terça-feira, 16 de dezembro de 2025

As bets e o futebol brasileiro

O mercado de patrocínio no futebol se encontra num ótimo momento financeiro, fato que se deve, principalmente, à entrada das empresas de apostas praticando investimentos bem acima do que o mercado recebia.
Muitos clubes que tinham dificuldades em comercializar suas propriedades de marketing passaram a receber, e aceitar, propostas inimagináveis num passado recente. Além disso, o direito a nominar os campeonatos, o title sponsor, também teve um expressivo aumento de demanda.
Tomando como base os 100 campeonatos que fizeram parte da amostra de um estudo da Jambo Sport Business realizado em 2024, vemos que de 2021-2022 até a temporada atual (2025-26), o percentual dos que possuem title sponsor subiu de 69% para 82%, sendo que as marcas de bets que detêm esta proprieadade aumentaram a participação no mesmo período de 26,1% para 39%.
Cumpre relatar que o “fenômeno” não é uma exclusividade brasileira, embora os valores aqui aportados possam estar sendo influenciados pela impossibilidade de se investir em algumas praças devido a restrições legais.
Para ficarmos no âmbito das principais ligas, temos que na Itália, desde 2019, os patrocínios advindos de empresas de apostas estão banidos. Na Espanha, a proibição se deu a partir da temporada 2012-22,  enquanto na Inglaterra, as restrições no que tange à publicidade na frente das camisas passarão a vigorar em 2026-27.
Que a verba é de fundamental importância para os clubes, não há discussão, mas é preciso debater também as consequências sobre os aspectos sociais e avaliar até que ponto o incentivo ao jogo é benéfico para a população. 
Não nos esqueçamos que o esporte tem como propósitos o desenvolvimento físico e mental, o bem-estar social e emocional, e a universalização de valores como disciplina, trabalho em equipe e respeito.
Será que as apostas não são ofensoras desses propósitos? Por outro lado, será que para o fomento do esporte tais verbas não são importantes?
Para apimentar a discussão, informamos que entre os TOP 10 países com maiores índices de desenvolvimento humano que fazem parte da amostra do estudo citado (Islândia, Noruega, Suíça, Dinamarca, Alemanha, Suécia, Austrália, Holanda, Bélgica e Irlanda), apenas 20% têm marcas do setor de apostas como title sponsor dos seus campeonatos nacionais de futebol.
Afirmar que esse fato tem como causa o melhor nível educacional desses países pode ser uma tese, todavia, precisamos relatar que muitos deles talvez não suscitem o interesse das bets, seja pela atratividade da competição, seja pelo tamanho da população/mercado.
Acrescento à discussão uma dúvida: por que no Brasil as marcas de bebidas não podem ser expostas como patrocinadoras másters dos times de futebol? Aliás, antes da liberação do jogo por aqui, as bets já podiam deter este tipo de patrocínio, enquanto as de bebidas alcoólicas, mesmo com consumo permitido, não tinham a exposição liberada nos uniformes, ou melhor, não têm.
Outro ponto a ser analisado é o que diz respeito ao “day after”, isto é, como os clubes se comportarão quando as empresas do setor deixarem de investir, o que pode se dar tanto pelo cumprimento dos objetivos traçados, como por eventuais restrições financeiras. 
Para finalizar, devemos adicionar ao debate a reflexão sobre a distribuição percentual dos impostos arrecadados com as apostas, visto o mesmo não priorizar setores como a saúde, que provavelmente é um dos mais impactados pelo jogo. 





terça-feira, 9 de dezembro de 2025

E o Mirassol, quem diria?

Ao fim do campeonato brasileiro de 2025, um fato chamou a atenção de todos: o desempenho do Mirassol, que disputou pela primeira vez a competição e terminou na quarta colocação, garantindo a vaga direta para a Libertadores 2026.
Teses sobre o sucesso não faltam, assim como também sobrariam no caso de insucessos. Engenheiros de obras prontas proliferam, faz parte...
Para não correr o risco de entrar nesta relação de “sábios”, opto por declinar da discussão sobre "a fórmula do sucesso" para focar na reflexão sobre o modelo de remuneração do clube, a qual pode ser derivada para inúmeros outros setores da economia.
Mas antes, vamos falar um pouco do clube. Fundado em 1925, o time fica no município paulista com o mesmo nome e integra a região metropolitana de São José do Rio Preto, distante 453 km da capital do estado. A população, segundo dados recentes do IBGE é de 65.811 habitantes, portanto, inferior à capacidade de estádios como Maracanã, Morumbis e Mané Garrincha.
Estima-se que o time teve a segunda melhor folha salarial do Brasileirão, sendo ela baseada fortemente na remuneração variável, que premia jogadores e comissão segundo resultados e objetivos.
Muitos defenderão que esta é "a fórmula do sucesso" e, certamente, evocarão bancos e outras corporações para fortalecer a tese.
De fato, é bem provável que tal política tenha contribuído para a motivação e o bom desempenho do time, entretanto, isso não significa que a remuneração é o único, tampouco, o maior fator de estímulo. A pirâmide de Maslow, que divide as necessidades humanas em níveis corrobora para esta conclusão.
A defesa incondicional do modelo, esquece de considerar que equipes e jogadores vivem num ecossistema dinâmico, onde aspectos como a retenção do profissional é bastante dependente do que o mercado oferta, de forma que a remuneração – valores e formas – precisa ser competitiva diante do que se apresenta.
Será que o Mirassol conseguirá manter seus jogadores sem ter que alterar de alguma forma a política salarial? Ou seja, tal modelo é sustentável no médio prazo?
No ambiente corporativo, é possível encontrar muitas empresas oferecendo bônus gigantescos, o que, aliás, foi responsável por muitos escândalos, vide o caso da Americanas.
Claro que só o fixo pode gerar acomodação, embora ache que a obrigação do profissional é dedicar esforço, independentemente, do que pode vir a receber. Além do que, principalmente no caso do futebol, pode parecer que o salário é para ter maus resultados e os bônus para bons. Há exagero e ironia na frase, alerto!
A discussão sobre o modelo é de suma importância e valia, mas creditar a excelente campanha do Mirassol exclusivamente a ele não parece correto. Simplesmente replicá-las para outras equipes ou mantê-la no caso do próprio Mirassol não é garantia de bons resultados.
A propósito, o River Plate anunciou que em 2026 a remuneração dos seus jogadores será constituída de 60% fixa e 40% variável.
A verdade é que fórmulas mágicas não existem nem na gestão, nem no esporte. Pessoas diferem entre si, as condições externas exercem influências que também variam em termos de impacto, enfim, o "copiar e colar" não se aplica. 
O segredo para uma boa gestão é se municiar de informações e ter um olhar que permita planejar e adaptar os conceitos adquiridos pelo conhecimento contínuo aos objetivos traçados dentro de uma realidade, cujos recursos são sempre finitos, independentemente do tamanho da instituição.





terça-feira, 2 de dezembro de 2025

Exagerado

 

A cruzada de explicar o que efetivamente vem a ser marketing é cansativa e, provavelmente, inglória.
Além do desconhecimento dos “potenciais” clientes dos serviços de marketing que, na maioria das vezes os contratam para fins meramente de comunicação, há os “fornecedores” que contribuem para o processo de desinformação.
No início do ano, foi noticiada a morte do Duo, mascote que dá nome à plataforma Duolingo de ensino de idiomas. A ideia central era anunciar o encerramento das atividades da marca e criar comoção nas redes sociais. No marketing, as ações deste tipo criadas para despertar a atenção da mídia são conhecidas como Public Relations Stunt, ou simplesmente, Stunt.
Na semana passada, a Canva - plataforma online de design e comunicação - lançou os Gracyovos, uma linha de ovos, que tinha como protagonista, a influenciadora Gracyanne Barbosa, contumaz consumidora de grandes quantidades deste alimento.
A estética da embalagem, a identidade visual e a narrativa de luxo, aliadas à nutrição e fitness também chamaram a atenção ao ilustrar o poder da criação, do design e do storytelling, justamente as atividades principais da Canva.
Sobre a criatividade das campanhas, particularmente, não gostei da utilização da “morte”, mesmo sendo de um personagem, embora muitas pessoas tenham elogiado o enredo. Já a utilização do humor no caso da Canva com seus Gracyovos, me pareceu mais leve e divertida. Questão de gosto.
Mas o que tais campanhas têm em comum?
Ambas eram sustentadas pelo uso do exagero como ferramenta de engajamento, o qual, de fato, foi acima do usual.
Mas será que se trata de uma estratégia eficaz? 
Mesmo antevendo eventuais discordâncias, ainda mais num momento em que fake news são toleradas se forem usadas contra “inimigos”, declaro que não considero interessante. Aqui não é questão de gosto...
Pelo prisma mercadológico, vejo as ações adequadas para provocarem picos de atenção, todavia, carecem de profundidade estratégica que é a essência do marketing. Além disso, envolvem sérios riscos à reputação, pois, podem minar a credibilidade das mensagens e fazer com que o público passe a considerar a hipótese de “pegadinhas” nas próximas ações.
É preciso ter em mente que alcance não necessariamente se transforma em geração de valor, tampouco fidelizam o consumidor.
Penso ainda que uma comunicação baseada em estímulos artificiais sem proposta clara de valor está totalmente desalinhada dos princípios de branding: valorização da  autenticidade e do propósito.
No artigo, optei por considerar que as campanhas mencionadas tinham como base o exagero, enquanto outros preferem considerá-las desinformativas e até mesmo mentirosas. Talvez tenham razão.
Neste caso, o marketing fica ainda mais vulnerável, visto corroborar para a falsa interpretação de que fazer marketing é enganar.

terça-feira, 25 de novembro de 2025

C de...confuso

Quando vamos soletrar um vocábulo, costumamos utilizar alguma palavra para representar uma letra e evitar eventuais confusões sonoras, algo do tipo N de navio, C de casa.
No jargão mais técnico, dá-se o nome a esse sistema de Alfabeto Fonético de Comunicação, o qual é usado em comunicações de aviação e algumas outras.
Sem dúvida, uma maneira interessante de dirimir dúvidas e padronizar a comunicação.
A adoção de algo similar no meio corporativo seria extremamente benéfico, tamanha a profusão de letras que acompanham o C, não mais de Charlie, mas de Chief para fazer referência aos C-levels.
O advento dos C-levels teve seu início entre as décadas de 60 e 70, como forma de estabelecer responsabilidades às lideranças em substituição às denominações de Presidente, Vice-Presidente e Diretor. Nessa época, a utilização era bem restrita e se resumia basicamente a CEO (Chief Executive Officer), CFO para cuidar das Finanças e COO para operações, ainda assim, não eram muitas as empresas que as adotavam.
Nos anos 80 e 90, com o boom da globalização, mais Cs foram incorporados, os CMOs (Marketing) e CIOs (Information) se juntaram aos Cs mencionados acima. 
A partir dos anos 2000, a situação passou a sair um pouco do controle. O C de Chief se consolidou, assim como o O de Officer, porém o "miolo" ficou confuso.
Neste "festival" incluem-se as derivações para quatro letras, como a que acontece com o CAIO (Artificial Intelligence),  com o CISO (Information Security) e com o CHRO (Human Resources), sendo que essa última recebe em algumas empresas a denominação de CPO (People). Qual usar?
Mas as confusões não param por aí. 
As tentativas de adivinhar o que cada letra significa ficam bem mais difíceis quando nos deparamos com vários significados diferentes para uma mesma sequencia de letras. 
O "CCO", pode ser usado para Commercial, Compliance, Culture... O "CSO" para Strategy ou Sustainability, assim como o "CIO" pode servir para Information (TI) ou Inovation.
Não sei se por uma questão de modismo ou para mostrar criatividade, é possível também encontrar o CLO  - Chief Listening Officer, cuja função é monitorar o que está sendo dito sobre a empresa nas redes sociais, fóruns, mídia etc. Guardadas as devidas proporções, um ombudsman com três letras. Valendo citar aqui que o CLO é usado em algumas empresas para nominar o líder da área jurídica - CLO (Chief Legal Officer).
Nessa mesma linha criativa, nos deparamos com o CBO – Chief Belief Officer, que visa manter os colaboradores motivados, espiritualmente equilibrados e alinhados com os valores da empresa, algo similar ao CHO (Happiness) e ao CJO (Joy).  
Para não deixar o artigo ainda mais extenso, finalizamos com o CCO – Chief Cannabis Officer – mais um C para concorrer com os citados anteriormente – que lidera a área de estratégia e regulamentação de algumas empresas no setor de cannabis medicinal.
De fato, não há limites para a criatividade, ela só necessita considerar que o alfabeto é limitado e que a boa comunicação precisa ser clara, direta e objetiva. CDO?
Não resisti.




terça-feira, 18 de novembro de 2025

Cartão amarelo para o silêncio

Um dos assuntos mais comentados na semana passada foi o julgamento de um jogador do Flamengo, que tinha sido acusado de receber de forma proposital um cartão amarelo para beneficiar parentes e amigos que apostaram no ato.
A punição decidida pelo STJD – Supremo Tribunal de Justiça Desportiva - estabeleceu uma multa de R$ 100 mil ao jogador, definição que provocou inúmeras discussões envolvendo tanto a integridade dos auditores como até um suposto favorecimento por se tratar de um time com grande número de torcedores. Nos debates não faltaram comparações com casos similares, cujas penas foram bem mais pesadas.
Entrar na seara jurídica me parece um pouco inconsequente para quem não leu os autos e/ou não tenha embasamento jurídico para entender e interpretar artigos, jurisprudências etc., porém, como quase tudo hoje em dia se ampara na necessidade de opinar e engajar, não faltaram posts e reposts sobre o caso, independentemente do conhecimento necessário a respeito. 
Curiosamente, pouco se comentou sobre a postura do clube que não externou nenhum tipo de indignação com a postura do jogador. 
Deixa pra lá, vamos falar de marketing, mais precisamente de reputação, atributo vital para o fortalecimento e valorização das marcas.
Inicialmente, vale comentar que ó fato de clubes serem patrocinados por bets faz com que a relação entre as partes já seja bastante sensível pelo ponto de vista reputacional. Ok, entendo que os valores aportados são fundamentais para a gestão dos clubes, mas o registro se faz necessário.
As casas de apostas, por mais que estejam trabalhando atributos e features para se posicionarem no mercado, não podem jamais negligenciar seu principal ativo: a integridade esportiva, de modo que as iniciativas de prevenção e combate contra qualquer espécie de manipulação são cruciais para a marca ser percebida como virtuosa.
Uma simples associação do jogador com a marca tem o poder de levantar questionamentos que, se bem aproveitadas pela concorrência, causam danos, afinal, o patrocinador exerce o papel de um parceiro institucional e, em tese, compartilha dos mesmos princípios e valores.
Mas a marca tem alguma culpa do ocorrido? Sou capaz de apostar que não. Tampouco, o clube pode ser acusado de qualquer tipo de cumplicidade no ato, ainda que não tenha punido exemplarmente o jogador.
Deveria a marca romper o patrocínio? Também creio que não, embora caiba ao patrocinador uma avaliação, na qual se pondere se o retorno do investimento em termos comerciais e de awareness compensa o risco de ficar associado a eventuais falhas na questão da manipulação.
A propósito, a marca foi uma das que denunciaram o volume anormal de apostas no caso em questão, sendo que na época ela não patrocinava o clube.
O que fazer? Bem, fazendo a tradicional ressalva de que gestão não é uma ciência exata, arrisco-me a opinar que o mais adequado seria ter havido a divulgação de uma nota logo após o julgamento, reafirmando o compromisso com a integridade e enfatizando a eficácia dos seus sistemas de monitoramento.
Ainda que se tome o máximo de cuidado para a mensagem não atacar o clube, nem minimizar o problema, reconheço que pode haver ruídos. Porém, o silêncio, ainda mais numa fase em que a categoria “apostas” está construindo sua imagem, pode causar problemas seríssimos e legitimar as pressões dos demais setores para a adoção de restrições. 





terça-feira, 11 de novembro de 2025

Guia Michelin...de marketing

Quando o marketing "nasceu"?
A data formal de sua origem não é precisa, alguns defendem que nos primórdios da civilização e que em textos bíblicos já era possível ver traços da disciplina. Aqueles que acreditam que o marketing se resume à comunicação, evocam Gutemberg, pois, graças à prensa topográfica foi possível massificar a impressão de textos.
As versões, como podemos ver, são variadas, particularmente, estou mais alinhado com os que acreditam que o surgimento se deu na década de 1940, após a 2ª guerra, todavia, chamo a atenção para o lado intuitivo que permite a adoção do marketing, mesmo sem a formalização do termo. 
Um excelente exemplo acerca da adoção dos conceitos de maneira, digamos, espontânea, aconteceu com a Michelin, fabricante francesa de pneus.
Em 1900, os fundadores da empresa criaram o Guia Michelin, o qual trazia mapas e informações úteis para quem quisesse viajar, tais como oficinas, postos de abastecimento, hotéis e restaurantes.
Distribuído inicialmente de forma gratuita, a ação tinha como objetivo incentivar o ato de viajar e, assim, gerar um maior desgaste dos pneus para que eles precisassem ser trocados, aumentando, consequentemente, a recorrência de compras junto à Michelin.
Sob o prisma do marketing, podemos dizer que a Michelin conseguiu com a ação criar valor para seu público-alvo, incentivou o uso do carro e a demanda por pneus, além de ter estabelecido uma conexão emocional com o consumidor.
A evolução para a gastronomia teve o mérito de posicionar a marca como referência em excelência ao se associar à qualidade e sofisticação.
Ter estrela Michelin virou meta para chefs e restaurantes, não apenas pela certificação de virtude gastronômica como também pelo status, atributos importantes para a atrair clientes.
Esse tipo de ação retrata perfeitamente os mais puros conceitos de marketing ao “não vender nada” de forma direta, mas gerando valor para a marca. 
Obviamente, toda a estratégia descrita pouco agregará caso a distribuição dos produtos não seja satisfatória e/ou se o preço não estiver alinhado ao mercado, tampouco se ficar restrita a uma única ação.
Guardadas as devidas proporções, podemos encontrar em outras categorias, certamente com menos sucesso, iniciativas em que o incentivo ao consumo não se dá por via direta. 
A Lego, ao produzir animação de filme para o cinema, faz com que as crianças demandem brinquedos inspiradas no que viram.
A John Deere, fabricante de máquinas agrícolas, publica conteúdos sobre técnicas de agricultura, os quais, além de educarem o público-alvo, o fideliza. A própria Red Bull, com seus patrocínios a esportes radicais, fortalece a associação à energia, que é o que seu produto oferece.
Certamente há muitas outras, porém, bem menos do que o marketing pode proporcionar. 







terça-feira, 4 de novembro de 2025

Cuidado com a manada digital

Creio não haver dúvida quanto à eficácia das ferramentas digitais, o que não significa dizer que devam ser encaradas como a solução perfeita para qualquer tipo de negócio, tampouco de que os casos de sucesso que aparecem a todo instante são realidades extensivas a todos.
Essa introdução se faz necessária diante do crescente número de pessoas, principalmente profissionais liberais ou cidadãos comuns, que ao se depararem com o suposto sucesso de alguns dos seus “seguidos”, passam a acreditar que poderiam estar no lugar deles e/ou que mudarão de patamar financeiro ao dedicarem mais atenção ao digital.
Inicialmente, é importante lembrar que, mesmo reconhecendo a utilidade das ferramentas, são raros os casos de produtos ruins que se transformam em bons, além do que, replicar a mesma forma para realidades diferentes é um erro dos mais infantis que se pode cometer.
Ainda assim, vez por outra, nos deparamos com profissionais que passam a ponderar a contratação dos serviços de especialistas em “marketing digital”, porém, quando questionados a respeito do objetivo para a iniciativa, grande parte dos profissionais demandantes se vê sem respostas ou cita algum exemplo desconexo à sua realidade.
Apliquemos o exercício, a título de exemplo, aos médicos. O que eles podem vir a querer ao contratar o serviço dos profissionais citados no parágrafo anterior? Aumentar o número de clientes? Sim, óbvio, mas, será que pararam para pensar ou mesmo quantificar a capacidade ociosa nesse momento? Será que o objetivado incremento não redundará em filas de espera ou mesmo em um atendimento mais rápido do que o usual, o qual, talvez, tenha sido a característica que o levou a ter conquistado a clientela atual? Será que não trarão um outro tipo de público? Será que esse maior fluxo não contaminará o “posicionamento” que construiu, ainda que empiricamente?
Óbvio que estar em pontos de contatos digitais auxilia na “construção” da marca, afinal poder ser encontrado através de meios digitais auxilia no fortalecimento dos atributos de modernidade e inovação. Por outro lado, a presença massiva em posts, pode passar a percepção de que a dedicação à atividade-fim – estudar, atender e participar de cursos, congressos e seminários - esteja sendo comprometida.
Claro que há um público que baseia sua escolha na popularidade do profissional, mas há outros que não, cabe, então, definir o que efetivamente se quer.
Enfim, a mensagem que o texto pretende passar é que estar presente digitalmente é, sem dúvida, de fundamental importância, porém, a escolha de como, onde e quanto dependerá dos objetivos previamente definidos. 
Ir na onda da manada ou mesmo achar que o impulsionamento de posts, fará da pessoa uma referência, é mais ou menos como um nadador achar que se fizer o mesmo treino do Messi, ganhará uma medalha de ouro na modalidade.








terça-feira, 28 de outubro de 2025

Terceiro lugar

Antes que o título possa de alguma forma remeter a conquistas esportivas, adianto que o texto aborda um conceito de marketing que tem sido bastante adotado no varejo. 
A origem da nomenclatura visa “hierarquizar” o varejo no terceiro lugar como ambiente social, onde as pessoas podem se reunir e interagir. A casa é considerada o primeiro lugar, seguida pelo trabalho.
O racional do conceito sugere que o estabelecimento varejista precisa oferecer atrações aos que lá frequentam, de modo a atrair públicos com interesses similares e assim propiciar uma sensação de pertencimento aos que participam dessas “atrações”.
A título de exemplos da iniciativa, podemos citar a Apple através do Today at Apple, no qual as lojas dedicam espaço para aprendizado, e a Lululemon, que oferece aulas de yoga em suas instalações. Obviamente, todas essas atividades proporcionam a possibilidade de interação entre as pessoas.
No segmento esportivo, temos a Bandit Running que, além de comercializar produtos para a modalidade, organiza treinos e reúne praticantes. No ciclismo, A Rapha, marca inglesa especializada em ciclismo faz algo similar.
No Brasil, o varejo ainda está bem atrasado no que tange ao conceito, fato que tem entre as causas, o perfil do nosso consumidor que privilegia o preço à experiência. Essa característica acaba fazendo com que os varejistas não invistam no conceito para não terem que repassar os custos para o preço dos produtos. A argumentação de que “boas experiências” atraem mais público é correta, a dúvida que paira diz respeito ao tempo necessário para a conversão dos frequentadores em consumidores. Deve também ser acrescentado que a concentração no varejo brasileiro deixa as marcas, digamos, mais acomodadas do que em países em que haja maior competição pelo mercado.
Apesar dessas dificuldades conjunturais do país, o conceito do “terceiro lugar” não deveria ser ignorado, visto a crescente necessidade de as pessoas buscarem conviver e pertencer a todo momento. Ilustra esse quadro, a proliferação das assessorias esportivas, grupos que treinam principalmente corrida e ciclismo sob a supervisão de treinadores. 
Nessas, vemos amizades e casais serem formados, fotos das atividades registradas e até a realização de treinamentos propriamente ditos, ainda que, aparentemente, esse não seja o objetivo principal.
Vale relatar que as assessorias esportivas, muitas sem essa denominação, começaram a surgir no final da década de 80, só que na época, a relação de motivação era inversa da atual - ou seja, treinar era o objetivo precípuo – e o número de praticantes menor.
É muito bom acompanhar esse movimento e constatar que mais pessoas estão praticando atividades físicas, além de poder ver as assessorias adotando o conceito do “terceiro lugar”, mesmo que nunca tenham lido artigos ou livros do sociólogo Ray Oldenburg, talvez a maior autoridade sobre o tema.
Por outro lado, a massificação também preocupa, já que aumenta o risco de o esporte ser desvirtuado tamanha a incidência de treinadores e “alunos” que não dignificam os valores do esporte. 
A prática de atividades não condizentes com os melhores hábitos de saudabilidade e discursos que preconizam métodos de treinamento claramente enganosos são ofensores do esporte.
Jamais podemos ignorar que o treinador é, antes de tudo, um profissional de educação e, como tal, precisa colocar os princípios nobres do esporte à frente dos interesses financeiros e do egocentrismo.




terça-feira, 21 de outubro de 2025

O marketing "genérico" assola o mercado

Recentemente li um excelente artigo no Meio & Mensagem, o qual foi escrito pelo fundador da Fort Consulting e tinha como título “O futebol precisa de mais marketing”. Título cirúrgico e conteúdo perfeito para explicitar a importância do posicionamento quando se quer trabalhar efetivamente com marketing.
No texto, o autor cita vários exemplos de clubes que entenderam a necessidade de se posicionar, tais como o Forest Green Rovers da Inglaterra, o Paris St. Germain, o Como da Itália e o Athletic Bilbao, que aqui já foi tema em 2013, vide https://halfen-mktsport.blogspot.com/2013/01/athletic-bilbao-um-case-de-uma-causa.html.
A título, puramente, de atualização, informo que o Fluminense poderia fazer parte do seleto grupo que o texto do Meio & Mensagem retrata, pois, no passado, sua equipe de marketing desenvolveu um trabalho de posicionamento mercadológico, no qual se chegou ao “Nós somos a história”. 
Infelizmente, como o artigo “O futebol precisa de marketing” enfatiza, a falta de visão de marketing levou o clube a não explorar fortemente o conceito.
Hoje, o “Nós somos a história” vive dos residuais de postagens aleatórias em redes sociais e de um vídeo produzido internamente que, vez por outra, surge em alguns grupos de tricolores no WhatsApp.
Uma pena...
As causas dessa “pouca atenção” ao marketing estão diretamente ligadas ao desconhecimento do que efetivamente vem a ser marketing, costumeiramente confundido com comunicação e vendas.
Embora estejamos focando o futebol, é preciso registrar que muitas confederações de esportes olímpicos, comitês e até marcas, em tese consolidadas, denotam ignorância sobre o tema e também negligenciam a importância do posicionamento.
A situação se agrava em função da ansiedade por espaço na mídia e por engajamento, o que contribui  por uma quase cristalização disforme do marketing.
O processo de propagação da incompreensão é bastante curioso: os CEOs/presidentes, ao não terem o juízo correto sobre os benefícios do marketing e para o contemplarem no organograma, estabelecem como objetivos a captação de patrocínio, o engajamento e o número de seguidores, entre outros de cunho tático, preterindo, deste jeito, o aspecto estratégico que é sua essência.
Consequentemente, o recrutamento para se ocupar as posições deste departamento acaba sendo voltado para profissionais de comunicação e vendas.
Pronto, está criada a cultura de “marquetingue” naquelas organizações, desperdiçando assim um terreno fértil que poderia proporcionar ganhos muito maiores no longo prazo.
Será que não passa pela cabeça dos gestores das organizações que as marcas estão ávidas para se associarem a valores que são abundantes no esporte?
Será que não enxergam que o mercado de “patrocináveis” é imenso e que os valores do esporte são ferramentas de vantagem competitiva que poucos concorrentes possuem.
Pois é, parafraseando o autor do artigo no Meio & Mensagem, o esporte de forma geral precisa de mais marketing, mas marketing mesmo, não o genérico.



terça-feira, 14 de outubro de 2025

Economia da nostalgia

Frequentemente surgem expressões para a descrição de conceitos de marketing que, mesmo facilmente identificáveis, acabam passando despercebidos aos olhos da maioria das pessoas. Basta, no entanto, ganharem uma "denominação" para serem notados e até adotados por algumas marcas.
Agora está em voga a "economia da nostalgia". Ela visa explorar as emoções provocadas por ligações afetivas do passado, seja com produtos, trilhas musicais e demais formas de lembranças.
A Netflix, ao produzir o  filme Strangers Things, apostou numa ambientação dos anos 80 através de vestuários, músicas e produtos, fazendo até com que alguns, como o Eggo Waffles,  tivessem expressivo aumento de vendas. 
Continuando na seara cultural, os remakes de novelas como Vale Tudo e as turnês de grupos musicais ajudam a ilustrar o conceito.
No esporte, a Adidas com o lançamento do tênis retrô Stan Smith e a Nike, através do Air Jordan 1 em que manteve o design, mas com materiais e cores diferentes, também obtiveram sucesso com a estratégia.
Os relançamentos das câmeras Polaroid e de modelos clássicos de celulares da Nokia são outros exemplos da estratégia “nostálgica”, assim como a volta dos tênis Bamba e dos chocolates Surpresa da Nestlé, nos quais os cards colecionáveis vêm em versões digitais.
Pelo prisma do incremento das vendas e engajamento, a explicação para o sucesso da estratégia está relacionada ao aumento de expectativa de vida da população e o provável maior poder de compra da geração que, na época áurea desses produtos, os consumia com o dinheiro da mesada e/ou o dos pais. 
Pelo lado emocional, considera-se também a reconexão com a memória afetiva dos bons sentimentos vividos na infância e adolescência.
Espera-se com isso que a gratidão pelo respeito às suas memórias, se traduza em fidelidade e propagação.
Expectativas legítimas, sem dúvida, porém, se bem trabalhada, a "nostalgia" tem ainda o poder de servir como elo entre gerações.
Filhos e netos, ao se depararem com histórias ou mesmo se lembrarem de produtos usados pelos pais e avós, podem se tornar novos consumidores, mantendo assim a perenidade da marca.
No segmento de luxo, a Antonio Bernardo aposta nessa estratégia ao lançar uma pulseira e um colar chamados New Wish, que nada mais são do que as versões em prata dos tradicionais produtos Wish em ouro - objetos de desejo de toda uma geração.
Tal ação, além de trabalhar a "economia de nostalgia", traz para o mercado de joias, uma nova geração que, talvez, não o priorizasse em sua escala de desejos.
Evidentemente, há outras maneiras de se trabalhar a construção de vínculos emocionais entre marcas e consumidores, porém, em termos de investimento e tempo, elas certamente demandariam mais do que a "economia da nostalgia".





terça-feira, 7 de outubro de 2025

Educação vem de berço!

Alguns fatos, independentemente do período em que ocorrem, possuem o dom da atemporalidade, ou seja, passam anos e continuam atuais quando divulgados.
Através das redes sociais, tal característica fica ainda mais evidente, além do que, pela quantidade de informações que nos “bombardeiam” diariamente, muitas postagens e notícias antigas acabam passando despercebidas.
Pois bem, semana passada recebi um vídeo que mostrava uma cafeteria, onde um mesmo café recebia três precificações, as quais se baseavam na forma de se solicitar a bebida. Quando o cliente pedia “um café”, o preço era 7 €, se falasse “um café, por favor”, caía para 4,25 € e dizendo “bom dia, um café, por favor”, pagava 1,40 €.
Pesquisando sobre a ação, descobri que ela se deu em 2013 numa cafeteria chamada La Petite Syrah em Nice, na França 
Na prática, mesmo para os mal-educados, o valor cobrado foi sempre o mais baixo, visto que o objetivo principal era chamar a atenção para a importância da gentileza de forma divertida.
Alguns estabelecimentos, inclusive fora da França, adotaram ações similares. 
Marcas consolidadas também realizam ações de fomento aos bons modos.
Uma delas, a Southwest Airlines, costuma ter iniciativas reforçando que o bom humor e a gentileza melhoram a experiência do vôo. Na  campanha “Abra a Felicidade” da Coca-Cola, máquinas automáticas liberavam produtos mediante ao recebimento de abraços.
Apesar de citarmos poucas marcas, muitas outras adotam a educação, a gentileza, a solidariedade e a empatia como diferenciais de marketing, pois, além de cumprirem assim um dever social, conseguem criar um vínculo emocional com os consumidores e geram mídia espontânea.
E como começamos o artigo falando de “atemporalidade”, é lamentável constatar que a “falta de educação” não se erradica, aliás, talvez esteja até aumentando ou, quem sabe, ficando mais visível, visto que os pontos de interação entre as pessoas aumentaram graças às ferramentas digitais.
O “bom dia” , o “por favor” e o “obrigado” que foram por muito tempo um bom balizador do grau de educação das pessoas, hoje recebem outras companhias.
O retorno - ou não - das ligações que recebe e não pode imediatamente atender e as respostas - ou não - às mensagens diretas no WhatsApp têm a capacidade de aferir com boa dose de assertividade o quão educada e interesseira a pessoa é. 
O mais encantador dessa análise é observar que educação não está associada ao poder aquisitivo, ao grau de instrução ou à hierarquia, ela está relacionada ao berço, ou seja, à criação recebida.
Diante desta conclusão, tenho duas notícias, uma ruim e uma boa para as marcas que investem em campanhas com cunho educativo: a ruim é que é bem provável que a mudança pretendida não ocorra, já a boa é que as peças publicitárias continuarão atemporais por muito tempo.



terça-feira, 30 de setembro de 2025

"Com as redes sociais, acabou o futebol!"

A frase que dá título ao artigo tem como autor o ex-treinador do Fluminense, Renato Gaúcho, e foi proferida em seu  pedido de demissão na semana passada.
Apesar do erro ao decretar a morte do futebol, pois ele vive e até com mais pujança em termos de fortalecimento da indústria, é fato que as redes sociais estão assumindo um protagonismo que beira às raias do absurdo. E não só no futebol.
A tão propalada liberdade de expressão tem formado sumidades no direito, na economia, no futebol, no marketing, na nutrição, aliás, até na medicina com suas cloroquinas e remédios infalíveis.
O desejo de estar incluído em conversas/debates e a preguiça de pesquisar explicam bem esse fenômeno de crescimento. Poderíamos também incluir entre as causas, a ignorância proporcionada pela paixão, que faz com que muitas pessoas queiram ter acesso apenas às publicações que expressem o que concordam. 
Reitero que o sentimento do ex-treinador é bastante legítimo,  afinal, ler pessoas, que não acompanham os bastidores de um time, criticando seu trabalho é, de fato, ruim.
Entretanto, esses “apedrejamentos" não se restringem aos técnicos no caso do futebol. Executivos de marketing, por exemplo, também são bombardeados nas redes quando o time vai bem. Isso mesmo, no futebol a reclamação vai sempre existir, se o desempenho esportivo está bom, pancada no marketing, se está mau, sobra para o técnico, jogador, presidente...até preparador físico.
Saindo da esfera esportiva, vale citar que, mesmo sem a leitura de autos e a devida formação acadêmica, as redes sociais estão repletas de "juízes" opinando sobre os julgamentos mais populares. 
Parece que o que importa é opinar, até porque, mesmo os maiores absurdos, arrebanham defensores. 
Esperar que as redes sociais caiam em desuso como aconteceu com o telex e o fax, exigiria muita paciência e fé numa improvável mudança no comportamento da população.
Regulá-las? O direito à opinião é sagrado, já as mensagens ofensivas são inaceitáveis. A discussão passa, então, pelo prazo para eliminá-las: antes de reverberarem, o que caracterizaria regulação, ou depois de tramitações nas esferas judiciais, quando pode ser tarde demais.
Certamente os que agridem defenderão a opção pelas vias judiciais, até porque acreditam que nada de grave acontecerá. Os agredidos preferirão a “regulação”. O problema é o dinamismo da sociedade, visto que os que agridem hoje, serão agredidos amanhã e vice-versa.
Assim, para evitar maiores celeumas, penso ser mais fácil ignorar as redes sociais. 
Os que defendem o acompanhamento das redes como forma de se medir a "temperatura" da opinião pública trazem um bom argumento, falta, contudo, nessa equação avaliar se os que se posicionam nas redes possuem credenciais que realmente agreguem valor e o quão volátil é a convicção dos que vão consultá-los. 
Evidente que se fechar na própria convicção sem ouvir contrapontos é errado, porém, estes precisam partir de quem possua capacitação tanto técnica como moral para emiti-los.
Acho que todos concordam com os possíveis malefícios das redes, principalmente os advindos de mentiras e críticas com pouco ou nenhum embasamento, todavia, pedidos de demissão em função  delas, deixa o demissionário sem espaço para exercer qualquer função pública.
Aguardemos os próximos passos do treinador.



terça-feira, 23 de setembro de 2025

A Economia e o Marketing

Se fosse estabelecer um propósito para este blog, tenderia a achar que ele seria o "esclarecimento acerca do que é realmente marketing".
Como não consigo ter a certeza se há um efetivo interesse no assunto, acabo optando por manter uma linha editorial mais voltada ao relato de situações que tenham o marketing como engrenagem, para, quem sabe, dessa forma, incutir naturalmente os conceitos da disciplina. 
Já os textos com foco em situações que trazem casos envolvendo RH, finanças e vendas, entre outros, têm como intuito mostrar que as áreas são interdependentes e cabe ao marketing auxiliá-las e ser por elas auxiliado em qualquer organização.
Outra tecla que também é bastante batida por aqui diz respeito à importância de se conhecer economia para atuar em marketing, isto é, ler e entender sobre microeconomia, contabilidade – principalmente de custos -, econometria e macroeconomia.
Antes de entrarmos no tema, esclareço que não preconizo que apenas economistas possam trabalhar na área de marketing, até porque defendo que a formação acadêmica não é a variável mais importante para o exercício de certas funções. O que quero dizer é que o conhecimento sobre Economia pode ajudar bastante o desempenho do profissional de marketing.
O assunto que agora abordamos, e  que ilustra a relevância do conhecimento econômico, tem como motivação as tarifas de importação impostas pelo presidente dos Estados Unidos e as respectivas reações/especulações por elas provocadas. 
Como ficará a inflação? E o déficit público? Qual o impacto na taxa cambial? E o mercado de certos setores? Quais os países que serão mais afetados? Haverá desemprego? 
Essas e outras perguntas envolvem previsões sobre o comportamento do mercado, da população e dos mecanismos de intervenção econômica de cada país. Assim como também acontece no marketing, quando uma eventual alteração de imposto em algum estado traz reflexos para empresas cujas operações ali estejam e faz com que ações visando a manter a competitividade precisem ser implementadas.
Demonstro o que quero dizer com um “debate” trazendo em lados opostos o economista francês Jean-Baptiste Say, que formulou a Lei de Say, e o também economista inglês John Maynard Keynes.
A tese de Say defende que a oferta de produtos é capaz de criar sua própria demanda. Trazendo seu raciocínio para a prática, seria algo, por exemplo, como uma fábrica produzir calçados, necessitando para isso da compra de insumos, de remunerar funcionários e de pagar aluguéis, entre outros gastos. Esse dispêndio gera renda para os envolvidos (fabricantes de insumos, colaboradores e proprietários de imóveis) e propicia que eles consumam outros produtos, inclusive calçados.
Para Keynes, no entanto, a produção nem sempre gera demanda suficiente, pois, em momentos de crise pode ocorrer retração de investimentos, o que afeta o índice de emprego e, consequentemente, o consumo, daí a necessidade da intervenção do estado.
Vemos assim que, enquanto o francês vê o mercado suficientemente capaz de se autorregular, focando a oferta como fator dominante, o inglês tinha a demanda como variável prevalecente.
Afirmar quem está certo ou mais perto da verdade seria ir contra o que preconizo em relação a ser definitivo no que tange à gestão, além do que, há dezenas de variáveis que podem influenciar o comportamento do mercado, inclusive e, especialmente, o marketing, que nas citadas teorias não foi considerado.












terça-feira, 16 de setembro de 2025

Marcas esportivas no futebol - 2025-2026

 
Realizado pelo 12º ano consecutivo, o estudo produzido pela Jambo Sport Business acerca das marcas esportivas que fornecem para os times das 20 principais ligas do mundo nos mostra que a liderança conquistada pela Adidas na temporada 2022-23, quando desbancou a Nike, vem sendo ampliada.
Ao todo foram analisados 382 times – dois a mais do que na temporada anterior – e setenta e quatro marcas, agrupando todas as marcas próprias em uma. Vale notar que quatro times estão sem fornecedor de material esportivo e cinquenta e um vestem uniformes de fornecedores diferentes dos que usaram na temporada passada, aqui considerando os que estiveram presentes na anterior e atual.
A marca alemã aparece com 32 times a mais do que a norte-americana. Em 2022-23 a diferença era de apenas um time, em 2023-24 subiu para nove e na temporada passada chegou a dezesseis, valendo ressaltar que a maior diferença imposta pela Nike, quando líder, foi de 19 times em 2019-20.
Tais números parecem indicar que a Adidas voltou a acreditar fortemente no futebol como plataforma de marketing ao vestir 87 times da amostra. 
Além da expressiva quantidade, a qualidade também se faz presente em sua estratégia, fato que pode ser constatado tanto na análise referente à participação entre os 30 clubes que mais arrecadam como também entre os que jogam as cinco ligas mais valiosas, onde também lidera. A conquista de clubes como Liverpool, Sevilla, Eintracht Frankfurt, Fenerbahçe e América do México corroboram para essa afirmação.
A propósito, até no que tange às seleções, a marca das três listras assumiu a primeira posição.
A Nike, agora com 55 times, permaneceu na 2ª colocação, mesmo tendo ficado com cinco times a menos do que em 2024-25. No 3º lugar, vem a Puma se consolidando na posição que ocupa desde 2017-18 e diminuindo sua diferença para a marca norte-americana. 
As três primeiras somadas atingiram 47,9% de participação, um índice de concentração considerável, mas abaixo do alcançado em 2013-14, que foi de 54%.
Completam a relação das TOP 10, na verdade TOP 11, já que há um empate na 10ª colocação: Macron, Kappa empatada com a Umbro, Joma, Hummel, New Balance, Castore e Robbey.
No Brasil, a liderança também pertence à Adidas, empatada com a Umbro, porém, deve ser destacada a queda no número de marcas próprias, apenas duas, sendo que na temporada passada eram três e na retrasada quatro. 
O declínio detectado ganha traços de tendência ao olharmos para a série B, que em 2023 tinha sete times vestindo marca própria, quantidade que caiu para cinco em 2024 e quatro na atual.
Esse movimento, caso se confirme, não significa que as marcas globais voltaram a aportar verba indistintamente nesse formato de patrocínio.  Na verdade, mais parece fruto de uma eventual decepção dos clubes com o modelo de marca própria, atrelado aos projetos das marcas regionais visando esse mercado.
Entre tantas outras informações interessantes do estudo,  finalizamos o artigo citando duas: 
i - no campeonato mexicano, o Pachuca trocou a Charly pela Skechers, marca norte-americana que sempre aparece entre as maiores do setor, mas, até então, pouco ativa no futebol;
ii - no campeonato belga, o Sporting Charleroi passou a ter como fornecedora a Decathlon, gigante francesa do varejo esportivo. Tal iniciativa mostra a importância da ação de patrocínio para os objetivos de branding das marcas, reforça essa conclusão o fato de que anteriormente o time vestia uniformes da Kipsta, que vem a ser a marca da categoria futebol da Decathlon, ou seja, diante da identificação dos benefícios de marketing proporcionado pela modalidade, os franceses optaram por colocar a marca guarda-chuva como destaque e assim fortalecer o institucional. 










terça-feira, 9 de setembro de 2025

O sonho da arena própria

O sonho da casa própria é um desejo que ultrapassa gerações e representa mais do que um bem material, simboliza segurança, estabilidade, independência e realização pessoal. No esporte, isso também acontece.
Apesar de tentador, não vamos nesse artigo contemplar especificamente as motivações que muitas vezes norteiam os interesses dos clubes brasileiros, entre os quais está o de proclamar que tem estádio, como se isso fosse um indicador de pujança esportiva. Vamos falar de como a “arena própria” pode contribuir para o aumento da receita e fortalecimento da marca, usando como ilustração o Los Angeles Clippers, equipe de basquete da NBA, que recentemente inaugurou o Intuit Dome, ao custo de dois bilhões de dólares e que será o espaço destinado à modalidade nos Jogos Olímpicos de 2028.
Entre os destaques da instalação em Inglewood, está uma arquibancada batizada de “The Wall” com 4.500 lugares destinados aos torcedores do time, sendo que 300 são em pé. Certamente se inspiraram na famosa “Muralha Amarela” do estádio do Borussia Dortmund.
No que tange às receitas, essas advirão das vendas de ingressos, camarotes e espaços publicitários, além do naming rights – a Intuit pagou US$ 500 milhões – e de acordos como o que fez com a Aspiration, de serviços financeiros que, segundo se especula, equivale a US$ 400 milhões.
Para os que acham que marketing se resume à geração de receitas, o artigo pode se encerrar no parágrafo acima, porém, não aconselho. 
Na verdade,  a parte relativa ao fortalecimento da imagem também se beneficia sobremaneira, pois, até então, a equipe jogava na Crypto.com – ex-Staples Center -, uma arena em que, mesmo com a customizações na quadra, o roxo e o dourado do Lakers são dominantes nas instalações. Além do rival, os Kings da NHL e o Sparks da WNBA mandam seus jogos lá.
A franquia que começou em Buffalo em 1970 com o nome de Braves, se mudou para San Diego em 1978 - ali passou a se chamar Clippers - e em 1984 foi para Los Angeles.
Embora nunca tenha conquistado o título da NBA, creditar o desempenho esportivo apenas à “falta da arena própria” não parece justo. Por outro lado, não deve ser descartado que uma “instalação própria” que propicie melhores experiências ao torcedor, permite a construção de comunidades e se consegue um engajamento maior, os quais, são capazes de fazer com que bons jogadores vejam a franquia como uma  opção atrativa.
Afirmar que o investimento em propriedade individual é uma tendência não é errado. Nos EUA, desde 1990 se vê esse movimento, influenciado também pelo fim de alguns contratos de aluguel que as equipes tinham junto aos proprietários, muitos dos quais, o próprio município. Importante relatar que até equipes universitárias seguem esse caminho.
Contudo, mesmo reconhecendo essa migração, vemos arenas como a American Airlines Center em Dallas ser dividida entre o Mavericks (NBA) e o Stars (NHL) e o Wells Fargo Center na Philadelphia ser compartilhada por 76ers (NBA) e Flyers (NHL). Em New Jersey, o MetLife Stadium recebe os jogos de Giants e Jets, ambos da NFL, enquanto que o SoFi Stadium em Los Angeles é o estádio em que Rams e Charges da NFL, assim como o Bowl da NCAA mandam seus jogos.
Trazendo para o universo brasileiro, vemos, de fato, uma movimentação dos times em busca da “casa própria”, fato que, em tese, pode fazer sentido, desde que haja uma avaliação racional – não passional – e que a conta feche, tanto no que diz respeito às finanças como em relação ao impacto na sociedade, aqui faço menção aos recursos públicos e aos riscos de deixar sem serventia estádios já existentes. 







terça-feira, 2 de setembro de 2025

Conflito de interesses

A expressão que dá título ao artigo é uma das mais negligenciadas e ignoradas no mercado corporativo.
Ainda que negligência e ignorância possam parecer sinônimos, a ideia da utilização de ambas no texto é diferenciar simploriamente algo feito em “não conformidade” com os códigos de ética - um de forma consciente, o outro impensada.
Não saberia dizer qual das situações é mais preocupante, pois, se a negligência atesta negativamente o caráter de quem comete atos imorais de forma proposital, a ignorância evidencia uma sociedade pouco aculturada com princípios e valores dignos.
No que tange à ignorância, é preciso reconhecer que existem linhas tênues de interpretação sobre certas situações, muitas delas “normalizadas” pela frequência com que ocorrem, daí a importância da existência de códigos de conduta bem elaborados, divulgados e acessíveis.
Preâmbulo concluído, lanço a pergunta:
O que vocês acham de um time ter como patrocinador a mesma marca que patrocina o campeonato que ele disputa?
Para evitar elocubrações, rechaço veementemente qualquer “tese” que venha lançar suspeitas sobre influências na arbitragem, elaborações de tabelas mais favoráveis ou quaisquer outras teorias que venham colocar em discussão a lisura da competição. Claro que numa sociedade tolerante a fake news e recheada de teóricos conspiratórios, as postagens sobre fatos que justifiquem as infundadas suspeitas serão, infelizmente, viralizadas, o que é ruim para a marca e para a própria competição, independentemente de as suposições não passarem de mentiras torpes.
Meu ponto é outro, ele diz respeito a um dos conceitos que rege o esporte, no qual se preconiza a igualdade de condições de oportunidades para que as competições sejam mais justas e, consequentemente, mais atrativas.
Evoluindo nessa premissa, quando vemos uma marca patrocinar um clube aportando valores extremamente superiores ao que os concorrentes recebem de seus patrocinadores, poderíamos, de alguma forma, alegar que tal investimento contribui para o desequilíbrio da competição. 
Visto de forma isolada, tal alegação não faz o menor sentido, afinal, cabe aos demais clubes desenvolverem estratégias para se tornarem mais valorizados aos olhos dos potenciais patrocinadores. 
Evidentemente, essa busca pela “maior atratividade” deveria considerar os benefícios e malefícios em termos de branding da associação da marca do clube com a da empresa patrocinadora, porém, o atual grau de maturidade da indústria do esporte faz com que os clubes foquem principalmente a busca por receitas de curto prazo, enquanto as marcas priorizam a mera exposição.
Há, no entanto, uma faixa que deveria servir de limite para que a busca pela divulgação não venha trazer reflexos negativos à marca, que é o que pode acontecer quando se está em duas propriedades como o patrocínio ao clube e o title sponsor da competição que o clube disputa de forma simultânea.
Então quer dizer que as confederações não deveriam comercializar o title sponsor de suas competições? 
Quando se tratar de confederações/ligas com boa saúde financeira, tendo a responder que "não deveriam", pois, além de dar margem a ataques contra a credibilidade do campeonato,  o title sponsor desvaloriza as propriedades patrocináveis dos clubes, vide a desproporção no volume de exposição. Ressalto que a Premier League, desde a temporada 2016-17, não tem patrocinador intitulando seu campeonato, mesmo diante de propostas milionárias para tal.
Responsabilizar os gestores de marcas e das confederações/ligas pelos possíveis conflitos de interesse não me parece o mais adequado.  No meu modo de ver, esses problemas poderiam ser mitigados através da adoção de um código de conduta que seja elaborado sob as óticas de compliance, planejamento estratégico e marketing.
Por fim, cabe esclarecer que a coincidência de patrocínios não se dá exclusivamente no Brasil.