terça-feira, 15 de julho de 2025

Enhanced Games...ou Ashamed

Alguém já ouviu falar dos Enhanced Games? Provavelmente poucos, mas em breve o evento se tornará mais popular e com direito a extensos debates calorosos.
Numa tradução livre, “enhanced” se refere a algo “aprimorado”, expressão que no meu modo de ver, seria descabida para o evento, uma competição, na qual se permite o uso de quaisquer substâncias que venham a melhorar a performance dos participantes, ou seja, além de eventuais equipamentos proibidos nas demais competições, o doping estará liberado.
Os defensores da iniciativa alegam se tratar de uma forma de valorizar a ciência e a tecnologia, afinal, trabalham, segundo eles, a melhoria humana. Alguns chegam a fazer uma analogia à Fórmula 1, alegando que os avanços automobilísticos têm parte de sua origem nessa competição.
Aqui, já poderíamos rechaçar o argumento ressaltando que estamos lidando com vidas humanas e não com máquinas, o que poderia receber como tréplica o discurso de que o esporte de alto rendimento também traz problemas.
Adiciona-se aos argumentos pró-dopagem, a tão propagada liberdade individual que, nesse caso, proporcionaria o direito à decisão sobre os recursos a serem utilizados nas competições. Ignoram que o caráter individual jamais pode se sobrepor ao da coletividade, a qual, por sua vez, é ditada por determinações regulatória.
Veladamente, também dão a entender que a possibilidade de falha nos controles antidopagem deixaria mais justa a “liberação” das substâncias e demais subterfúgios tecnológicos. Seria algo, guardando as devidas proporções, como liberar assaltos e assassinatos, já que a polícia não consegue pegar todos os criminosos.
E, tão grave quanto, não consideram que o acesso a tecnologias será sempre desigual.
Por mais que eu me esforce para tentar entender alguns argumentos dos defensores dessa iniciativa, não há como não se posicionar contra, visto que ela contraria os princípios éticos que fazem parte da essência do esporte.
Pelo ponto de vista do marketing, também encontramos posições antagônicas. Enquanto uns defenderão que se trata de uma excelente oportunidade para as marcas que desejam se associar à inovação e tecnologia, outros sustentarão, e com razão, que as marcas devem focar no ser humano para serem admiradas - vide Kotler em seu livro Marketing 3.0.
Embora a "boa performance" seja, de fato, um atributo de alto cunho aspiracional, a forma como ela é atingida pode trazer severos danos à imagem das marcas que venham a tolerar e/ou mesmo pactuar com práticas cristalizadas como maléficas no meio esportivo. Ilustra essa condição, os contratos de patrocínio, nos quais tais atitudes são passíveis de rescisões automáticas.
Ainda sob a ótica de marketing, vale destacar o aspecto da segmentação, salutar para processos de extensão de linhas e de marcas de produtos, pois passa a atender públicos com necessidades específicas e que poderia servir para justificar tais competições como alternativa ao convencional, afinal, no próprio esporte encontramos esse processo no que tange a gêneros e até em faixas etárias nas competições de cunho participativo. 
Todavia, há que se tomar cuidado para que uma grande quantidade de opções não venha causar incômodos ao potencial consumidor, dito isso, concluo que até sob o prisma de marketing, os Enhanced Games nada têm a agregar ao esporte, já repleto de conteúdo e, infelizmente, de pessoas que não o entendem em sua plenitude.



terça-feira, 8 de julho de 2025

Loja Teatro

Quem já ouviu falar em Loja Teatro? Poucos, acredito! 
A expressão, que pode ser que nem pegue, tem sido utilizada para se referir aos estabelecimentos varejistas que deixam visível o processo de produção, dando ares de um verdadeiro show, fazendo com que a experiência de compra – outro termo bastante em voga – proporcione a percepção de envolvimento similar ao de apresentações teatrais.
Gostaram da analogia? 
Além de estimular mais fatores sensoriais, a transparência do processo agrega confiança e, consequentemente, valor aos produtos. 
O provável maior engajamento emocional, por sua vez, fortalece a conexão com a marca, e a sensação de autenticidade contribui para os processos de posicionamento.
Até no que tange à comunicação, a iniciativa traz benefícios, pois, além da propagação natural de algo supostamente inédito, gera conteúdo para as redes sociais graças ao lado “instagramável” do processo. Não faltam posts e testemunhais de micro influenciadores espontâneos.
Obviamente que a preocupação com a estética e higiene deve ser redobrada, para que a máxima “quem conhece cozinha de restaurante, não come” não interfira negativamente no consumo.
Atualmente, não são muitos os estabelecimentos que adotam o conceito, ainda que existam restaurantes com a cozinha acessível à visão por vidros e haja unidades do Starbucks Reserve e da Lindt, para citar algumas marcas, onde se encontram ações similares. 
É fato que a busca por oferecer uma experiência diferente ao cliente está cada vez mais intensa em função da competição pela atenção, o que nos leva a acreditar que esse tipo de iniciativa pode vir a se tornar mais frequente. O cuidado deve se dar na operação, visto que algumas “produções” podem não ser tão “estéticas”. 
Deve também ser avaliado se as obras necessárias à transparência não podem de alguma forma “tirar” espaço da área de vendas e se o investimento será remunerado.
No Brasil, o exemplo mais emblemático talvez venha ser o da Krispy Kreme, uma cadeia especializada em donuts, que está entrando em operação por aqui.
Presente em mais de 30 países, a Krispy Kreme, atua no país através de uma joint-venture com a am pm - lojas de conveniência operada no Brasil pela Ipiranga - e inaugurará uma loja em São Paulo com a capacidade de produzir 50 mil donuts por dia diante dos clientes.
Se o conceito vingará, tendo a apostar que sim, mas, tal qual uma peça de teatro, teremos que esperar os próximos atos.

 





terça-feira, 1 de julho de 2025

Maratona do Rio - lealdade inercial

Realizada na semana retrasada, a Maratona do Rio de 2025 pode ser considerada um sucesso em termos de número de participantes – 50 mil inscritos – até então o recorde pertencia à edição de 2024 com 45 mil. Vale informar que essa quantidade abrange os participantes de todas as distâncias que constavam do evento: 5 km, 10 km, Meia Maratona e Maratona. Ainda assim, um feito bem legal, que mostra como as corridas de rua vêm ganhando adeptos na sociedade. 
Mas o que quero trazer para o debate é a influência do efeito manada, responsável não só por fazer as pessoas aderirem à atividade e competirem nela, mas também por fomentar a participação de muitos nas críticas a respeito, dentre as quais, destacamos:
"Houve falta de medalhas para os que concluíram a prova de 5 km". Fato! Trata-se de uma situação que não deveria acontecer, afinal as medalhas faziam parte do pacote anunciado. A razão alegada para explicar a “ruptura” teve como alvo os corredores que participaram da prova sem estarem inscritos. Entendida a causa, cabe a réplica de que se trata de uma situação usual, esperada e que envolve fatores estruturais da sociedade, portanto, contingencialmente deveria ter havido uma fiscalização mais apurada e, até um estoque maior de medalhas, embora ache essa última solução muito condescendente.
“O kit não era farto”, também esteve entre os tópicos de insatisfação. Para os que não acompanham a modalidade, esclareço que “kit” é o conjunto de itens recebidos pelos inscritos antes da prova. Nele constam obrigatoriamente o número que o corredor ostentará na competição e o chip para controle do resultado. Muitas provas adicionam outros “mimos”, que nada mais são do que samples (amostras) fornecidos pelos patrocinadores e apoiadores. Legal, né? Sem dúvida, porém, da mesma forma que a medalha está contemplada na proposta de valor da inscrição, o kit farto não está. Portanto, ainda que frustre expectativas e seja relativamente fácil de resolver, não creio se tratar de um grande problema, já as críticas em relação às filas enormes para retirada dos kits fazem total sentido.
Aspectos técnicos como a largada em ondas também entraram no muro das lamentações. Provavelmente, fruto do desconhecimento do fato de que a largura das pistas é uma variável que faz com que todas as grandes maratonas do mundo adotem essa medida. Por outro lado, faço coro aos que protestaram contra a inclusão de uma onda localizada logo atrás dos corredores de elite, cujas vagas eram comercializadas. Nada contra a monetização do evento, todavia, essa não pode interferir na essência do esporte e na performance daqueles que buscam a participação também com esse fim.
Pode melhorar? Claro que sim, mas não custa lembrar que num passado não muito distante, as medalhas eram apenas para os vencedores, o kit vinha apenas com o número e quatro alfinetes para afixá-lo e mal havia postos de hidratação durante o percurso.
Ah, também não existiam as redes sociais para conduzir manadas, tampouco para facilitar o surgimento de “líderes de causa” sem o mínimo conhecimento do que se propõem a escrever.
Ainda sobre a Maratona do Rio, além das críticas que se multiplicam, ainda vimos “especialistas em marketing”, vaticinando que, diante dos problemas ocorridos, o “cliente” pode não querer mais participar do evento. Situação que, de fato, pode até ocorrer quando se trata de mercados sem barreiras de troca (bens de consumo, por exemplo), todavia, no caso da Maratona do Rio, há que se considerar o conceito que chamamos em marketing de “lealdade inercial”, no qual a fidelidade não advém de um vínculo emocional forte, mas da inércia comportamental, que mitiga as eventuais motivações para troca, mesmo diante de experiências negativas num primeiro momento. Ela ocorre quando o consumidor continua comprando por hábito, conveniência ou falta de motivação para mudar, mesmo após experiências negativas, o que acredito ser o caso...por ora.













 

terça-feira, 17 de junho de 2025

Igual, mas diferente


Inovação talvez seja a palavra mais em voga no mercado corporativo, a ponto de muitas empresas terem incluído essa área no seu organograma.
Há, no entanto, que se atentar para o fato de que a área não tem, ou não deveria ter, um viés estritamente tecnológico, até porque, esse foco acaba sendo atendido pela tradicional área de R&D ou Pesquisa e Desenvolvimento.
Assim, vejo a “inovação” como uma disciplina associada à geração de ideias e desenvolvimento de soluções tendo como norte o mercado, de forma a buscar oportunidades.
Ilustro essa visão através de dois cases: o da Juul e o da Jolie  Quem? Respondo a seguir.
A Juul é uma empresa de cigarros eletrônicos, fundada em 2015 por dois estudantes de Stanford, que se tornou sucesso em curto espaço tempo. 
A categoria de produto em si é relativamente recente. Consta que os primeiros cigarros eletrônicos começaram a ser comercializados em 2003, mas a inovação que chamo atenção se refere à forma como a Juul se posicionou.
Similar a uma empresa de tecnologia e com design que reforça essa imagem, a empresa lançou também cápsulas com sabores sofisticados, distribuindo-as não apenas nos canais tradicionais de fumo. O preço, bem acima do praticado pela concorrência, também auxiliou o processo.
Embora tenha obtido um enorme sucesso, deve ser ressaltado que a FDA acabou intervindo em função do crescimento de consumo do produto junto aos adolescentes, alegando que a empresa não tomou as devidas precauções para evitar essa situação.
Já a Jolie é uma marca de chuveiro que, para se diferenciar dos concorrentes, se posiciona como um produto de beleza. Estranho, né?
Pois bem, pelo fato de a água conter cloro e metais pesados, o que, consequentemente, pode causar problemas na pele e no cabelo, a Jolie Skin Co. desenvolveu um modelo de chuveiro com um filtro substituível que elimina as citadas impurezas, propiciando benefícios, segundo a empresa, que vão desde a redução de queda de cabelos à diminuição de acnes.
Com um modelo de negócios, cuja aquisição pode se dar individualmente ou através de assinatura, a empresa também focou no design elegante e na instalação simplificada, fazendo com que em menos de um ano a empresa se tornasse lucrativa.
Tais exemplos ilustram a conclusão de que as áreas de inovação precisam manter estreito relacionamento com o marketing e com pesquisa e desenvolvimento, além do comercial.
No case do chuveiro, a situação se torna ainda mais interessante, pois o produto pode estar no pdv - ponto de vendas - junto aos tradicionais concorrentes, evidentemente destacando-se pelo posicionamento a ser explorado por ações de trade, ou até mesmo em áreas e canais diferentes do usual dessa categoria.









Subiu à cabeça

 
O esporte de alto rendimento, talvez por ser uma atividade praticada eminentemente pelos mais novos, costuma nos brindar com inúmeros casos de atletas talentosos que, ao alcançarem resultados expressivos, passam a ter comportamentos bem detestáveis no que tange ao tratamento concedido a colegas, imprensa, adversários e até amigos. Nessas horas, a expressão de que o "sucesso subiu à cabeça" se faz presente na maioria das vezes.
Creditar tal postura à imaturidade, ainda que não justifique, é bastante razoável. O tempo, na verdade, tratará de separar o joio do trigo, ou melhor, os bobalhões natos dos deslumbrados momentâneos.
A notícia ruim advém da constatação de que o mesmo comportamento deplorável ocorre no que tange à gestão, onde encontramos pessoas que, ao atingirem certos cargos, mudam completamente de postura e passam a dedicar tratamentos similares aos dos jovens talentos que fiz referência no primeiro parágrafo.
A diferença entre os dois casos – atletas jovens e executivos mais maduros - se deve primordialmente a um ponto: os atletas são providos de talento, enquanto os “executivos”, se é que assim podem ser chamados, não, o que faz com que a insegurança e a incapacidade tenham a empáfia e a pouca educação como cortina, de fumaça, é claro.
Já a notícia boa surge do processo de propagação rápida do veredito de que o cargo “subiu à cabeça”, o que deixa o futuro do profissional incerto - na verdade, certo - e o desencantamento irreversível.
Para não generalizar, cumpre relatar que no meio corporativo há inúmeros executivos competentes e com comportamentos pouco amigáveis, no entanto, os que são realmente capazes, sempre se portam dessa forma, isto é, iniciam a vida profissional da mesma maneira com que chegaram ao topo, aliás, muitos até melhoram com o poder.
A crítica assim vai para os que, em situações nas quais precisam de ajuda, são pessoas afáveis, bajuladoras e disponíveis, mas quando são alçados a posições de maior responsabilidade se colocam em pedestais.
Os sinais são claros, vão desde uma maior dificuldade para se manter contato até a efetiva falta de um retorno de mensagem.
O mais curioso dessa situação é perceber que CEOs de empresas com EBTIDAs superiores a R$ 10 bilhões retornam contatos, enquanto executivos chinfrins de instituições infinitamente menores, ignoram.  
Minha dúvida não paira sobre a longevidade corporativa de tais profissionais, há sempre uma organização incauta em relação aos soft skills, mas, sim, em quanto é a participação da educação e do caráter, ou melhor, da falta desses, na formação do perfil/comportamento dos executivos que “se acham”.
Talvez a falta de caráter não tenha permitido assimilar a educação supostamente recebida, visto a cegueira em relação às relações interpessoais e o foco em crescer a qualquer custo. Só lamento informar, ou não, que o qualquer custo, pode ser muito alto.