terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Torcer sem distorcer

A frase que dá título ao artigo pode até parecer utópica para os que adicionam ao ato de torcer uma componente perigosíssima: a paixão, a qual é capaz  de contaminar julgamentos e interpretações sobre fatos relacionados aos alvos de suas predileções. E pouca diferença irá fazer se o autor do julgamento tem conhecimento suficiente para opinar a respeito, até porque não se trata de uma opinião isenta e sim da defesa de sua convicção, instituição ou partido.
No futebol, um técnico passará a ser burro no momento em que a escalação e/ou substituição que ele fizer não coincidir com a do sujeito “inteligente” que não conhece os bastidores e jamais teve experiência na profissão, mas se porta como tal.  
Esse tipo de prepotência não fica restrito aos aspectos ligados ao desempenho esportivo, afinal, segundo dizem, todo brasileiro é um técnico. Aliás, a coisa evoluiu de tal forma que agora todo brasileiro é também gestor, independentemente do que tenha estudado ou até que nem tenha estudado.
O que antes parecia limitado ao futebol parece ter extrapolado para diversos segmentos, inclusive para a política em todas as suas manifestações.
Decisões judiciais passaram a ser contestadas por qualquer um, pouco importando se os "contestadores" têm ciência sobre os códigos penais, dos autos dos processos, ou se nem sabem o que isso significa. Se a decisão coincide com o que "torce", o juiz é honesto, caso contrário, trata-se de um venal.
Não se descarta a possibilidade de a falta de honestidade se fazer presente em julgamentos, assim como não podem ser desprezados os graus de isenção de um juiz ou mesmo sua capacidade. Porém, apelar para esses como instrumento de argumentação não me parece razoável.
Outro argumento bastante evocado é o do uso “bom senso”. Para quem o usa, seria interessante perguntar se eles já viram alguém admitir que não tem “bom senso”, ou se consideram o “bom senso” um monopólio deles ou dos que pensam iguais a eles.
Nesse contexto, é bastante provável encontrar pessoas que defendam agressões verbais a um ministro do Supremo Tribunal Federal quando esse está em seu momento de lazer, mas que condene uma senadora que insufle a população contra a decisão de um juiz, ou vice-versa.
Isso sem falar no caso de um  senador que ao se ver contrariado incita a população para ações de violência, mas se sente ultrajado quando a violência é contra ele. 
Para que não pairem dúvidas, acho todos os fatos condenáveis.
Os que aceitam esse tipo de postura apelam para o discurso da democracia como justificativa, o que não faz o menor sentido, pois democracia não dá o direito a ofender e perturbar a ordem de quem quer que  seja.  
Parecem esquecer que a busca pela justiça feita com as próprias mãos e/ou pelo próprio arbítrio abre um precedente perigosíssimo, além do que, vale lembrar que os corruptos agora julgados e condenados tiveram esse mesmo raciocínio ao quererem arbitrar suas remunerações tendo as propinas como complemento de seus salários.



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