entender a importância de olhar com afinco a integração das iniciativas.








terça-feira, 24 de maio de 2022

Futebol, uma indústria milionária?

 

O futebol é uma indústria milionária! 
Quantas vezes já lemos ou ouvimos essa frase, a qual se reforça em nossa mente ao tomarmos ciência dos salários e bens adquiridos por alguns jogadores.
Não há como negar que as cifras que ganham as manchetes geram grande impacto, até porque para a maioria das pessoas que acompanha o futebol tais valores soam como algo inatingível e longe das respectivas realidades.
Mas será mesmo uma indústria milionária? 
Se formos simplesmente olhar as receitas dos principais clubes poderemos responder afirmativamente ao questionamento, no entanto, se compará-las com algumas empresas, veremos que a discussão pode Se formos simplesmente olhar as receitas dos principais clubes poderemos responder afirmativamente ao questionamento, no entanto, se compará-las com as de algumas grandes empresas, veremos que a discussão pode tomar outro rumo.
Visando buscar uma parametrização no que tange à relação de consumo das marcas por cliente, assim como é no futebol, onde, em tese, cada torcedor tem um único time, utilizaremos como balizador o setor de telefonia móvel, no qual quase toda a população é cliente, no mínimo, de uma operadora. Claro que não se trata de uma comparação perfeita, porém, entre os setores que analisamos em termos de recorrência e acesso às cifras do consumo é o que nos pareceu mais coerente. Não sabemos, por exemplo, quanto uma pessoa consumiu ao longo do ano de cada marca de biscoito, mesmo porque, o produto muitas vezes é consumido por toda a família.
Em nosso exercício, conforme pode ser visto no quadro a seguir, comparamos o clube de maior receita recorrente no Brasil com a operadora de telefonia móvel líder no país.

1 - Dados do site Teleco.com.br
2 - Dados da 26 ª edição do Football Money League - Deloitte  
3 - Valores em euros, convertido com a cotação de 31/mai/23
4 - Dados estimados por pesquisas de mercado
5 - Quantidade de seguidores no Instagram em 14/jun/23

Constatamos assim que a Vivo tem uma quantidade de assinantes que é equivale a 2,3 vezes do que o clube possui de torcedores, porém o faturamento em 2022 foi 28 vezes maior. 
Reiteramos que a comparação tem falhas, visto haver casos de um mesmo cliente ter mais de uma linha, assim como pode estar na relação de torcedores pessoas que mal saibam dizer as cores do time. O que se pretende com o exercício é mostrar os montantes envolvidos, tanto que nem fazemos menção ao EBITDA ou a qualquer outro indicador econômico-financeiro.
Nessa linha, vale inclusive observar que número de seguidores nas redes sociais não apresenta correlação com as receitas, vide no quadro o número de seguidores do Instagram do clube (17,5 milhões) e o da operadora líder (apenas 701 mil).
Visando entender se o cenário detectado seria exclusivo do Brasil, realizamos a mesma análise comparando o Real Madrid - clube com maior receita na Espanha, segundo a 26ª edição do estudo feito pela Deloitte acerca dos clubes que mais faturam no mundo - e a Vodafone na Espanha. Escolhemos essa empresa pelo fato de ela ter o número de assinantes – 13,3 milhões - similar ao de torcedores do time de Madrid, valendo salientar que o clube tem características de uma organização multinacional, vide a quantidade de seguidores, 141 milhões, o triplo da população espanhola. Mesmo diante de tanta pujança, o Real Madrid teve as receitas recorrentes na temporada 2021-21 na ordem de 713,8 milhões de euros, enquanto a operadora de telecomunicação faturou 3,514 bi em 2022 (cinco vezes maior). 
Claro que são valores significativos e que pode evoluir ainda mais, o Real Madrid, por exemplo, cresceu 116% de 2006 a 2019 – expurgamos o período da pandemia e pós por razões óbvias. Mas será que ele pode chegar ao nível dos grandes players de outras indústrias? 
Não creio!
O futebol mexe com paixão, o que por si só tem a capacidade de incentivar atos de consumo por impulso, por outro lado, essa mesma paixão impõe pressões por resultados esportivos de curto prazo, que prejudicam eventuais tentativas de se gerir os clubes como se administra uma corporação, onde marketing, responsabilidade financeira, projetos que não visem simplesmente o imediatismo, compliance e planejamento estratégico, entre outros, são fatores indispensáveis.


ATUALIZADO EM 17/JUN/23





terça-feira, 17 de maio de 2022

A publicidade do Polo

 
Mesmo tendo sido veiculada em junho de 2021, apenas recentemente que a propaganda da Volkswagen do Novo Polo viralizou.  Não há uma explicação segura para a causa do delay, mas é certo que a polarização que tem tomado conta da sociedade - onde as pautas de costumes substituíram os princípios econômicos nas discussões políticas e ideológicas - foi a responsável pela amplificação do tema.
A discussão se a ação em termos de marketing foi certa ou errada fica meio sem sentido, visto não termos ciência acerca das informações que a Volkswagen tem sobre o mercado em que atua, tampouco sobre seus objetivos. Além do que, gestão não é uma ciência exata.
Todavia, a título de provocar reflexões conceituais sobre marketing, tentaremos explorar o assunto confrontando duas visões: a institucional e a de produtos, reiterando que se trata de um mero exercício despretensioso de análise.
Supondo que a estratégia da montadora fosse atrair para o produto anunciado um público de dado segmento do mercado, a medida poderia fazer sentido. Para isso seria mandatório terem feito a mensuração do potencial do público-alvo, estimar eventuais rejeições através de pesquisas e ponderar os efeitos relacionados à canibalização dos demais produtos fabricados pela marca alemã. Sim, conceitualmente falando, há o risco de o veículo ficar tão associado à causa encampada, que os que a ela aderem podem deixar de comprar outros modelos do próprio fabricante. 
Todavia, se a proposta era se mostrar como uma marca “defensora” da diversidade, penso que a iniciativa de associar a causa a um de seus produtos não é a mais apropriada, sendo mais proveitoso para esse fim realizar uma campanha institucional reforçando sua crença nesses valores. Ter um único produto como símbolo de qualquer causa, além de implicar no risco de provocar rejeição entre aqueles que não concordam com a exaltação da mesma, ainda pode, como foi dito acima, canibalizar os demais produtos. 
Como exemplo da estratégia de privilegiar o institucional como ferramenta de defesa de causas, vale citar uma campanha da Avon instituindo o mês violeta, numa forma de representar aqueles que se sentem excluídos das ações relativas ao outubro rosa e ao novembro azul. Em nenhum momento fala de produtos.
Mas não há risco de ações institucionais contaminarem todos os produtos da marca? Não é mais fácil mitigar os riscos quando se envolve apenas um produto?
As dúvidas acima são absolutamente pertinentes, porém, a contaminação dependerá, sobretudo, do grau de associação que se dedique às campanhas. No comercial do Polo, a mensagem remete o novo modelo a “novas experiências” onde um casal gay é protagonista do filme. Nesse caso, se houver algum tipo de rejeição significativa, os ajustes serão mais difíceis em função dos inúmeros elementos de associação. 
Já a campanha da Avon conseguiu demonstrar respeito e apoio à inclusão sem que isso se torne o único mote da marca, o que faz com que  eventuais necessidades de ajustes demandem menos investimentos.
Chamamos a atenção, no entanto, que a discussão apresentada focou basicamente a publicidade em torno das marcas, ignorando de forma proposital – e errada – que as decisões de consumo dependem também de precificação, distribuição e qualidade do produto.





terça-feira, 10 de maio de 2022

Os sanduíches e as fake news

 
Após inúmeras reclamações de órgãos como Ministério Público, CONAR e PROCON, o McDonald’s tomou a decisão de suspender as vendas do seu sanduíche chamado McPicanha, pois o mesmo não trazia picanha na sua composição, e sim o molho com sabor relacionado ao produto.
Como a própria cadeia de fast food já admitiu o erro, não cabe aqui nenhum tipo de discussão sobre a suspensão da campanha, todavia, o lançamento do sanduíche é um bom tema para ser abordado.
A propósito, vale acrescentar que seu arquirrival, o Burger King, incorreu no mesmo tipo de erro com o seu sanduíche Whooper Costela que, ao contrário do que o nome induz, não traz tal tipo de carne em sua receita.
O que passa pela cabeça dos gestores de marketing dessas redes de lanchonetes? 
Será que acham que a nomenclatura é suficiente para se desenvolver um produto? Será que não ponderam que ao desvirtuarem o conceito do produto correm o risco de contaminar os demais sanduíches? Aliás, será que o McFish é mesmo de peixe? E o Chicken Crisp é efetivamente de frango?
Temo, sinceramente, que a cultura das fake news possa estar se alastrando para as corporações. 
E por favor não venham com argumentos do tipo: o que é uma informação falsa? Todo mundo age assim! E a liberdade de expressão?
O caso pede seriedade e merece ser observado por dois prismas: 
- o primeiro em relação ao poder das redes sociais que reverberaram um caso que, quem sabe, pode já ter acontecido e ignorado inúmeras vezes com diversas outras empresas no passado . É ótimo saber que a população está vigilante e pronta a questionar de forma massiva eventuais desconfianças, porém, por outro lado, há também o risco de uma mentira ser fortemente divulgada e não haver um órgão de arbitragem ágil e confiável que venha restabelecer e dar publicidade à verdade a tempo. Se no caso do Mc Donald’s o produto contivesse realmente picanha, quem arcaria com os prejuízos que o levantamento da questão teria causado?
- o segundo quanto à tese frequentemente discutida nesse blog de que o marketing está sendo desvirtuado e virando muitas vezes sinônimo de mentira.
Para explicitar este último ponto, podemos resgatar a campanha do refrigerante Fys, que teve como mote o fato de o produto ter 50% menos açúcar e menos marketing, relegando implicitamente o marketing a algo nocivo. Na verdade, a coisa funciona ao contrário, um produto com pouco marketing está fadado também a pouco sucesso. 
Não custa resgatar o caso que foi narrado em outro artigo aqui do blog acerca de uma entrevista na revista Exame, onde o jornalista fez a seguinte pergunta ao economista Pavan Sukhdev: a movimentação do mercado financeiro em direção à economia verde é verdadeira ou marketing? 
Sim, para tal repórter, e muitas outras pessoas, o antônimo de verdade é marketing, pasmem!
Aonde as mentiras irão parar é difícil prever, até porque muitos mentirosos fazem uso da alegada liberdade de expressão para lançarem inverdades ao vento e/ou justificam que as fake news fazem parte da vida deles. Por sua vez, os “marqueteiros”, profissão que foi criada pelos que atuam em marketing e sequer sabem o que é marketing, desenvolvem suas campanhas abusando das narrativas, palavra que virou modinha e que acabou virando sinônimo de versão conveniente para se aplicar em uma situação inconveniente. 
Diante desse quadro, penso que a tendência é que as mentiras aumentem, porém com algum nome mais pomposo. Uma pena, seria ótimo poder terminar esse artigo parafraseando o refrigerante Fys, prevendo um futuro com 50% menos mentiras.






terça-feira, 3 de maio de 2022

Em busca da fama

O presente texto estava escrito desde o início do Big Brother Brasil 22, mais precisamente após a confirmação da participação do atleta Paulo André, um dos velocistas mais talentosos que o Brasil já teve.
O tempo foi passando, o corredor foi ficando, até que alcançou a final, mas não ganhou o prêmio máximo de R$ 1,5 milhão, o qual, talvez, compensasse o período em que ficou sem treinar e teve a preparação como atleta prejudicada.
Ah, mas ele ficou famoso. É verdade! Baseado no histórico de outros participantes, vale indagar: quantos mantiveram a fama por tempo suficiente para remunerá-los através de presenças em eventos ou mesmo de publicidade? Aliás, até que ponto, a presença nas atividades citadas acima não irá prejudicar ainda mais o treinamento? Não custa lembrar que treinamento não se resume às sessões da prática da modalidade, mas também à alimentação e ao descanso.
Ah, mas ele aumentou o número de seguidores nas redes sociais, fato que nunca aconteceria se não tivesse participado do programa. E daí? Número de seguidores paga as contas? Pode até ser que em um primeiro momento algumas despesas venham a ser amortizadas em razão das permutas e de posts publicitários, mas por quanto tempo?
Ah, mas como atleta ninguém pode garantir que ele teria sucesso, afinal poderia se contundir. É verdade, mas antes de proferir tal alegação seria seguro tentar confrontar o percentual de atletas talentosos que tiveram as respectivas carreiras prejudicas por problemas médicos contra os que tiveram como causas a pouca dedicação ao esporte. É bem provável que desistam de sustentar tal argumento.
Por mais que o texto tenha como tônica a crítica em relação à decisão do rapaz e/ou de seus gestores de carreira, temos que entender dois pontos cruciais: (i) que é muito difícil podar um jovem da possibilidade de pegar “atalhos” para alcançar seus objetivos, sendo a fama e a grana parte deles; (ii)  que as modalidades olímpicas brasileiras têm sua percepção de atratividade claramente em desvantagem quando comparadas com programas de televisão. “Ser artista” aparenta ser mais interessante do que “ser atleta”. 
Quanto ao primeiro ponto não cabe discussão, apenas uma boa educação familiar é capaz de mitigar tais ímpetos. Já o segundo nos coloca diante de um bom tema para reflexão e também de um desafio para os gestores que atuam nas áreas de marketing do esporte: como incorporar atributos que coloquem o esporte em clara vantagem competitiva quando comparado com outras atividades? 
Melhor remuneração é, sem dúvida, uma das formas, mas como dinheiro não dá em árvore é necessário elaborar um trabalho que atraia patrocinadores para o esporte – e não apenas seguidores -, o marketing não pode ser visto como um mero instrumento para a caça de curtidas e de “followers”. Posicionar as devidas modalidades e o esporte de forma geral também é fundamental, fortalecer os nobres atributos que a atividade tem como formador de pessoas no que tange a princípios e valores precisa ser trabalhado a ponto de a família preferir sonhar para seus filhos uma vida majoritariamente saudável, onde os méritos sejam recompensa da dedicação, do que uma regada a ócio, festas e  bebidas. Observem que não se preconiza aqui o radicalismo, até porque os momentos de lazer são primordiais para “alimentar” a disciplina.
O fato ocorrido com o Paulo André não é inédito, ele ocorre frequentemente, só que sem a mesma divulgação/repercussão, pois, poucos atletas têm tamanho potencial e o programa de TV que ele participou possui características diametralmente opostas às do esporte.