terça-feira, 29 de julho de 2025

A geração Z no mercado corporativo

As análises sobre o comportamento da Geração Z (nascidos entre 1997 e 2010) têm trazido números curiosos sob os mais diversos prismas, os quais, certamente, inspirariam artigos bem interessantes, porém, dessa vez, vamos focar a participação deles no mercado de trabalho, cuja entrada se deu justamente no período da pandemia.
Uma pesquisa da Resume Genius, plataforma de criação de currículos, divulgou que 60% dos empregadores já tinham demitido colaboradores dessa geração.
A explicação para tão expressivo percentual pode estar relacionada a três causas:
i - Desmotivação - a qual se deve ao fato de os zoomers terem presenciado quadros de demissão e cortes salariais de seus pais e pessoas próximas mais velhas no período da pandemia. Muito provavelmente a percepção de “instabilidade” os deixaram pouco “entusiasmados” com a carreira corporativa.
Essa explicação ganha mais força ao vermos as gerações anteriores se encantarem com o mundo corporativo graças ao que testemunhou através de seus pais.
ii - Comunicação - aqui as redes sociais têm estreita contribuição com essa linguagem diferente do, por ora, convencional.
Siglas para dar agilidade às conversas, gírias incorporadas ao vocabulário, principalmente o escrito, dificultam os diálogos e causam mal entendidos, que dão margem a avaliações errôneas acerca do interesse desses colaboradores.
Além do que, no período em que a geração Z entrou no mercado, as reuniões presenciais não existiam em função da pandemia, porém, o convívio diário voltou, ainda que muitas vezes em proporções menores.
iii - Bem-estar pessoal - o que significa valorizar a vida, além do trabalho. Esse anseio é extremamente legítimo, que se registre, o problema é que ele se perde ao não possuir uma gradação que estabeleça a relação de equilíbrio adequada. 
É bem provável que as gerações anteriores tenham falhado nesse balanceamento em prol do trabalho. Por outro lado, a geração Z parece dar mostras do contrário.
Talvez o advento do home office tenha acostumado mal, principalmente aqueles sem uma experiência prévia e duradoura no presencial. Casos de pedidos de demissão por terem que comparecer no escritório, ou mesmo de recusar um emprego em função dessa exigência não são raros, daí a tentação de considerar esse comportamento como fruto de uma personalidade preguiçosa, o que pode não ser justo. Afinal, por mais que eu particularmente goste e veja muitas vantagens no trabalho presencial, seria leviano não reconhecer que o home office pode ser mais produtivo em alguns aspectos.
Cabe também aos “antigos”, um olhar mais condescendente em relação à nova geração e refletir sobre os paradigmas já cristalizados, já a geração Z precisa entender que estão entrando em um sistema maduro e que para as mudanças acontecerem é necessário inicialmente se adequar ao padrão estabelecido, para, então, se conquistar a confiança e voz para que as sugestões de mudança sejam bem-vindas.





terça-feira, 22 de julho de 2025

Janela de Overton no marketing


Mais conhecido no ambiente político, a janela de Overton, que tem esse nome derivado de seu criador, Joseph P. Overton - ex-vice-presidente do Centro de Políticas Públicas de Mackinac no Michigan - é um conceito que classifica ideias e iniciativas perante à opinião pública em determinado momento. Dessa forma, analisa e organiza as “posições” numa escala que vai do aceitável ao impensável passando pelo sensato, popular e a política vigente.
Vale, no entanto, ressaltar que o dinamismo da sociedade faz com que ideias consideradas radicais e impensáveis no passado se tornem aceitáveis, sendo a recíproca verdadeira, visto o processo evolutivo no que tange às mudanças sociais, culturais e políticas, as quais recebem forte influência de eventos como protestos, crises, mídia, comunicação e ativismo de grupos.
A proibição do casamento gay e os assédios sexuais e morais são alguns exemplos de situações que passaram do aceitável para o impensável e referenda a utilidade de acompanhar atitudes e políticas públicas sob a ótica da Janela de Overton, principalmente por pessoas públicas que busquem a aceitação popular.
Apesar de voltada ao ramo da ciência política, a janela de Overton tem bastante serventia para o marketing, pois, ainda que empiricamente, é recomendável que as marcas elaborem suas estratégias dentro dessa janela - algumas vezes até ampliando-as gradualmente -, de forma que produtos e serviços sejam desejados pelo seu público-alvo.
Para ilustrar essa argumentação, citaremos a seguir algumas situações sobre produtos ocorridas no mercado.
Na década 90, o veganismo era algo voltado a nichos, uma alimentação alternativa com pouquíssimos consumidores, os quais, inclusive, eram tidos como hippies ou coisas do gênero. Campanhas educacionais, ativismo e o aumento da consciência ambiental mudaram o quadro, a ponto de vermos grandes marcas como a Burger King disponibilizando produtos dessa categoria em seu cardápio.
Nos séculos XVII e XVIII, o café, devido ao seu efeito estimulante, era considerado em alguns países como uma “bebida do diabo”, de tal forma que no Império Otomano e na Inglaterra seu consumo chegou a ser proibido. Hoje é a segunda bebida mais consumida do mundo, ficando atrás apenas da água.
O próprio sushi, que fora da Ásia era tido como um alimento insalubre, nos dias atuais é considerado uma iguaria sofisticada.
Há muitos mais casos de produtos que ilustram o conceito da janela, tais como o chá e o azeite de oliva. 
Em termos de marcas, o fenômeno também ocorre. A Natura, que em seu início era vista como uma marca alternativa com produtos demasiadamente naturais e rejeitada por alguns, atualmente é reconhecida como uma marca global comprometida com a sustentabilidade e o desenvolvimento da Amazônia.
A Ben & Jerry’s, associada ao combate ao racismo, à comunidade LGBTQIA+ e às causas ambientais, também chegou a sofrer boicotes que, de alguma forma, trouxeram reflexos comerciais.
Não faltam exemplos, embora reconheça que no campo político, pelo fato de a decisão envolver muitos fatores intangíveis e a pressão das “manadas” interferir mais fortemente nas escolhas, o conceito da Janela de Overton é bem mais preponderante, todavia, vale, pelo menos a título de exercício, aplicá-lo ao marketing.





terça-feira, 15 de julho de 2025

Enhanced Games...ou Ashamed

Alguém já ouviu falar dos Enhanced Games? Provavelmente poucos, mas em breve o evento se tornará mais popular e com direito a extensos debates calorosos.
Numa tradução livre, “enhanced” se refere a algo “aprimorado”, expressão que no meu modo de ver, seria descabida para o evento, uma competição, na qual se permite o uso de quaisquer substâncias que venham a melhorar a performance dos participantes, ou seja, além de eventuais equipamentos proibidos nas demais competições, o doping estará liberado.
Os defensores da iniciativa alegam se tratar de uma forma de valorizar a ciência e a tecnologia, afinal, trabalham, segundo eles, a melhoria humana. Alguns chegam a fazer uma analogia à Fórmula 1, alegando que os avanços automobilísticos têm parte de sua origem nessa competição.
Aqui, já poderíamos rechaçar o argumento ressaltando que estamos lidando com vidas humanas e não com máquinas, o que poderia receber como tréplica o discurso de que o esporte de alto rendimento também traz problemas.
Adiciona-se aos argumentos pró-dopagem, a tão propagada liberdade individual que, nesse caso, proporcionaria o direito à decisão sobre os recursos a serem utilizados nas competições. Ignoram que o caráter individual jamais pode se sobrepor ao da coletividade, a qual, por sua vez, é ditada por determinações regulatória.
Veladamente, também dão a entender que a possibilidade de falha nos controles antidopagem deixaria mais justa a “liberação” das substâncias e demais subterfúgios tecnológicos. Seria algo, guardando as devidas proporções, como liberar assaltos e assassinatos, já que a polícia não consegue pegar todos os criminosos.
E, tão grave quanto, não consideram que o acesso a tecnologias será sempre desigual.
Por mais que eu me esforce para tentar entender alguns argumentos dos defensores dessa iniciativa, não há como não se posicionar contra, visto que ela contraria os princípios éticos que fazem parte da essência do esporte.
Pelo ponto de vista do marketing, também encontramos posições antagônicas. Enquanto uns defenderão que se trata de uma excelente oportunidade para as marcas que desejam se associar à inovação e tecnologia, outros sustentarão, e com razão, que as marcas devem focar no ser humano para serem admiradas - vide Kotler em seu livro Marketing 3.0.
Embora a "boa performance" seja, de fato, um atributo de alto cunho aspiracional, a forma como ela é atingida pode trazer severos danos à imagem das marcas que venham a tolerar e/ou mesmo pactuar com práticas cristalizadas como maléficas no meio esportivo. Ilustra essa condição, os contratos de patrocínio, nos quais tais atitudes são passíveis de rescisões automáticas.
Ainda sob a ótica de marketing, vale destacar o aspecto da segmentação, salutar para processos de extensão de linhas e de marcas de produtos, pois passa a atender públicos com necessidades específicas e que poderia servir para justificar tais competições como alternativa ao convencional, afinal, no próprio esporte encontramos esse processo no que tange a gêneros e até em faixas etárias nas competições de cunho participativo. 
Todavia, há que se tomar cuidado para que uma grande quantidade de opções não venha causar incômodos ao potencial consumidor, dito isso, concluo que até sob o prisma de marketing, os Enhanced Games nada têm a agregar ao esporte, já repleto de conteúdo e, infelizmente, de pessoas que não o entendem em sua plenitude.



terça-feira, 8 de julho de 2025

Loja Teatro

Quem já ouviu falar em Loja Teatro? Poucos, acredito! 
A expressão, que pode ser que nem pegue, tem sido utilizada para se referir aos estabelecimentos varejistas que deixam visível o processo de produção, dando ares de um verdadeiro show, fazendo com que a experiência de compra – outro termo bastante em voga – proporcione a percepção de envolvimento similar ao de apresentações teatrais.
Gostaram da analogia? 
Além de estimular mais fatores sensoriais, a transparência do processo agrega confiança e, consequentemente, valor aos produtos. 
O provável maior engajamento emocional, por sua vez, fortalece a conexão com a marca, e a sensação de autenticidade contribui para os processos de posicionamento.
Até no que tange à comunicação, a iniciativa traz benefícios, pois, além da propagação natural de algo supostamente inédito, gera conteúdo para as redes sociais graças ao lado “instagramável” do processo. Não faltam posts e testemunhais de micro influenciadores espontâneos.
Obviamente que a preocupação com a estética e higiene deve ser redobrada, para que a máxima “quem conhece cozinha de restaurante, não come” não interfira negativamente no consumo.
Atualmente, não são muitos os estabelecimentos que adotam o conceito, ainda que existam restaurantes com a cozinha acessível à visão por vidros e haja unidades do Starbucks Reserve e da Lindt, para citar algumas marcas, onde se encontram ações similares. 
É fato que a busca por oferecer uma experiência diferente ao cliente está cada vez mais intensa em função da competição pela atenção, o que nos leva a acreditar que esse tipo de iniciativa pode vir a se tornar mais frequente. O cuidado deve se dar na operação, visto que algumas “produções” podem não ser tão “estéticas”. 
Deve também ser avaliado se as obras necessárias à transparência não podem de alguma forma “tirar” espaço da área de vendas e se o investimento será remunerado.
No Brasil, o exemplo mais emblemático talvez venha ser o da Krispy Kreme, uma cadeia especializada em donuts, que está entrando em operação por aqui.
Presente em mais de 30 países, a Krispy Kreme, atua no país através de uma joint-venture com a am pm - lojas de conveniência operada no Brasil pela Ipiranga - e inaugurará uma loja em São Paulo com a capacidade de produzir 50 mil donuts por dia diante dos clientes.
Se o conceito vingará, tendo a apostar que sim, mas, tal qual uma peça de teatro, teremos que esperar os próximos atos.

 





terça-feira, 1 de julho de 2025

Maratona do Rio - lealdade inercial

Realizada na semana retrasada, a Maratona do Rio de 2025 pode ser considerada um sucesso em termos de número de participantes – 50 mil inscritos – até então o recorde pertencia à edição de 2024 com 45 mil. Vale informar que essa quantidade abrange os participantes de todas as distâncias que constavam do evento: 5 km, 10 km, Meia Maratona e Maratona. Ainda assim, um feito bem legal, que mostra como as corridas de rua vêm ganhando adeptos na sociedade. 
Mas o que quero trazer para o debate é a influência do efeito manada, responsável não só por fazer as pessoas aderirem à atividade e competirem nela, mas também por fomentar a participação de muitos nas críticas a respeito, dentre as quais, destacamos:
"Houve falta de medalhas para os que concluíram a prova de 5 km". Fato! Trata-se de uma situação que não deveria acontecer, afinal as medalhas faziam parte do pacote anunciado. A razão alegada para explicar a “ruptura” teve como alvo os corredores que participaram da prova sem estarem inscritos. Entendida a causa, cabe a réplica de que se trata de uma situação usual, esperada e que envolve fatores estruturais da sociedade, portanto, contingencialmente deveria ter havido uma fiscalização mais apurada e, até um estoque maior de medalhas, embora ache essa última solução muito condescendente.
“O kit não era farto”, também esteve entre os tópicos de insatisfação. Para os que não acompanham a modalidade, esclareço que “kit” é o conjunto de itens recebidos pelos inscritos antes da prova. Nele constam obrigatoriamente o número que o corredor ostentará na competição e o chip para controle do resultado. Muitas provas adicionam outros “mimos”, que nada mais são do que samples (amostras) fornecidos pelos patrocinadores e apoiadores. Legal, né? Sem dúvida, porém, da mesma forma que a medalha está contemplada na proposta de valor da inscrição, o kit farto não está. Portanto, ainda que frustre expectativas e seja relativamente fácil de resolver, não creio se tratar de um grande problema, já as críticas em relação às filas enormes para retirada dos kits fazem total sentido.
Aspectos técnicos como a largada em ondas também entraram no muro das lamentações. Provavelmente, fruto do desconhecimento do fato de que a largura das pistas é uma variável que faz com que todas as grandes maratonas do mundo adotem essa medida. Por outro lado, faço coro aos que protestaram contra a inclusão de uma onda localizada logo atrás dos corredores de elite, cujas vagas eram comercializadas. Nada contra a monetização do evento, todavia, essa não pode interferir na essência do esporte e na performance daqueles que buscam a participação também com esse fim.
Pode melhorar? Claro que sim, mas não custa lembrar que num passado não muito distante, as medalhas eram apenas para os vencedores, o kit vinha apenas com o número e quatro alfinetes para afixá-lo e mal havia postos de hidratação durante o percurso.
Ah, também não existiam as redes sociais para conduzir manadas, tampouco para facilitar o surgimento de “líderes de causa” sem o mínimo conhecimento do que se propõem a escrever.
Ainda sobre a Maratona do Rio, além das críticas que se multiplicam, ainda vimos “especialistas em marketing”, vaticinando que, diante dos problemas ocorridos, o “cliente” pode não querer mais participar do evento. Situação que, de fato, pode até ocorrer quando se trata de mercados sem barreiras de troca (bens de consumo, por exemplo), todavia, no caso da Maratona do Rio, há que se considerar o conceito que chamamos em marketing de “lealdade inercial”, no qual a fidelidade não advém de um vínculo emocional forte, mas da inércia comportamental, que mitiga as eventuais motivações para troca, mesmo diante de experiências negativas num primeiro momento. Ela ocorre quando o consumidor continua comprando por hábito, conveniência ou falta de motivação para mudar, mesmo após experiências negativas, o que acredito ser o caso...por ora.