terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Exagerado

 

A cruzada de explicar o que efetivamente vem a ser marketing é cansativa e, provavelmente, inglória.
Além do desconhecimento dos “potenciais” clientes dos serviços de marketing que, na maioria das vezes os contratam para fins meramente de comunicação, há os “fornecedores” que contribuem para o processo de desinformação.
No início do ano, foi noticiada a morte do Duo, mascote que dá nome à plataforma Duolingo de ensino de idiomas. A ideia central era anunciar o encerramento das atividades da marca e criar comoção nas redes sociais. No marketing, as ações deste tipo criadas para despertar a atenção da mídia são conhecidas como Public Relations Stunt, ou simplesmente, Stunt.
Na semana passada, a Canva - plataforma online de design e comunicação - lançou os Gracyovos, uma linha de ovos, que tinha como protagonista, a influenciadora Gracyanne Barbosa, contumaz consumidora de grandes quantidades deste alimento.
A estética da embalagem, a identidade visual e a narrativa de luxo, aliadas à nutrição e fitness também chamaram a atenção ao ilustrar o poder da criação, do design e do storytelling, justamente as atividades principais da Canva.
Sobre a criatividade das campanhas, particularmente, não gostei da utilização da “morte”, mesmo sendo de um personagem, embora muitas pessoas tenham elogiado o enredo. Já a utilização do humor no caso da Canva com seus Gracyovos, me pareceu mais leve e divertida. Questão de gosto.
Mas o que tais campanhas têm em comum?
Ambas eram sustentadas pelo uso do exagero como ferramenta de engajamento, o qual, de fato, foi acima do usual.
Mas será que se trata de uma estratégia eficaz? 
Mesmo antevendo eventuais discordâncias, ainda mais num momento em que fake news são toleradas se forem usadas contra “inimigos”, declaro que não considero interessante. Aqui não é questão de gosto...
Pelo prisma mercadológico, vejo as ações adequadas para provocarem picos de atenção, todavia, carecem de profundidade estratégica que é a essência do marketing. Além disso, envolvem sérios riscos à reputação, pois, podem minar a credibilidade das mensagens e fazer com que o público passe a considerar a hipótese de “pegadinhas” nas próximas ações.
É preciso ter em mente que alcance não necessariamente se transforma em geração de valor, tampouco fidelizam o consumidor.
Penso ainda que uma comunicação baseada em estímulos artificiais sem proposta clara de valor está totalmente desalinhada dos princípios de branding: valorização da  autenticidade e do propósito.
No artigo, optei por considerar que as campanhas mencionadas tinham como base o exagero, enquanto outros preferem considerá-las desinformativas e até mesmo mentirosas. Talvez tenham razão.
Neste caso, o marketing fica ainda mais vulnerável, visto corroborar para a falsa interpretação de que fazer marketing é enganar.

terça-feira, 25 de novembro de 2025

C de...confuso

Quando vamos soletrar um vocábulo, costumamos utilizar alguma palavra para representar uma letra e evitar eventuais confusões sonoras, algo do tipo N de navio, C de casa.
No jargão mais técnico, dá-se o nome a esse sistema de Alfabeto Fonético de Comunicação, o qual é usado em comunicações de aviação e algumas outras.
Sem dúvida, uma maneira interessante de dirimir dúvidas e padronizar a comunicação.
A adoção de algo similar no meio corporativo seria extremamente benéfico, tamanha a profusão de letras que acompanham o C, não mais de Charlie, mas de Chief para fazer referência aos C-levels.
O advento dos C-levels teve seu início entre as décadas de 60 e 70, como forma de estabelecer responsabilidades às lideranças em substituição às denominações de Presidente, Vice-Presidente e Diretor. Nessa época, a utilização era bem restrita e se resumia basicamente a CEO (Chief Executive Officer), CFO para cuidar das Finanças e COO para operações, ainda assim, não eram muitas as empresas que as adotavam.
Nos anos 80 e 90, com o boom da globalização, mais Cs foram incorporados, os CMOs (Marketing) e CIOs (Information) se juntaram aos Cs mencionados acima. 
A partir dos anos 2000, a situação passou a sair um pouco do controle. O C de Chief se consolidou, assim como o O de Officer, porém o "miolo" ficou confuso.
Neste "festival" incluem-se as derivações para quatro letras, como a que acontece com o CAIO (Artificial Intelligence),  com o CISO (Information Security) e com o CHRO (Human Resources), sendo que essa última recebe em algumas empresas a denominação de CPO (People). Qual usar?
Mas as confusões não param por aí. 
As tentativas de adivinhar o que cada letra significa ficam bem mais difíceis quando nos deparamos com vários significados diferentes para uma mesma sequencia de letras. 
O "CCO", pode ser usado para Commercial, Compliance, Culture... O "CSO" para Strategy ou Sustainability, assim como o "CIO" pode servir para Information (TI) ou Inovation.
Não sei se por uma questão de modismo ou para mostrar criatividade, é possível também encontrar o CLO  - Chief Listening Officer, cuja função é monitorar o que está sendo dito sobre a empresa nas redes sociais, fóruns, mídia etc. Guardadas as devidas proporções, um ombudsman com três letras. Valendo citar aqui que o CLO é usado em algumas empresas para nominar o líder da área jurídica - CLO (Chief Legal Officer).
Nessa mesma linha criativa, nos deparamos com o CBO – Chief Belief Officer, que visa manter os colaboradores motivados, espiritualmente equilibrados e alinhados com os valores da empresa, algo similar ao CHO (Happiness) e ao CJO (Joy).  
Para não deixar o artigo ainda mais extenso, finalizamos com o CCO – Chief Cannabis Officer – mais um C para concorrer com os citados anteriormente – que lidera a área de estratégia e regulamentação de algumas empresas no setor de cannabis medicinal.
De fato, não há limites para a criatividade, ela só necessita considerar que o alfabeto é limitado e que a boa comunicação precisa ser clara, direta e objetiva. CDO?
Não resisti.




terça-feira, 18 de novembro de 2025

Cartão amarelo para o silêncio

Um dos assuntos mais comentados na semana passada foi o julgamento de um jogador do Flamengo, que tinha sido acusado de receber de forma proposital um cartão amarelo para beneficiar parentes e amigos que apostaram no ato.
A punição decidida pelo STJD – Supremo Tribunal de Justiça Desportiva - estabeleceu uma multa de R$ 100 mil ao jogador, definição que provocou inúmeras discussões envolvendo tanto a integridade dos auditores como até um suposto favorecimento por se tratar de um time com grande número de torcedores. Nos debates não faltaram comparações com casos similares, cujas penas foram bem mais pesadas.
Entrar na seara jurídica me parece um pouco inconsequente para quem não leu os autos e/ou não tenha embasamento jurídico para entender e interpretar artigos, jurisprudências etc., porém, como quase tudo hoje em dia se ampara na necessidade de opinar e engajar, não faltaram posts e reposts sobre o caso, independentemente do conhecimento necessário a respeito. 
Curiosamente, pouco se comentou sobre a postura do clube que não externou nenhum tipo de indignação com a postura do jogador. 
Deixa pra lá, vamos falar de marketing, mais precisamente de reputação, atributo vital para o fortalecimento e valorização das marcas.
Inicialmente, vale comentar que ó fato de clubes serem patrocinados por bets faz com que a relação entre as partes já seja bastante sensível pelo ponto de vista reputacional. Ok, entendo que os valores aportados são fundamentais para a gestão dos clubes, mas o registro se faz necessário.
As casas de apostas, por mais que estejam trabalhando atributos e features para se posicionarem no mercado, não podem jamais negligenciar seu principal ativo: a integridade esportiva, de modo que as iniciativas de prevenção e combate contra qualquer espécie de manipulação são cruciais para a marca ser percebida como virtuosa.
Uma simples associação do jogador com a marca tem o poder de levantar questionamentos que, se bem aproveitadas pela concorrência, causam danos, afinal, o patrocinador exerce o papel de um parceiro institucional e, em tese, compartilha dos mesmos princípios e valores.
Mas a marca tem alguma culpa do ocorrido? Sou capaz de apostar que não. Tampouco, o clube pode ser acusado de qualquer tipo de cumplicidade no ato, ainda que não tenha punido exemplarmente o jogador.
Deveria a marca romper o patrocínio? Também creio que não, embora caiba ao patrocinador uma avaliação, na qual se pondere se o retorno do investimento em termos comerciais e de awareness compensa o risco de ficar associado a eventuais falhas na questão da manipulação.
A propósito, a marca foi uma das que denunciaram o volume anormal de apostas no caso em questão, sendo que na época ela não patrocinava o clube.
O que fazer? Bem, fazendo a tradicional ressalva de que gestão não é uma ciência exata, arrisco-me a opinar que o mais adequado seria ter havido a divulgação de uma nota logo após o julgamento, reafirmando o compromisso com a integridade e enfatizando a eficácia dos seus sistemas de monitoramento.
Ainda que se tome o máximo de cuidado para a mensagem não atacar o clube, nem minimizar o problema, reconheço que pode haver ruídos. Porém, o silêncio, ainda mais numa fase em que a categoria “apostas” está construindo sua imagem, pode causar problemas seríssimos e legitimar as pressões dos demais setores para a adoção de restrições. 





terça-feira, 11 de novembro de 2025

Guia Michelin...de marketing

Quando o marketing "nasceu"?
A data formal de sua origem não é precisa, alguns defendem que nos primórdios da civilização e que em textos bíblicos já era possível ver traços da disciplina. Aqueles que acreditam que o marketing se resume à comunicação, evocam Gutemberg, pois, graças à prensa topográfica foi possível massificar a impressão de textos.
As versões, como podemos ver, são variadas, particularmente, estou mais alinhado com os que acreditam que o surgimento se deu na década de 1940, após a 2ª guerra, todavia, chamo a atenção para o lado intuitivo que permite a adoção do marketing, mesmo sem a formalização do termo. 
Um excelente exemplo acerca da adoção dos conceitos de maneira, digamos, espontânea, aconteceu com a Michelin, fabricante francesa de pneus.
Em 1900, os fundadores da empresa criaram o Guia Michelin, o qual trazia mapas e informações úteis para quem quisesse viajar, tais como oficinas, postos de abastecimento, hotéis e restaurantes.
Distribuído inicialmente de forma gratuita, a ação tinha como objetivo incentivar o ato de viajar e, assim, gerar um maior desgaste dos pneus para que eles precisassem ser trocados, aumentando, consequentemente, a recorrência de compras junto à Michelin.
Sob o prisma do marketing, podemos dizer que a Michelin conseguiu com a ação criar valor para seu público-alvo, incentivou o uso do carro e a demanda por pneus, além de ter estabelecido uma conexão emocional com o consumidor.
A evolução para a gastronomia teve o mérito de posicionar a marca como referência em excelência ao se associar à qualidade e sofisticação.
Ter estrela Michelin virou meta para chefs e restaurantes, não apenas pela certificação de virtude gastronômica como também pelo status, atributos importantes para a atrair clientes.
Esse tipo de ação retrata perfeitamente os mais puros conceitos de marketing ao “não vender nada” de forma direta, mas gerando valor para a marca. 
Obviamente, toda a estratégia descrita pouco agregará caso a distribuição dos produtos não seja satisfatória e/ou se o preço não estiver alinhado ao mercado, tampouco se ficar restrita a uma única ação.
Guardadas as devidas proporções, podemos encontrar em outras categorias, certamente com menos sucesso, iniciativas em que o incentivo ao consumo não se dá por via direta. 
A Lego, ao produzir animação de filme para o cinema, faz com que as crianças demandem brinquedos inspiradas no que viram.
A John Deere, fabricante de máquinas agrícolas, publica conteúdos sobre técnicas de agricultura, os quais, além de educarem o público-alvo, o fideliza. A própria Red Bull, com seus patrocínios a esportes radicais, fortalece a associação à energia, que é o que seu produto oferece.
Certamente há muitas outras, porém, bem menos do que o marketing pode proporcionar. 







terça-feira, 4 de novembro de 2025

Cuidado com a manada digital

Creio não haver dúvida quanto à eficácia das ferramentas digitais, o que não significa dizer que devam ser encaradas como a solução perfeita para qualquer tipo de negócio, tampouco de que os casos de sucesso que aparecem a todo instante são realidades extensivas a todos.
Essa introdução se faz necessária diante do crescente número de pessoas, principalmente profissionais liberais ou cidadãos comuns, que ao se depararem com o suposto sucesso de alguns dos seus “seguidos”, passam a acreditar que poderiam estar no lugar deles e/ou que mudarão de patamar financeiro ao dedicarem mais atenção ao digital.
Inicialmente, é importante lembrar que, mesmo reconhecendo a utilidade das ferramentas, são raros os casos de produtos ruins que se transformam em bons, além do que, replicar a mesma forma para realidades diferentes é um erro dos mais infantis que se pode cometer.
Ainda assim, vez por outra, nos deparamos com profissionais que passam a ponderar a contratação dos serviços de especialistas em “marketing digital”, porém, quando questionados a respeito do objetivo para a iniciativa, grande parte dos profissionais demandantes se vê sem respostas ou cita algum exemplo desconexo à sua realidade.
Apliquemos o exercício, a título de exemplo, aos médicos. O que eles podem vir a querer ao contratar o serviço dos profissionais citados no parágrafo anterior? Aumentar o número de clientes? Sim, óbvio, mas, será que pararam para pensar ou mesmo quantificar a capacidade ociosa nesse momento? Será que o objetivado incremento não redundará em filas de espera ou mesmo em um atendimento mais rápido do que o usual, o qual, talvez, tenha sido a característica que o levou a ter conquistado a clientela atual? Será que não trarão um outro tipo de público? Será que esse maior fluxo não contaminará o “posicionamento” que construiu, ainda que empiricamente?
Óbvio que estar em pontos de contatos digitais auxilia na “construção” da marca, afinal poder ser encontrado através de meios digitais auxilia no fortalecimento dos atributos de modernidade e inovação. Por outro lado, a presença massiva em posts, pode passar a percepção de que a dedicação à atividade-fim – estudar, atender e participar de cursos, congressos e seminários - esteja sendo comprometida.
Claro que há um público que baseia sua escolha na popularidade do profissional, mas há outros que não, cabe, então, definir o que efetivamente se quer.
Enfim, a mensagem que o texto pretende passar é que estar presente digitalmente é, sem dúvida, de fundamental importância, porém, a escolha de como, onde e quanto dependerá dos objetivos previamente definidos. 
Ir na onda da manada ou mesmo achar que o impulsionamento de posts, fará da pessoa uma referência, é mais ou menos como um nadador achar que se fizer o mesmo treino do Messi, ganhará uma medalha de ouro na modalidade.